Este blog não foi criado para quem já fechou as persianas de sua mente e cuidadosamente as fixou para que nenhum filete de luz de novas idéias penetre e perturbe sua sonolenta e estagnante zona de conforto. Este blog é para os poucos que querem entrar na terra firme da experiência direta por não verem outro caminho mais seguro a tomar.

14 junho 2015

A vivência da loucura que tudo cura

Dizia o finado poeta: “Nos deram espelhos e vimos um mundo doente”... Sim! A educação que nos foi apresentada fez com que tivéssemos um olhar totalmente adulterado, um olhar adoentado e, quanto a esses espelhos, não foram por breves instantes que nos mantivemos diante deles... Para a grande maioria de nós, foram décadas! Então, leitor, imagine você, várias décadas de exposição a valores arcaicos e disfuncionais, profundamente limitantes, fazendo com que nossa visão de mundo se desse por meio de um espelho deformado... Um imenso salão de relações de espelhos deformados...
Depois que recebemos um forte chacoalho da Grande Vida, esse chamado, esse convite para o resgate da Consciência que somos, é lógico que se faz necessário uma grande quantidade de material para nos ajudar a limpar esse espelho, para ajudar a retirar a grossa camada de poeira que nos impede a clareza de visão. Então começa uma busca através de livros, áudios, filmes, vídeos, blogs, entre outras ferramentas, as quais saiam dessa visão ordinária — que já não nos alimenta mais — e nos apontem para o “Extraordinário”. É através desse “extraordinário” que começamos nosso processo de “Educação Psíquica-emocional”.
Durantes estes longos anos de “mestrado de si mesmo”, raros foram os encontros onde pudemos testemunhar falas que retratavam o conhecimento direto de uma vivência real do Inusitado, do Inefável, do Extraordinário. Quase todas as falas tinham em comum um ponto inicial de partida, manifesto pela identificação partida com o antigo modo de ser, o qual através da enorme intensidade da dor clarificou-nos a percepção quanto a insanidade dos valores a que muitos de nós nos mantínhamos apegados. Raros apresentavam relatos de algo semelhante a uma genuína experiência religiosa, uma vivência atemporal, um estado não dualista de ser. Os relatos traziam como base o lado obscuro do Absurdo, o qual arrancará a Graça de tudo aquilo que antes nos trazia graça. O discurso era sempre o mesmo em quase todas as escolas iniciática por onde passamos, na tentativa de encontrar respostas para as dúvidas resultantes da longa vivência do Absurdo e da brevidade da Graça, ambas profundamente marcantes e implicitamente transformadoras. A ânsia de encontrar ecos para isso que havíamos vivenciado era incomunicavelmente grande. Os ecos de depressão, ecos de mal estar, ecos de angústia e solidão se faziam frequentes, mas, sobre aquele estado de paz, sobre aquele estado de felicidade integrativa, sobre a compaixão abarcante, nos víamos como peregrinos solitários em meio de um escaldante deserto com ventos cortantes. Os dolorosos ecos retratavam uma espécie de “ordenação”, a qual cria enorme desordem naquilo que até antes da crise iniciática, mostrava-se como ordem.
O interessante é perceber que, o impulso inicial diante desse processo de ordenação, é o de lançar sobre ele um olhar desconfiado e negativo; não é difícil a compreensão do porque dessa forma de olhar para a manifestação da crise iniciática: não tivemos uma cultura, uma educação-psíquica, uma educação para a meditação e a contemplação... Nada disso! Toda nossa cultura mostrou-se voltada para a euforia, para a busca de prazer, poder e prestígio. Então, é óbvio que quando se apresentam essas vivências do “extraordinário”, essa experiência que nos arranca do ordinário e nos lança num forçoso e emergente processo de interiorização... E hoje fica muito o claro do porque desse processo ter sua fundamentação de forma extremamente dolorosa... Estávamos tão insensíveis, tão embotados, tão formatados, tão ajustados, chegamos a um estado de tal embrutecimento do olhar, da percepção, que só mesmo através de um choque muito doloroso para novamente voltarmos à percepção do sentir... Começar a perceber em si e no externo também.
Quando olhamos para trás, podemos ver a beleza daquilo que, aparentemente, nos parecia a maior das tragédias, quando, na realidade, um processo maravilhoso estava se apresentando: um processo de retomada desse estado de “Presença”, que somos. Então, foi preciso mesmo recorrer a várias escolas, a vários livros (quase sempre somente encontrados em sebos), porque, dentro do ordinário, não encontramos espaço para isso que aponta para o extraordinário; raros soletram essa forma de linguajar. Raramente encontram-se pessoas para comungar sobre isso; é muito difícil manter relacionamentos cujo propósito primordial comum está em relacionamentos que apontem para a manifestação da inteireza, para a manifestação da real integridade do Ser. Além de que, enquanto identificados com o ordinário, acreditamos que aquilo que vivemos faz jus ao significado da palavra relacionamento. Com o advento da crise iniciática, a qual nos força um olhar minucioso e destemido sobre nossas relações, dolorosamente tomamos consciência de que, aquilo que pensávamos ser relacionamentos, na realidade apontavam sempre para a exteriorização, para a euforia e não para a potencialização do processo de maturação do Ser que somos. Os relacionamentos nos forçavam para uma extenuante busca de transitórios valores externos, a maioria deles com obsolescência programada e não para a contemplação DISSO que já É. Então, nesse período inicial se mostrou muito difícil encontrar por falas com propriedade, ou seja, cuja vivência seja própria e não uma indevida apropriação de segunda mão... Por alguém que realmente viveu o processo do Absurdo e a Graça e conseguiu de alguma forma codificar “um dízimo”, a terça parte do que foi vivido; porque não há como falar tudo aquilo que foi vivido, pois essa vivência não é da dimensão das palavras, não é da dimensão do tempo e do espaço.
O que percebemos, ao recorrer a classe médica de saúde mental, foi que a mesma também se encontra com um olhar condicionado, ou seja, também encontra-se adoentada. Eles também vêm com seus pacotes de rótulos condicionantes — quase todos extraídos de livros acadêmicos e não da vivência própria — com os quais tentam ajustar e limitar a complexidade do ser que somos. Algo semelhante com a crença de que ao olhar para uma foto de uma bela mesa de alimentamos, podemos saber além do gosto, a complexidade da estrutura essencial dos mesmos. E grande maioria não viveu esse choque com seu consequente processo de ordenação.
Todo aquele que se encontra no momento vivenciando esse “batismo”, esse processo inicial de lavagem da mente condicionada, precisa estar ciente de que o mesmo se manifesta em meio de enormes períodos de confusão. Mas é preciso também saber dar um novo olhar para essa confusão e, através desse novo olhar, compreender que essa intensa confusão cumpre um papel fundamental nesse processo, pois, sem ela, devido a nossa forte tendência ao ajustamento, não raro nos entregamos ao processo de euforia e ao consequente esquecimento da emergência do autoconhecimento. Como num dito da sabedoria popular, “a dor é a pedra de toque de todo crescimento espiritual” (se é que podemos usar para isso a palavra “crescimento”). Se não tiver um batizado nesse processo de dor, com a devida intensidade, a mente adquirida, por ser facilmente influenciável pega seu par de tênis de corrida e sai em disparada no sentido contrário da arena do autoconhecimento. E é claro que, se nesse momento de confusão, em meio a incerteza, buscarmos por confirmação no meio daqueles que nunca viveram esse batismo, receberemos retornos que, apesar de tentarem nos ajudar por meio de condicionamentos, apenas servem para aumentar o já instalado estado de confusão (isso quando não confirmarem os rótulos da classe médica de que você está ficando louco e que necessita de acompanhamento médico, farmacológico ou na frequência assídua a alguma forma de sistema de crença organizada). Tudo isso é claro que é uma tentativa de ajudar, mas que, segundo a nossa experiência, em nada ajudam, apenas atrapalham e intensificam ainda mais a natureza de nosso conflito iniciático. Então, há mesmo que se buscar com urgência, por aqueles que conhecem o idioma da “tempestuosa busca do ser que somos” e que, através da limitação das palavras e dos símbolos tentaram nos deixar um aviso nos dizendo: “Olha, eu te compreendo! Você não está ficando louco, não! Isso que você está quase acreditando ser loucura é, na verdade, a loucura que cura de toda loucura! Isso não é doença; doença é o que você viveu até aqui! Se sua dor não for o suficiente para você acreditar, olhe o que se apresenta no planeta... Veja o olhar das pessoas logo pela manhã nos coletivos ou quando voltam de seus locais de trabalho e ali você verá a doença. Portanto, em vista disso lhe incentivo: Ouse abraçar sua dor! Aventure-se nessa trilha menos percorrida, percorra a jornada do herói a qual encerra as sementes de sua integridade curativa, criativa e integrativa. Bem haja excelência no seu agora, mesmo que esse agora se mostre dolorosamente fecundo. Você não está só!”
Outsider

