O homem é. A sombra parece. O homem põe sua honra no mérito próprio e é juiz supremo de si mesmo; ascende à dignidade. A sombra expõe o seu ao julgamento alheio e renuncia a se julgar; descende à vaidade. Há uma moral da honra e outra da caricatura: ser ou parecer. Quando o ideal de perfeição impulsiona a ser melhores, esse culto dos próprios méritos consolida a dignidade nos homens; quando o desejo de parecer arrasta a qualquer rebaixamento, o culto da sombra acende a vaidade.
Nos indivíduos adaptados à rotina e aos preconceitos comuns, o desejo de brilhar em seu meio e o aplauso que esperam do pequeno grupo que os rodeia, são estímulos para a ação. A simples circunstância de viver em rebanhos predispõe a perseguir a aquiescência alheia; a estima própria é favorecida pelo contraste ou pela comparação com os outros.
Certas preocupações, reinantes nas sociedades medíocres, exaltam os domésticos. O elogio do mérito é um estímulo para a sua simulação. Obcecados pelo êxito, e incapazes de sonhar a glória, muitos impotentes orgulham-se de méritos ilusórios e virtudes secretas que os outros não reconhecem: acham-se atores da comédia humana; entram na vida construindo um cenário, grande ou pequeno, baixo ou alto, sombrio ou luminoso; vivem com a perpétua preocupação da opinião alheia sobre sua sombra. Consomem a existência sedentos de destaque em sua órbita, de causar impressão ao seu mundo, de cultivar a atenção alheia de qualquer maneira.
O vaidoso vive se comparando com os que o rodeiam, invejando toda excelência alheia e corroendo toda reputação que não pode igualar.
O digno deve zombrar das mil rotinas que o servil adora sob o nome de princípios; seu conflito é perpétuo. A dignidade é um quebra-mar colocado pelo indivíduo contra a maré que o acossa. É o isolamento dos domésticos e desprezo de seus pastores, quase sempre escravos do próprio rebanho.
José Ingenieros