Este blog não foi criado para quem já fechou as persianas de sua mente e cuidadosamente as fixou para que nenhum filete de luz de novas idéias penetre e perturbe sua sonolenta e estagnante zona de conforto. Este blog é para os poucos que querem entrar na terra firme da experiência direta por não verem outro caminho mais seguro a tomar.

12 junho 2015

O Ferro do Absurdo e o Fogo da Graça

Boa parte dos que são chamados ao caminho iniciático, ou se preferir, ao caminho do conhecimento de si mesmo, com este se deparam por meio de uma inesperada — e quase nunca imaginada — experiência do Absurdo, experiência esta que a mente condicionada e analiticamente cartesiana rotulou como “depressão”. Como revelado pela própria vivência e também pela observação do processo ocorrido com outros, se damos a devida atenção e recebemos o devido incentivo para a travessia desse conflituoso momento de absurdo, o qual de fato se mostra como um rito de passagem, nos deparamos com a vivência de uma dimensão atemporal, a qual vem sendo simbolizada pela palavra Graça, palavra esta que, para a mente condicionada, vítima de suas memórias de abuso, geralmente é fonte de grande desconforto, quase sempre expresso de forma reativa.
O primeiro toque da Graça, quando observado com toda a propriedade do Ser que somos, nos clarifica que mesmo a vivência do Absurdo — é a Graça em ação. Se o leitor ainda alimenta qualquer tipo de desconforto diante da palavra Graça, apenas momentaneamente, o convidamos para que utilize outra que lhe soe menos desconfortável aos ouvidos da mente. Muitos têm sido os nomes usados para apontar este maravilhoso, inesquecível e integrativo momento, entre eles: experiência do Sagrado, Boa Aventurança, vinda do Espírito Santo, Batismo Cósmico, Axé, Momentum, Insight Criativo, A Coisa, Inefável Presença, Estado Supremo, etc.. Trata-se de uma vivência que nos joga de imediato num estado de inenarrável maravilhamento, de inefável e pacífico encantamento, nunca sequer imaginado e que a limitação dos símbolos, das palavras tornam impossível o seu simbolizar. Todo símbolo utilizado mostra-se infinitamente distante diante de incalculável expressão graciosa. Oxalá, o leitor que agora se depara com este texto, saiba por experiência direta, a beleza deste sagrado momento, o qual impregna de inesquecível e inquestionável Realidade, desde cada célula de nosso organismo, até a sutil energia de nossa dimensão anímica, pela qual o corpo tem seus movimentos.
A julgar pela nossa própria experiência e por longo e exaustivo estudo quanto as vivências religiosas de outros homens e mulheres, raro se mostra a permanência deste “momento luminoso” na dimensão cotidiana daquele que por ele foi agraciado. Costumamos nos referir a esse primeiro toque da Graça, como uma espécie de amostra grátis, a qual qualifica a realidade dessa dimensão do Espírito incondicionado e nos garante a energia, a paixão e a seriedade necessária para a realização de um “trabalho de base emocional”, o qual se dá pela prática da observação de si mesmo, pela qual reconhecemos as traves de tropeço, as fronteiras do ego, as enormes trincheiras da mente adquirida, responsáveis pelo impedimento da livre expressão do gracioso estado do Ser que somos. Quando, do céu retornamos para o “planeta dos macacos da mente adquirida”, não raro o sentimento que se apresenta é de incalculável nostalgia. Podemos utilizar como exemplo, algo que acreditamos possa ter ocorrido com o leitor: a lembrança de um romance de férias de verão... Lembra-se da tristeza de ter que voltar para sua cidade, sem saber ao certo se seria possível um dia o retorno àqueles inesquecíveis momentos de ternura?... Surge uma nostalgia que rouba-nos o colorido da vida; o mundo torna-se uma triste palheta de tons de cinza e os únicos pensamentos que nos ocorrem, se mostram voltados para a idealização de como conseguir abreviar a repetição desses inesquecíveis momentos de bem-aventurança.
Então, o que ocorre àqueles que se viram tocados, após longo período de vivência do Absurdo, pela maravilhosa e inesquecível experiência da Graça? A única coisa que se mostra valer a pena de existir é a busca da “Volta ao Lar”, do “Caminho de Retorno” capaz de nos apresentar de forma permanente, os braços da vivência do Amor (Amor este, que nada tem a ver com as ideias socialmente propagadas sobre o Amor). Ai surge a questão: como retomar esse contato, se o sujeito do contato não nos deixou seu endereço?... De modo infantil, como na experiência do nosso romance de verão, cheios de expectativas, voltamos ao ambiente de nossa vivência somente para nos depararmos com a dolorosa frustração ocasionada pelo desencontro com nosso Ser Amado... Olhamos para todos os lados, mas o Amor... Não está lá!... Em nosso desespero, tentamos encontrar em outros corpos, em outros rostos, aquela amorosa dimensão, mas, apenas nos deparamos com mais tons de cinza. Esses corpos e rostos são uma representação dos vários ambientes e objetos nos quais acreditamos que possam nos brindar com a recorrência de tamanho estado de plenitude e centramento