Este blog não foi criado para quem já fechou as persianas de sua mente e cuidadosamente as fixou para que nenhum filete de luz de novas idéias penetre e perturbe sua sonolenta e estagnante zona de conforto. Este blog é para os poucos que querem entrar na terra firme da experiência direta por não verem outro caminho mais seguro a tomar.

09 outubro 2009

Desabafando via MSN

- Bom dia Nega!

- Bom dia, Né!

- Como você está? Levou os biscoitinhos de avelã?

- Estou que nem a piada do papagaio... "to aqui ué". Sim, trouxe-os, vou comê-los a tardinha.

- Melhorou o inchaço dos olhos?

- Sim, melhorou... Só a cabeça não melhora!

- Minha coluna quase que não me deixa sair da cama... Já não bastasse o vazio do momento...

- Jura? É, não é fácil!

- Estou aqui sem a mínima vontade de dar continuidade aos trabalhos que tenho para fazer e o telefone não para de tocar com mais e mais propostas para os mesmos tipos de atividades que já não me dizem nada; são as mesmas cobranças aceleradas por parte dos clientes.

- Sei muito bem como é!

- Sempre a mesma história de querer a coisa prá ontem, pagando só daqui um mês e com os preços de um século atrás.

- É fogo, só exploração!

- Sim, sempre a mesma choradeira, a mesma tentativa de acobertar a exploração com promessas de melhoras num futuro na "Terra do Nunca"... Não existe o mínimo sinal de valorização pessoal... O foda é que já não estou mais tento paciência, muito menos boa vontade de continuar mantendo estes relacionamentos comerciais vampirescos.

- Lhe compreendo perfeitamente!

- É sempre a mesma história: o outro acumulando cada vez mais e você apenas se mantendo de forma espremida, sem a possibilidade de melhorar as próprias condições existenciais.

- Não pense que por aqui a coisa é diferente, você sabe bem a minha realidade!

- Fora essa parte profissional e financeira, vem o que mais me pega que é essa falta de sentido na existência... Acordar todos os dias sem ver um sentido real, sem algo que produza energia interna, que seja energia pura, que seja realmente útil e com sentido tanto para mim quanto para os outros. Sinto-me vivendo dentro de uma superficialidade prá lá de medíocre.

- Faço meus os seus sentimentos.

- Minha vida com meus irmãos é superficial. Minha vida com meus "colegas" é prá lá de superficial. Minha vida profissional é superficial; minhas atividades são superficiais. Tudo que olho sinto como superficial e não consigo sentir nada com substância. Só vejo mecanismos criados pelo sistema, pela rede do pensamento, que servem tão somente para nos distrair, para nos afastar desse mal estar, desse sentimento de incompletude que me acompanha desde a mais tenra idade. Isso me faz crer que todas as pessoas insistem num modo de vida apressado, por que na pressa não sobra tempo para se depararem com seus reais sentimentos...

- Bem provável!

- Percebo com todas as células do meu corpo, a falta de sentido de dar continuidade em tentar achar no externo, algo que sinto ter que vir do interno. Só que lá no fundo, ainda existe uma forte tendência de querer buscar no externo... É como um vicio: difícil de largar!...

- Sei!

- Olho para os livros e nada... Ontem, depois que sai dos exames médicos no A.C. Camargo, caminhei pela Avenida Paulista em baixo daquela forte garoa e não consegui sentir nada, não consegui ver nada que me chamasse atenção. Fui até a Livraria Cultura, como fiz várias e várias vezes em momentos críticos da minha vida onde corri atrás de respostas nos livros. Fiquei no primeiro andar daquela imensa loja, sentado numa confortável poltrona, vendo aquela imensidão de livros sem que ao menos um deles me chamasse atenção. Pilhas e pilhas de livros voltados para marketing, publicidade e estratégia de vendas... Uma sessão de livros de auto-ajuda que em nada ajudam e outra de religião... Nada! Olhar para tudo aquilo e não ver nada só fez aumentar ainda mais o imenso vazio que trago comigo.

- Imagino.

- Ao sair de lá, parei por alguns minutos na calçada da Avenida Paulista e fiquei olhando as pessoas, a grande maioria acelerada, carrancuda, com o olhar voltado para o chão. O trânsito parado devido a forte garoa. Minutos depois peguei o ônibus Mandaqui. Dois ou três pontos a diante, no banco de trás, um senhor começou a discutir em voz alta com um jovem que carregava um enorme pacote, o qual havia esbarrado na perna do velhinho. O rapaz se desculpou, mas o velho não aceitou as desculpas e continuou a falar um monte para o mesmo. Testemunhando aquilo, peguei minha agendinha de apontamentos e escrevi meus sentimentos:

Que a Grande Vida não permita
Eu chegar à terceira idade
Sem conter em grande medida
Amor, ternura e piedade.

