Este blog não foi criado para quem já fechou as persianas de sua mente e cuidadosamente as fixou para que nenhum filete de luz de novas idéias penetre e perturbe sua sonolenta e estagnante zona de conforto. Este blog é para os poucos que querem entrar na terra firme da experiência direta por não verem outro caminho mais seguro a tomar.

04 abril 2007

O verdadeiro Diabo

- Bom dia JR! Tudo bem?

- E aí, Cris? As coisas por aqui, fora esse calor quase que infernal, estão indo muito bem! Acabei de chegar das férias... Uma semana de litoral! Estiquei até a Juréia! Muito show! E você? Quais são as novidades? Como é que está se saindo com o retorno “a vida de solteira”?

- Até que estou me saindo bem... fora o medo, até que não tem sido tão difícil não! Já que tocamos neste assunto, quero te perguntar se nos dias de hoje você sente medo? Se não, qual foi a sua experiência de libertação?

- Antes de tudo, gostaria de lhe dizer que me sinto muito honrado ao receber esta pergunta e espero que minha experiência possa ir de encontro a natureza que a moveu? Sabe, desde a mais tenra idade, por nascer num lar de alcoolismo, sempre fui prisioneiro de medos e ansiedades verdadeiramente paralisantes. Sempre que olho para trás vejo-o em todas as áreas da minha vida, infectando-as com seu veio pútrido, roubando a beleza e o sagrado de cada momento.

- Sei bem o que é isso! Também vim de um lar disfuncional!

- Nunca fui ensinado, nunca houve uma pedagogia para a inteireza do ser humano. Nunca vivenciei se quer um momento em que alguém falasse a respeito do medo e demais sentimentos que torturam a raça humana, impedindo-a de potencializar seus talentos. Olhando para o passado, vejo o quanto que eu sofri com a presença desse verdadeiro “diabo” em minha vida. Você tem idéia do significado da palavra “diabo”?

- Fora a idéia religiosa, passada pelo cristianismo, não sei não!

- A Palavra "diabo" vem do latim "diabolos" que significa "aquele que divide".

- Sério? Faz sentido!

- É exatamente essa a função do medo: nos dividir, nos fragmentar... Pensamos em fazer algo e imediatamente o medo vem com os seus "será" e o "e se?"... E quase sempre, somos vencidos pelo medo! Isso foi sempre assim na minha vida e ai... O medo chegava com tamanha carga que eu precisava recorrer às "minhas drogas de escolha" para poder anestesiar um pouco da carga emocional.

- Entendo! Cada um com sua droga, umas socialmente aceitas e receitadas e outras depreciadas e reprimidas socialmente. Cada um sabe bem da sua!

- Pois é! Foram anos e anos de terapia, livros e mais livros, retiros e mais retiros... E nada se mostrava funcional! O medo me impedia de assumir riscos, relacionamentos, projetos e tudo mais... Quando as coisas começavam a crescer, lá vinha o medo com toda depressão e lá tinha eu que bater em retirada, para o sofrimento do isolamento, para tentar me refazer e sobreviver....

- Parece que já assisti esse filme!

- S O B R E V I V E R! Essa é a melhor palavra... Sobrevivi durante a maior parte da minha vida... Não vivi e o motivo: o medo! Quantas vezes, depois de me recuperar de um ataque desse “diabo”, sentava-me na calçada e não conseguia compreender por que não conseguia me libertar de tudo aquilo. Aceitava minha impotência perante as minhas emoções, mas não conseguia encontrar um estado de unidade interna e bem-estar que fosse comum, durável, não uma coisa momentânea, passageira... Era às 10h00min bem, às 11h00min ruim, 12h00min bem, às 14h00min ruim... Foi quando despertei para a natureza exata dos meus medos e ansiedades; aquilo caiu como um relâmpago. Percebi que durante anos sempre estive como que podando os galhos da árvore do medo ao invés de ir direto à raiz, na natureza exata, exatamente de onde tudo se origina... o pensamento.

- Como assim?

- Veja, fomos ensinados a decorar capitais dos estados do nosso país, os nomes dos rios e seus afluentes, a tabela periódica, os gametas, a matemática... Sempre nos ensinaram no que pensar, mas nunca, nunca alguém nos ensinou apensar e, talvez o mais importante, observar nossos pensamentos, de onde originam todos os nossos sentimentos...

- Faz sentido!