integrativo... Instituições, Escolas Iniciáticas, viagens a locais tidos por sagrados, os mais variados e absurdos sistemas de crença organizada (erroneamente tidos por religião), livros, sites, blogs, comunidades, mestres, gurus, exaustivas práticas específicas (como por exemplo, o sexo tântrico), quase sempre adquiridas em caros cursinhos de um final de semana que se repetem por vários anos... Todos nos prometem paz, mas a paz, ali não se encontra... Para nosso desespero, tudo se apresenta como mais do mesmo: deixam o gosto de cinzas em nossa boca, pois não nos proporcionam a Benfazeja Realidade do Êxtase Divino, com seu encantamento, seu eterno momento de maravilhamento, de completude, de inteireza, de integridade, o qual  se manifesta pela “ausência de si mesmo, no derramamento no SI mesmo” (se é que podemos fazer uso de tal expressão).
Então, para todo aquele que “recebeu o chamado” por meio da vivência do Absurdo e da Graça, não tem outro jeito: fica essa nostalgia... Essa nostalgia que, por sua vez, alimenta o processo de busca por aquilo que convencionamos chamar de “Retomada da Perene Consciência Amorosa Integrativa” que somos. Em outras palavras, essa vivência do Absurdo e da Graça é o passaporte, o bilhete válido para a maior viagem do espírito humano, a qual nos leva para a plataforma do encontro consigo mesmo, plataforma esta, na qual poucos aventureiros tocaram seu solo e que, de forma amorosa, os que o conseguiram, de suas alturas, através da limitação das palavras, tentaram “nos mandar notícias do mundo de lá”. Mas, mesmo por mais belas que sejam as suas amorosas palavras, as mesmas se mostram muito, mas muito pequenas diante da realidade da agraciada vivência a nós ocorrida. A duras penas tomamos consciência de que, tudo aquilo que para a mente adquirida se mostra como muito, para o nosso coração, mostra-se pouco e como nas palavras do poeta, “Muito pra mim é tão pouco e pouco eu não quero mais”.
Aqui é um momento muito difícil e que, não raro, acaba se mostrando como uma enorme fonte de conflitos, uma vez que, torna-se quase que impossível a continuidade de identificação com as antigas e mais variadas formas de relação, as quais, de forma totalmente inconscientes de nossas mais profundas necessidades, as mantínhamos. Quase tudo se mostra “muito pequeno” diante de tamanha grandeza, vivenciada em nosso “cósmico amor de férias de verão”... Tudo fica muito sem sal... O ambiente familiar, as antigas práticas e preferências, os hobbies, crenças, a prática profissional, relacionamento, amizades... Tudo passa a se mostrar sem sentido, tudo passa a se mostrar sem sal e sem açúcar... Tudo se mostra infinitamente pequeno. E, para a amplitude de nosso solitário desespero, aqueles que nos são familiares nestes ambientes, além de não compreenderem nossa instantânea transformação e, em muitos casos, a recusa de participação, nos impõem fortíssima resistência, a qual sempre nos aponta o fórceps ao ajustamento. Em meio de nosso desespero, não encontramos palavras para explicar aos que nos são familiares a realidade do que ocorre conosco em nosso interior; e nem teria como: para compreender isso, só mesmo aqueles que conhecem o alfabeto da “língua dos anjos, a língua do céu e do inferno de Dante”. É a duras penas que constatamos que diante dessas condicionadas influências externas, as quais quase sempre visam — de forma inconsciente — o aborto do nosso processo do reencontro consigo mesmo, o idioma mais aconselhável é o idioma do silêncio, silêncio este que nada tem a ver com o rancoroso silêncio quase sempre exercido quando nos domínios da mente adquirida. Aqui, independente das opiniões do mundo, por mais que falem que estamos doentes, que estamos vivendo uma ilusão, que precisamos de ajuda médica para voltarmos para aquele estado que eles consideram como “normal”, permanece em nós, a certeza desta Realidade Única, Realidade esta, que nos foi gravada a Ferro e Fogo em cada célula de nosso organismo, indo muito mais além do corpo físico, pois tal vivência benfazeja fica intrinsicamente marcada em nosso corpo anímico energético.
Em vista da pequenez do que nos é oferecido, devido a total inconsciência por parte dos que nos são familiares, quanto ao que se refere a este rito de passagem para a busca da Realidade Única do Ser que somos, é que iniciamos um processo de busca por mentes que tenham se aventurado na trilha menos percorrida, conhecida por muitos como “A Jornada do Herói” ou “O retorno do Filho Pródigo”. Passamos a buscar por aqueles que também viveram esse “cósmico romance de férias de verão”, na expectativa de encontrar por alguém que tenha ido fundo nessa busca e que tenha conseguido a graça desse “Casamento Sagrado”, dessa “Boda Cósmica”, dessa “Núpcia Búdica, Crística”, e que tenha a capacidade sensitiva para transmitir ao mundo o aroma do filho nascido desse encontro divino, cuja natureza real é bem-aventurança, felicidade, alegria, compaixão integrativa e completude. E, quando temos a graça de encontrar uma premiada Testemunha desse processo e com ela passamos a manter íntimo contato em seriedade, torna-se ainda mais difícil a possibilidade de ajustamento às descabidas exigências do nosso antigo mundo de relação, de encontrar graça e nutrição nesses ambientes que até antes dessa experiência do “cósmico romance de férias de verão” nos proporcionava liga, ainda que passageira, uma vez que as mesmas quase sempre se viam maculadas pelo silencioso tédio e a dolorosa insatisfação.
