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A honestidade é uma imitação: a virtude é uma originalidade. Somente os virtuosos possuem talento moral e é obra sua qualquer ascensão para a perfeição; o rebanho se limita a seguir seus passos, incorporando à honestidade trivial o que antes foi virtude de poucos. E sempre rebaixando-a.
Ser honesto implica em se submeter às convenções comuns; ser virtuoso significa frequentemente ir contra elas, expondo-se a passar como inimigo de toda moral, quando apenas é contra certos preconceitos inferiores. Sua virtude consiste em resistir contra os preconceitos dos outros. Se pudéssemos viver entre dignos e santos, a opinião alheia poderia nos evitar tropeços e quedas; mas é covardia, vivendo entre 'hipócritas', rebaixar-se ao nível comum com medo de atrair suas iras. Fazer como todos fazem pode implicar em concordar com o indigno; a condição do processo moral é resistir ao descanso comum e adiantar-se ao seu tempo, como em qualquer outro progresso.
Não é o homem moralmente medíocre - o honesto - que determina as transformações da moral. São os virtuosos e os santos, que não se confundem com ele. Precursores, apóstolos, mártires, inventam formas superiores do bem, ensinam-nas, pregam-nas, impõem-nas. Toda moral futura é um produto de esforços individuais, obra de indivíduos excelentes que concebem e praticam a perfeição inacessível ao homem comum. Nisso consiste o talento moral, que forja a virtude, e o gênio moral, que implica a santidade. Sem esses homens originais não seria possível conceber a transformação dos costumes: conservaríamos os sentimentos e paixões dos primitivos seres humanos. Toda ascensão moral é um esforço do talento virtuoso para a perfeição futura; nunca é uma condescendência passiva pelo passado, nem uma simples acomodação ao presente.
Os virtuosos não são iguais aos santos; a sociedade opõe vários obstáculos a seus esforços. Pensar a perfeição não implica em praticá-la totalmente; basta o firme propósito de ir em sua direção. Os que pensam como profetas podem se ver obrigados a proceder como filisteus em muitos atos. A virtude é uma tensão real em direção ao que se concebe como perfeição ideal.
O progresso ético é lento, mas seguro. A virtude arrasta e ensina; os homens se resignam a imitar alguma parte das excelências que os virtuosos praticam.
Cada um dos sentimentos úteis para a vida humana engendra uma virtude, uma norma de talento moral. Há filósofos que meditam durante longas noites insones, sábios que sacrificam sua vida nos laboratórios, patriotas que morrem pela liberdade de seus concidadãos, altivos que renunciam a qualquer privilégio que tenha por preço a dignidade, mães que sofrem a miséria defendendo a honra de seus filhos. O homem medíocre ignora essas virtudes; limita-se a cumprir as leias por temor às penalidades que ameaçam quem as viola, guardando a honra para não arrastar as consequencias de perdê-la.
José Ingenieros - O Homem Medíocre