- Isso é o que vejo hoje: pessoas letradas, formadas, pós-graduadas em várias áreas, no entanto, verdadeiros analfabetos emocionais! Nunca nos ensinaram a observar as palavras.... Sempre me prendi no mal estar causado pelos sentimentos... Não havia nem a observação do mesmo, somente a reação de querer me livrar de tudo aquilo.

- Entendo!

- Você já parou para olhar a palavra "sentimental"?... Ela é o resultado de duas palavras: sentir+mental. Correto?

- Sim!

- Ou seja, se é o sentir do mental, o que é que temos na mente?

- Pensamento - é claro!

- Pois bem! O medo é sempre o resultado de nossos pensamentos inconscientes, eles surgem sem serem convidados, vem quando querem, com o conteúdo que querem e com a carga emocional que querem. Quando vi isso tive a grande sacada que revolucionou a minha maneira de me relacionar com a vida e seus relacionamentos: Não sou impotente perante as emoções, mas sim, perante o pensamento!... E não adianta brigar... Eles vencem toda briga! Quanto mais resistimos ao pensamento, mais criamos pensamentos, que por sua vez, criam mais e mais sentimentos de medo e ansiedade...

- Nunca havia parado para observar isso!

- Foi ao que comecei a inventariar quais os pensamentos que vinham antes dos sintomas do medo ou da ansiedade e pasme!... Descobri que os pensamentos com suas respectivas reações emocionais não suportam serem observados! Quando observo os pensamentos sem qualquer forma de atrito, de julgamento de certo ou errado, sem qualquer desejo de evitá-los, eles começam a perder sua força, uma vez que pela observação dos pensamentos não ocorre a IDENTIFICAÇÃO com os mesmos.

- Já parou para observar a formação da palavra “identificação”?

- Não!

- Identificação significa "ter ação idêntica" ao que o pensamento sugere. Isso começou a despertar "a inteligência" que vê a falsidade das idéias criadas pelo pensamento e quando se vê o que é falso, torna-se impossível se identificar. Hoje, os pensamentos continuam a fluir e percebo que eles nunca estão no aqui, no agora. Eles estão quase sempre rememorando as lembranças do passado, boas ou ruins, e com isso comparando-as com a qualidade do presente e rapidamente projetando-as num futuro imaginário, que no meu caso, quase sempre é uma projeção negativa, carregada de medos e ansiedades.

- Me identifico com isso! Quase sempre me vejo embaixo da ponte e puxando um carrinho de papelão!

- Mas, o fantástico é que não há mais a identificação com o que o pensamento sugere, e com isso, há um recompor quase que instantâneo, uma espécie de "fio terra" que me mantém no aqui e agora e no aqui e agora não existe qualquer tipo de problema! No aqui e agora está tudo certo. É a mente que produz os problemas para serem resolvidos no amanhã. Não se trata de metafísica, ou algo “espiritual” (aqui entre nós, detesto essa palavra!). É muito simples! O pensamento vem e se não estou atento a ele, o mesmo se transforma em sentimento, emoções...

- Você tem razão, é assim mesmo!

- Para mim, o grande lance é "vigiar sempre"! É um olho no padre (pensamento) e outro na missa (cotidiano)! Quando vigiamos o pensamento ou o medo, só a observação rouba o alimento dos quais eles se alimentam! Se você passar a somente observar seu gatinho e não lhe der qualquer tipo de alimento, o que acontecerá?...

- Logicamente que irá morrer!

- Pois bem, o mesmo ocorre com o pensamento e o medo!

- Não sei não! Isso me parece um pouco complicado! Ouvindo a sua experiência, me veio à idéia de anotar, pois sei da minha dificuldade de perceber o início do meu pensamento. Posso começar escrevendo até conseguir ter a consciência?

- A experiência tem que ser sua! Posso lhe afirmar de coração aberto que hoje, sou um homem ressuscitado para a vida!

- Fico feliz por você, uma vez que pude acompanhar de perto seu sofrimento diante das suas depressões! Posso dizer que hoje, o que mais me confunde é o medo. Ele me fragiliza e por vezes, tira toda a minha energia. Tenho dificuldades em sair dele e isso é tão antigo que me dá raiva de ainda não saber como transformá-lo. Sinto-me cansada e se tenho um inimigo ele está aqui dentro da minha cabeça. Tenho um vínculo de amor com a vida, suas graças me alimentam, e vou seguindo os caminhos me oferecidos pela intuição. Mas, muitas vezes tomo decisões baseadas no medo e eu não quero mais escolher o medo, quero escolher o agora. A grande graça que tenho é saber, desde muito pequena, que esta luta é minha, que por mais que demore a compreensão que tudo transforma, vou continuar lutando.

