Este blog não foi criado para quem já fechou as persianas de sua mente e cuidadosamente as fixou para que nenhum filete de luz de novas idéias penetre e perturbe sua sonolenta e estagnante zona de conforto. Este blog é para os poucos que querem entrar na terra firme da experiência direta por não verem outro caminho mais seguro a tomar.

13 julho 2010

Alice no país da Plastificadas Polyanas de bunda grande

Era uma raríssima vez... Numa linda tarde de céu carbonal, Alice estava sentada à margem da poluída represa Guarapiranga enquanto sua siliconada irmã lia em voz alta um revista da socialite Brasileira. Alice, porém, entediada como sempre, não prestava sequer um mínimo de atenção. Ao contrário da irmã, de forma silenciosa observava os movimentos de seu pequenino e rabugento cão. E, insatisfeita pela falta de conversas nutritivas, enquanto seu cachorro lhe lambia uma das mãos, exclamou:
- Ah, Krish! Como eu gostaria que você pudesse conversar comigo! Quem sabe você poderia saciar minha sede de conversas com conteúdo, distantes da constante trivialidade de todos!
Sem tentar disfarçar sua inconformidade diante da fala de sua irmã, Polly Jr. Exclamou:
- Sua imbecil, os animais não podem falar! Pare de ficar viajando na maionese e trate de prestar atenção no que leio, caso contrário, não terá assunto quando for ao cabeleireiro.
Sem dar atenção ao que Polly dizia, levantou-se com Krish ao seu colo, passou a mão em seu focinho molhado e disse num tom que só o cachorro pudesse ouvir:
- Garanto que as coisas interessantes que você teria para me dizer, de modo algum fariam parte dos sanguinários programas da nossa TV aberta! Que bom seria se os absurdos modos de vida dos ditos normais fossem realmente vistos como absurdos e que os absurdos de nós, os chamados por eles de "acomodados", não fossem para eles absurdos!
O cachorro, carinhosamente passou a pata em seu rosto, como se estivesse concordando com seu ponto de vista.
- Se eu pudesse pular fora deste louco mundo de desunião e acessar um mundo sem a ilusória sensação de separatividade, com certeza poderia aprender muito com as falas da mãe natureza.
De repente, um gordo coelho, às pressas, intercalava seus movimentos, ora tocando uma irritante vuvuzela, ora olhando para um enorme relógio e gritando aos quatro ventos...
- É tarde! É tarde! É tarde! Estamos atrasados, eles vão sair na nossa frente! Vuuuuuuuuuuuuuuuuuu! Vuuuuuuuuuuuuuuu! É tarde! É tarde! É tarde!...
Sem entender muito bem o que via, olhou profundamente nos olhos de Krish e perguntou:
- Krish! Você viu aquilo? Um gordo coelho marketeiro, tocando vuvuzelas?
- Au! Au! Au!
- Que estranho! Nunca tinha visto antes um coelho tão barulhento! Por que será que ele está tão apressado? De quem será que ele está falando? E que mal gosto aquela vuvuzela. Venha Krish, vamos atrás dele.
- É tarde! É tarde! É tarde! Estamos atrasados, eles vão sair na nossa frente! Vuuuuuuuuuuuuuuuuuu! Vuuuuuuuuuuuuuuu! É tarde! É tarde! É tarde!...
- Ei, seu coelho! Espere! Qual o motivo de tanta pressa e barulho?
- É tarde! É tarde! É tarde! Estamos atrasados, eles vão sair na nossa frente! Vuuuuuuuuuuuuuuuuuu! Vuuuuuuuuuuuuuuu! É tarde! É tarde! É tarde!... Tenho um encontro importantíssimo com um proprietário de uma grande empresa!
- Espere um momento, por favor!
Sem dar-lhe ouvidos, o pequeno e barulhento coelho passou por baixo da cancela do estacionamento do Shopping, em direção às automáticas e bem lustradas portas de vidro, enquanto fazia o mesmo alarido:
- É tarde! É tarde! É tarde! Estamos atrasados, eles vão sair na nossa frente! Vuuuuuuuuuuuuuuuuuu! Vuuuuuuuuuuuuuuu! É tarde! É tarde! É tarde!...
- Por aqui, Krish... Vamos ver para onde ele vai!