A partir do contato com as reverberações dessas “mentes Testemunhas”, dá-se início a um longo processo de depuração de nossos condicionamentos, processo este que denominamos de “processo de prontificação”. É um limpar da casa para que a mesma esteja preparada para receber, de braços abertos e em estado de repouso, o Ser Amado conhecido em nosso momento atemporal de “romance de verão”. Sabemos de forma intuitiva que este Ser Amado, não entra em casa suja. A limpeza se faz necessária. É um processo que nos dá condições de reparar as ilusões cometidas diante de tanto tempo de exposição a impulsos inconscientes e inconsequentes, e isso se mostra bastante doloroso; esse processo de reparar nos segredos, nas ilusões, nas mentiras que contamos para nós mesmos e que as derramamos sobre os demais... Trazer isso à luz da própria consciência e seguir aquilo que a consciência pedirá para ser feito mediante esse observar... Seguir as reparações que lhe são pedidas pela consciência é o que se mostra difícil e que nos faz compreender a essência da expressão cristã: “Pai, afasta de mim este cálice; mas, que seja feita a Sua vontade e não a minha”. E, não raro, são muitos os que se aventuram e que abandonam a trilha menos percorrida, quando se apresenta esse conflituoso momento de reparação, onde compreendemos bem outra expressão cristã: “Não vim para trazer a paz, mas a espada... Não vim trazer a paz, mas dissensão”.
Para quem não vivenciou esse “cósmico romance de férias de verão”, esse encontro, esse fogoso beijo da Consciência Pura, é muito fácil se distrair com uma série de influências, logo no início da caminhada... É muito fácil! Quem chegou neste caminho apenas pela curiosidade, que não foi batizado pelo absurdo, é muito fácil de se perder na busca de segurança financeira, profissional, na busca de aceitação social, de respeitabilidade parental, ou na busca de dependência de relacionamento romântico, gerada pelo medo do abandono e da solidão, e da necessidade de dar vazão as exigências do ainda não trabalhado, instinto sexual. Agora, aquele que teve essa Divina experiência, não tem como não dar continuidade ao clamor interno do chamado; sem isso, o tão necessário silêncio mental torna-se impossível. Para este último, em seu processo, podem até ocorrer o que chamamos de “saídas do Ser”, mas as mesmas são logo percebidas e devidamente reparadas, dando continuidade ao processo de prontificação. São estes que lançam a rede do autoconhecimento e deixam de lado o peixe pequeno da ilusão, agarrando-se ao Grande Peixe da Realidade Única. Aqui encontramos uma força interna que nos torna capazes de, sem grande alarde, abrir mão daquelas situações que não proporcionam o contato para o Grande Contato com a Realidade Única que somos. Os peixes pequenos que estão tão somente identificados com o brejo da horizontalidade egóica... Desses, nos distanciamos. Não o fazemos por rancor, mas sim, pela consciência interna de que investir tempo e energia nessas situações em nada nos ajudam para a realização da única coisa necessária: a potencialização e a realização da Realidade Única que somos.
De fato, não é nada fácil abrir mão de nossas ilusórias dependências psicológicas; não é nada fácil fazer frente aos medos resultantes da preocupação com a opinião de terceiros, do medo de ter a nossa imagem riscada e de sermos lançados ao ostracismo e de não termos a quem recorrer num futuro de possíveis necessidades. O medo de que virem as costas para nós é que nos impede de virar as costas para tudo aquilo que não mais nos proporciona por encontros nutritivos. Aqui, uma importante pergunta se faz necessária: “O que de fato estamos buscando?” A qualidade da resposta a esta pergunta é que nos dá o ingresso para a baldeação a outro estado de consciência ou ao término de nossa viagem consciencial. O que parece qualificar a resposta a esta pergunta está na qualidade e intensidade da dor vivida quando em nossa vivência do Absurdo. Nada melhor do que ela para nos apresentar o irreal e nos lançar no portal da grande realidade.
Hoje, sem a menor dificuldade abrimos mão de situações que não comunguem para a manifestação do ambiente necessário ao surgimento do estado de consagração, ou seja, para o estado de “estar no Sagrado”. Não mais nos preocupam as opiniões dos “fanáticos egos sociais”, se vão ou não nos chamar de fanáticos ou outro rótulo qualquer. Se eles podem ser fanáticos pelas crenças sociais, porque não podemos ser fanáticos pelo retorno a nossa Real Natureza? Hoje, mil vezes a solidão do que um ajuntamento condicionado; hoje, o que importa é “a única coisa necessária”, a qual só é conhecida por aqueles que têm coragem, e aos quais cabe aqui, a nossa saudação.

