Este blog não foi criado para quem já fechou as persianas de sua mente e cuidadosamente as fixou para que nenhum filete de luz de novas idéias penetre e perturbe sua sonolenta e estagnante zona de conforto. Este blog é para os poucos que querem entrar na terra firme da experiência direta por não verem outro caminho mais seguro a tomar.

03 agosto 2011

Um novo homem na Matrix



.....Agora compreendo, destituído de qualquer ranço de fundamento religioso ou mistico, a inteligência contida na expressão:
....."No principio era o Verbo e o Verbo se fez carne e habitou entre nós".
.....No princípio — inicialmente — tudo que se instala em nós, se instala  através de um verbo, uma palavra, uma ideia, a qual ecoa em nosso intelecto, percorre nossos sentidos, causando o "sentir", através do qual se dá a identificação, a qual faz com que "idêntico fiquemos" com o espírito de tal verbo, de tal palavra, de tal ideia. É dessa forma que se manifestam em nós, tanto nossas qualidades criadoras como nossos tumultuados e estagnantes infernos interiores. Para que isso ocorra, se faz necessário um "inteligente e provocador agente", um locutor, precedido de um ouvinte aberto, atento, e  um posterior período de encubação, de maturação para que essa ideia "ganhe corpo", se "estabeleça como parte integrante" do estado de nosso ser. É um processo tanto na alegria ou na tristeza, na saúde ou na doença.
.....No princípio — inicialmente — a observação da mente, observação esta livre de qualquer escolha, livre de qualquer julgamento, livre de qualquer repressão, livre de qualquer necessidade de evitar os conteúdos que nela afloram, — é tão somente um verbo, uma palavra, uma ideia —, que, invariavelmente, nos soa de modo bastante estranho. Não raro, é algo tido como uma "viagem", uma loucura, um mero filosofar sem sentido. Inicialmente é assim que esse verbo, que essa palavra, essa ideia chega  ao "filtro" que é o nosso intelecto; se ela passa pelo filtro e ganha corpo em nosso sentir, — através de algum dos nossos sentidos —, instala-se um processo de germinação, de desenvolvimento. Se a palavra cai num solo mental repleto de  de crenças e preconceitos, que são partes componentes do filtro que é o nosso intelecto, não ocorre tal germinação. O intelecto, o eu, arrebata a possibilidade de que tal verbo, tal palavra, tal ideia, habite, faça parte, seja uma só com o nosso coração. Se o verbo, a palavra, a ideia cai em ouvidos onde os desejos, as escolhas já não são tão fortes e imperiosas, ela transpassa o intelecto, não de forma definitiva, pois, onde há desejos e escolhas, há sempre reservas que podem ocasionar o retrocesso que nos levam ao dissabor da estagnação, uma vez que é muito forte em nós, o impulso para o conformismo e a resignação. 
.....Quando o verbo, a palavra, a ideia se depara com o solo fértil de uma mente cansada do processo de escolha, — cansaço este pela qual se instala a qualidade tão necessária do estado de mente aberta, do estado de uma mente receptiva cuja escuta não sofre a ação maligna dos filtros retaliadores do intelecto—, esse verbo, essa palavra, essa ideia, pode-se assim dizer, "desce redonda". Desce redonda, rodando, rodando, rodando e rodando num processo de germinação que atinge todos os sentidos do ser. Ela desce numa metafisica espiral criativa. E quando essa germinação ocorre dessa forma, apresenta-se um estado de enamoramento, um estado de paixão, um estado onde se dá o acolhimento amoroso do necessário e paciente trabalho de acompanhamento desse plantio no solo de nosso interior, causado pela germinação de tal verbo, de tal palavra, de tal ideia.
.....Enquanto a observação dos movimentos dos conteúdos da mente, nem se quer é uma ideia para nós, somos escravos, joguetes, marionetes do acaso, das circunstâncias e suas respectivas emoções. Somos como uma embarcação sem velas, sem rádio e sem bussola num imenso e revoltado mar, que são os nossos instintos, nossos sentidos destituídos da ação de uma inteligência amorosamente pacificadora. Nesse período, ao invés de uma ferramenta afiada para o plantio criativo do amor, — amor este que é uma expressão natural da Grande Vida, do Ser quenos faz ser —, somos tão somente como uma máquina, um mecanismo, um agente perpetuador de nossa doença, conflito e confusão. 
.....No entanto, quando ocorre nosso ponto de saturação resultante desse débil modo de existir, quando esse nosso modo de existir não é capaz de produzir nenhum tipo de valor nutricional, a não ser dor, caos, conflito, confusão, sofrimento, esgotamento, um milagre acontece... Somente um milagre é capaz de romper as grossas camadas da lógica e da razão. Somente um milagre é capaz de nos resgatar de uma mente cartesiana. Somente um milagre pode fazer com que nos deitemos em nossa cama como um intelecto cansado e acordemos feito restaurado coração criativo; que nos deitemos como um administrador de conflitos, para acordarmos feito poeta do espírito. E isso só ocorre, quando há a presença de uma escuta atenta, escuta que transpassa todo preconceito, toda resistência, toda barreira intelectual que impede o estado de comunhão pela qual se dá a percepção do novo, a percepção do  espírito que move o verbo, a palavra, a ideia, capaz de trazer Vida nova, um estado de frescor, de criatividade, de comunhão com algo que não vem das esferas da mente. Somente um milagre é capaz de despedaçar nosso "banco de imagens", através do qual sempre desqualificamos o portador de um verbo, de uma palavra, de uma ideia que não conste de nosso script existencial. Sem esse milagre, medimos o mensageiro e desprezamos a mensagem, num ato de desinteligência que impede a compreensão de que, o que importa é a mensagem e não o mensageiro. Esse milagre que produz a escuta, não está aí, nos limitados e gélidos árticos do intelecto, encontra-se no magma, em constante ebulição, em hemisfério mais profundo de nosso ser. Essa escuta destituída dos filtros do intelecto é o Oráculo de nossa vida, a nos abrir portas que nos levam a conhecimentos de outra ordem, conhecimentos nunca antes imaginados, tão importantes para a libertação da Matrix, que é uma representação da nossa rede de pensamento condicionado. 
.....Quando ocorre a escuta desse verbo, somos fecundados numa outra dimensão do ser, que nos leva a um outro estado de ser, estado esse onde a vida passa a ter, pela primeira vez, real cor, sabor, brilho além de uma incalculável rapidez na capacidade de compreensão e comunhão. Na abertura causada por esse estado de ser, dissolve-se a mesquinha postura de vida onde só há espaço para a retenção, para a politicagem. O impulso maior é para o partilhar, para ocasionar criativos meios para o comungar, para o ato de tornar comum, o mesmo ar, o mesmo caloroso Sopro que agora nos habita. É nesse estado que descobrimos — sim, descobrimos — tiramos o véu que encobria nossa criatividade amorosa e, através dela, encontramos nosso som, nossa palavra, nosso verbo, nossos talentos que até então, de nós se faziam desconhecidos, nos mantendo num modo de vida mecânico, destituído de poder criativo, onde quase tudo tinha como essência uma irrefletida imitação de nossa disfuncional cultura e educação herdada. Sem a manifestação desse estado, nossos talentos, lentos, permanecem.
.....Foi graças a esta compreensão, que um novo portal se abriu diante de mim, onde há uma profunda certeza de que tudo está certo, de que tudo, seja lá como se apresente, está cumprindo sua real função. Há uma nova confiança no movimento da Vida. Há um novo solo sob os meus pés. Há um novo modo de ver a vida de relação, destituído de toda pessoalidade proveniente do intelecto com seu pseudo-saber, com seus achismos e suas certeza. Como disse um poeta, — num canto qualquer do hospício, só os loucos tem a certeza — certeza esta que fecha a porta para o frescor do novo estado criativo.
.....Agora, não mais me interessa o modo de vida do mensageiro. Não mais me interessa se este mensageiro comunga ou não do conteúdo da mensagem que chega a mim através dele. Isso não é da minha alçada, não cabe mais aqui, o antigo e automático estado de julgamento separatista. Se o mensageiro se beneficia do conteúdo da mensagem, o lucro é todo dele. Se o conteúdo da mensagem que traz a mim, não é de sua autoria e o mesmo se apossa e a propaga como sendo dele, os resultados não cabem a mim; isso é responsabilidade dele. Enquanto não ocorre o milagre, não há como se estabelecer este novo estado de participação na vida de relação, o qual traz em seu borjo, um estado de leveza e comunhão nunca antes imaginado. Mas isso não é algo que chegue pela simples ação da análise intelectual. Para que isso ocorra, é preciso que cesse o desgastado processo de escolha, cessar este, que só ocorre através do estado de rendição: a rendição ao fato de que um modo de vida centrado nos limites do intelecto não é capaz de nos proporcionar aquela qualidade de vida, — qualidade que está presente independente de qualquer situação externa que se apresente —,  qualidade que em última estância, sabemos existir, nas profundezas de nosso ser. E quando se encontra isso, tudo se encontra em seu devido lugar. E nesse instante, um novo homem aparece.