O rapaz, percebendo que o velho não se calaria, de lá saiu vindo sentar-se ao meu lado. Com o olhar sem graça começou a justificar o ocorrido. Com o intuito de acalmá-lo, li para ele o que havia escrito. Ele sorriu. Completei dizendo-lhe que essas pessoas são nossos professores de paciência e tolerância e que se não olharmos bem para nós mesmos, corremos o risco de ser como eles, antes mesmo da terceira idade. Ele sorriu novamente e silenciou-se até alguns pontos antes do final. Já no bairro, decide passar nas Casas Americanas para ver se encontrava algum filme interessante: nada. Já na saída diante das enormes prateleiras de chocolate com ótimos preços: nada. Os pacotes de batatas Springs também chamaram momentaneamente minha atenção... Nada. Minutos depois estava em casa e, novamente, nada.

- Sei!

- Liguei a TV... Nada. Liguei a NET... Nada. E de nada em nada, fui vendo mais um dia passar aumentando meu acumulo de nadas. E agora, depois de uma enorme surra dos “nadas matinais”, me rendi a este desabafo via MSN... Uma maneira de me distrair um pouco e ocupar o meu tempo. Fico aqui me perguntando: qual o sentido de ter que ficar a procura de atividades para encobrir estes sentimentos de mesmice, rotina, mediocridade e falta de sentido?... Não consigo entender essa espécie de "alergia" às atividades que se apresentam, principalmente as profissionais. Sei que várias pessoas gostariam de estar em meu lugar: trabalhar em casa, poder levantar a hora que quer, ir e vir quando bem quer, ter atividades comerciais onde faço o valor do salário delas em apenas um ou dois dias. Sei que se eu quisesse poderia fazer um montante financeiro mensal de causar inveja em muita gente, mas, no entanto, não sinto a menor inclinação para isso. Já me questionei se é preguiça, vagabundagem ou sei lá o que; no entanto, sinto que não é nada disso. Só sei que não me plenifica, não me faz sentido algum. Procuro apenas garantir o necessário valor para as minhas despesas e olha lá!

- Compreendo!

- As promessas de grandes serviços e de grandes resultados financeiros já não me atraem em nada, ao contrário, tornam-se um peso, um verdadeiro asco. Grandes projetos dentro daquilo que hoje tenho que exercer para custear a minha existência fazem meus músculos ficarem tensos. O corpo fala, não tem jeito de mentir para ele. Ele recusa. Mas aí vem o conflito: Já sei o que não quero fazer, mas como saber o que preciso fazer para ter o mínimo da existência garantida com dignidade e satisfação? E novamente... Nada! Nada de respostas... E o relógio continua seu movimento...

- Sei perfeitamente do que você está falando.

- O telefone toca e a espinha treme. Olho para a prateleira e vejo aquele enorme pacote com nossos cartões e não sinto o mínimo sentido em distribuí-los. E novamente me pergunto: o que fazer? E aí me lembro de Arnaldo Antunes:

Socorro, não estou sentindo nada
Nem medo, nem calor, nem fogo
Não vai dar mais pra chorar
Nem pra rir
Socorro, alguma alma mesmo que penada
Me empreste suas penas
Já não sinto amor nem dor
Já não sinto nada
Socorro, alguém me dê um coração
Que esse já não bate nem apanha
Por favor, uma emoção pequena, qualquer coisa
Qualquer coisa que se sinta
Tem tantos sentimentos, deve ter algum que sirva
Socorro, alguma rua que me dê sentido
Em qualquer cruzamento,
Acostamento,
Encruzilhada...

- Pois é: não faz sentido chorar e nem rir.. É assim que me sinto: numa encruzilhada! Ao centro dela, em silêncio olho para seus quatro cantos e me vem o sentimento de que em qualquer direção que eu vá, já estive ali mil vezes antes... Pode lhe parecer estranho, mas sinto que a saída só pode vir do alto. Então me pergunto: o que pode me tirar desta encruzilhada?... E mais uma vez... Não vejo nada.. Nega?.... Nega? Já sei, o patrão está aí do lado... Vou desconectar! Um beijo!


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Escolho meus amigos pela pupila

Escolho meus amigos não pela pele ou outro arquétipo qualquer, mas pela pupila. Tem que ter brilho questionador e tonalidade inquietante.

A mim não interessam os bons de espírito nem os maus de hábitos. Fico com aqueles que fazem de mim louco e santo. Deles não quero resposta, quero meu avesso. Que me tragam dúvidas e angústias e agüentem o que há de pior em mim.

Para isso, só sendo louco! Quero os santos, para que não duvidem das diferenças e peçam perdão pelas injustiças.

Escolho meus amigos pela alma lavada e pela cara exposta. Não quero só o ombro e o colo, quero também sua maior alegria. Amigo que não ri junto, não sabe sofrer junto. Meus amigos são todos assim: metade bobeira, metade seriedade. Não quero risos previsíveis, nem choros piedosos.

Quero amigos sérios, daqueles que fazem da realidade sua fonte de aprendizagem, mas lutam para que a fantasia não desapareça. Não quero amigos adultos nem chatos. Quero-os metade infância e outra metade velhice! Crianças, para que não esqueçam o valor do vento no rosto; e velhos, para que nunca tenham pressa. Tenho amigos para saber quem eu sou. Pois ao vê-los loucos e santos, bobos e sérios, crianças e velhos, nunca me esquecerei de que a "normalidade" é uma ilusão imbecil e estéril.

Oscar Wilde

QUE BOM QUE VOCÊ CHEGOU! JUNTE-SE À NÓS!