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Escolho meus amigos pela pupila

Escolho meus amigos não pela pele ou outro arquétipo qualquer, mas pela pupila. Tem que ter brilho questionador e tonalidade inquietante.

A mim não interessam os bons de espírito nem os maus de hábitos. Fico com aqueles que fazem de mim louco e santo. Deles não quero resposta, quero meu avesso. Que me tragam dúvidas e angústias e agüentem o que há de pior em mim.

Para isso, só sendo louco! Quero os santos, para que não duvidem das diferenças e peçam perdão pelas injustiças.

Escolho meus amigos pela alma lavada e pela cara exposta. Não quero só o ombro e o colo, quero também sua maior alegria. Amigo que não ri junto, não sabe sofrer junto. Meus amigos são todos assim: metade bobeira, metade seriedade. Não quero risos previsíveis, nem choros piedosos.

Quero amigos sérios, daqueles que fazem da realidade sua fonte de aprendizagem, mas lutam para que a fantasia não desapareça. Não quero amigos adultos nem chatos. Quero-os metade infância e outra metade velhice! Crianças, para que não esqueçam o valor do vento no rosto; e velhos, para que nunca tenham pressa. Tenho amigos para saber quem eu sou. Pois ao vê-los loucos e santos, bobos e sérios, crianças e velhos, nunca me esquecerei de que a "normalidade" é uma ilusão imbecil e estéril.

Oscar Wilde

QUE BOM QUE VOCÊ CHEGOU! JUNTE-SE À NÓS!