Nelson Jonas R. de Oliveira 

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Escolho meus amigos pela pupila

Escolho meus amigos não pela pele ou outro arquétipo qualquer, mas pela pupila. Tem que ter brilho questionador e tonalidade inquietante.

A mim não interessam os bons de espírito nem os maus de hábitos. Fico com aqueles que fazem de mim louco e santo. Deles não quero resposta, quero meu avesso. Que me tragam dúvidas e angústias e agüentem o que há de pior em mim.

Para isso, só sendo louco! Quero os santos, para que não duvidem das diferenças e peçam perdão pelas injustiças.

Escolho meus amigos pela alma lavada e pela cara exposta. Não quero só o ombro e o colo, quero também sua maior alegria. Amigo que não ri junto, não sabe sofrer junto. Meus amigos são todos assim: metade bobeira, metade seriedade. Não quero risos previsíveis, nem choros piedosos.

Quero amigos sérios, daqueles que fazem da realidade sua fonte de aprendizagem, mas lutam para que a fantasia não desapareça. Não quero amigos adultos nem chatos. Quero-os metade infância e outra metade velhice! Crianças, para que não esqueçam o valor do vento no rosto; e velhos, para que nunca tenham pressa. Tenho amigos para saber quem eu sou. Pois ao vê-los loucos e santos, bobos e sérios, crianças e velhos, nunca me esquecerei de que a "normalidade" é uma ilusão imbecil e estéril.

Oscar Wilde

QUE BOM QUE VOCÊ CHEGOU! JUNTE-SE À NÓS!