- Fico feliz por ouvir isso! Outro lance: os pensamentos, com suas sugestões e sentimentos continuam a brotar, mas hoje, existe um observador (observar+dor), aquele que "observa a natureza exata da dor". Esse observador está me impedindo de aceitar as projeções futuristas criadas pelo pensamento, o que faz com que eu me entregue com muito mais calma (com+alma) aos preciosos momentos do agora. E isso está sendo maravilhoso, uma vez que, pela primeira vez em minha vida estou tendo condições de estar com as pessoas, conhecendo-as, vivenciado-as, e juntamente com espelhos que elas são, estou conseguindo estar comigo, conhecendo-me, vivenciando-me... E isso tem sido uma verdadeira benção! Hoje, não tenho nada materialmente falando e não faço a mínima para isso! No entanto, estou tendo ao JR! E ao ter ao JR, estou tendo amigos, uma esposa, um cachorro e uma maritaca e tenho certeza que tenho cuidado de todos deles com muito zelo! Nunca como hoje estive tão presente da vida, do seu colorido, dos seus aromas, da sua beleza, força e magia. E consegui isso começando pelo mais próximo: eu - do jeitinho que sou e não como eu acho que eu deveria ser! Eu com os meus pensamentos não inteligentes produtores de medos ou eu, com pensamentos esclarecidos pela ação da inteligência que tem produzido um modo de vida sereno, equilibrado e feliz!

- É muito bom ouvir isso!

- Respondendo sua pergunta, se ainda tenho medo, de forma mais direta: sim, ainda tenho o medo por frações de segundos, mas só por hoje, ele já não tem mais poderes para me governar. O medo hoje é apenas um servidor de confiança fazendo a sua função para que eu mantenha a minha integridade física e psicológica! Enquanto houver o pensamento, sempre haverá resquícios do medo! Podemos escolher alimentar ou observar. Alimentar exige movimento, observar não: é só sentar e relaxar... Com a certeza de que "isso" que estiver ocorrendo também vai passar!

- Né, valeu a ligação! Tenho que desligar agora. Tenho um compromisso no Itaim e tenho medo de perder a hora! Um beijo em seu coração!

- Valeu minha querida! Cuide bem do ser que lhe faz ser e não deixe que os pensamentos lhe impeçam de potencializar os seus talentos! A raça humana precisa urgentemente de pessoas não governadas pelo pensamento! Tenha uma ótima semana! E fique de olho na mente, afinal de contas, ela se chama mente, por que mente constantemente!

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Escolho meus amigos pela pupila

Escolho meus amigos não pela pele ou outro arquétipo qualquer, mas pela pupila. Tem que ter brilho questionador e tonalidade inquietante.

A mim não interessam os bons de espírito nem os maus de hábitos. Fico com aqueles que fazem de mim louco e santo. Deles não quero resposta, quero meu avesso. Que me tragam dúvidas e angústias e agüentem o que há de pior em mim.

Para isso, só sendo louco! Quero os santos, para que não duvidem das diferenças e peçam perdão pelas injustiças.

Escolho meus amigos pela alma lavada e pela cara exposta. Não quero só o ombro e o colo, quero também sua maior alegria. Amigo que não ri junto, não sabe sofrer junto. Meus amigos são todos assim: metade bobeira, metade seriedade. Não quero risos previsíveis, nem choros piedosos.

Quero amigos sérios, daqueles que fazem da realidade sua fonte de aprendizagem, mas lutam para que a fantasia não desapareça. Não quero amigos adultos nem chatos. Quero-os metade infância e outra metade velhice! Crianças, para que não esqueçam o valor do vento no rosto; e velhos, para que nunca tenham pressa. Tenho amigos para saber quem eu sou. Pois ao vê-los loucos e santos, bobos e sérios, crianças e velhos, nunca me esquecerei de que a "normalidade" é uma ilusão imbecil e estéril.

Oscar Wilde

QUE BOM QUE VOCÊ CHEGOU! JUNTE-SE À NÓS!