Outsider

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Escolho meus amigos pela pupila

Escolho meus amigos não pela pele ou outro arquétipo qualquer, mas pela pupila. Tem que ter brilho questionador e tonalidade inquietante.

A mim não interessam os bons de espírito nem os maus de hábitos. Fico com aqueles que fazem de mim louco e santo. Deles não quero resposta, quero meu avesso. Que me tragam dúvidas e angústias e agüentem o que há de pior em mim.

Para isso, só sendo louco! Quero os santos, para que não duvidem das diferenças e peçam perdão pelas injustiças.

Escolho meus amigos pela alma lavada e pela cara exposta. Não quero só o ombro e o colo, quero também sua maior alegria. Amigo que não ri junto, não sabe sofrer junto. Meus amigos são todos assim: metade bobeira, metade seriedade. Não quero risos previsíveis, nem choros piedosos.

Quero amigos sérios, daqueles que fazem da realidade sua fonte de aprendizagem, mas lutam para que a fantasia não desapareça. Não quero amigos adultos nem chatos. Quero-os metade infância e outra metade velhice! Crianças, para que não esqueçam o valor do vento no rosto; e velhos, para que nunca tenham pressa. Tenho amigos para saber quem eu sou. Pois ao vê-los loucos e santos, bobos e sérios, crianças e velhos, nunca me esquecerei de que a "normalidade" é uma ilusão imbecil e estéril.

Oscar Wilde

QUE BOM QUE VOCÊ CHEGOU! JUNTE-SE À NÓS!