Então, quando Alice ultrapassou os lustrados limites daquele poço sem fundo de consumo...
- Oh! Me ajudem, estou caindo! Krishhhhhhhhhhh!
Enquanto caia, via passar diante de seus olhos, uma imensidão de símbolos e mais símbolos de corporações, ao mesmo tempo em que barulhentos jingles se misturavam entre si, formando juntamente com as imagens, um conteúdo quase que hipnótico.
- Engraçado! Nunca tinha visto com tanta clareza a infantilidade dos apelos desses anúncios... Olha lá o coelho...
- É tarde! É tarde! É tarde! Estamos atrasados, eles vão sair na nossa frente! Vuuuuuuuuuuuuuuuuuu! Vuuuuuuuuuuuuuuu! É tarde! É tarde! É tarde!...
De repente, Alice viu-se refletida num encerado piso de mármore de uma redonda sala, repleta de vitrines, com diferentes adesivos de promoções. Na sala, apenas uma pequenina porta, por onde passou apertado o apressado coelho.
- Ah, ele fechou a porta! E agora? Não posso ficar aqui diante dessas frases de engodo. Tenho que sair daqui, mas como? Talvez não esteja trancada.
- Ai! - exclamou a maçaneta. Você está louca?
- Oh, desculpe! Uma maçaneta que fala! Nunca havia pensado nisso antes!
- Está desculpada! Não entendo você... Além de torcer meu nariz com bastante força, não se deu ao trabalho de conferir os coloridos avisos promocionais.
- Sabe, não estou muito interessada nisso! Há tempos que pratico um estilo de vida se simplicidade voluntária.
- Então, o que você está fazendo aqui?
- Estou atrás daquele apressado coelho branco que passou por aqui.
- Ah, aquele imbecil tocando aquela irritante vuvuzela? O desgraçado quase que acaba com os meu ouvidos! Ainda bem que eu estava aberta!
- Posso dar uma espiada se ele ainda está por aí?
- Ok! Pode olhar!
- Dá para abrir um pouquinho mais sua boca?
- Assim está bem?
- Ótimo! Não o estou vendo... Puxa, como ali dentro é bonito! Será que eu posso passar?
- Está maluca? Não tem como passar por aqui com uma consciência desse tamanho. Faz o seguinte...
- Diga!
- Está vendo aquela garrafinha em cima da mesa?
- Sim! Que tem ela?
- É um combinado de várias marcas de cerveja. Basta algumas gotas de seu combinado teor alcoólico para fazer com que sua consciência "normalize". É só beber um pouco que você "desce redondo" por este espaço.
Quando Alice bebe do concentrado...
- Nossa!... Que doideira! Deu um "tuim" na minha cabeça, sinto-me menor do que realmente sou... Bem, acho que já estou do tamanho de todos que passam por esta porta. Opa! Está trancada!
- Foi mal! Esqueci de lhe avisar que a chave para atravessar esta porta está sobre a mesa!
- Que merda! Nessa mediocridade de tamanho, como é possível para mim acessá-la?
- Está vendo aquele livrinho ali no canto? É um compendio de homens que deram certo. Dê uma breve olhada, mas não vá muito fundo!
- Nossa! - Exclamou Alice, quase batendo sua cabeça no teto do salão. - Acho que me aprofundei demais! - Sem que a fechadura percebesse, Alice retirou rapidamente uma pequena folha do livro, escondendo-a num de seus bolsos.
- Que dúvida!
- Agora nunca mais passarei pela porta! Que eu fiz? Terei que passar o resto dos meus dias, em solidão.
- Ora, ora... Uma moça que subiu nos ombros de homens que viram tão longe, chorando por medos tão infantis! Por favor, pare de chorar ou suas lágrimas, além de lavarem sua alma, vão acabar por me afogar! Depressa, pegue a garrafa e não pense! Beba logo!
- Claro! Por que não pensei nisso antes!... Está funcionando novamente! Estou ficando menor! - Agora vê se não se afoga em suas próprias lágrimas! Use-as para ultrapassar este portal que é a minha boca. Vamos!
Após passar pelo buraco estreito, Alice se vê rodeada por uma porção de abutres surpreendidos pelo mar de suas lágrimas... Depois de um pouco de esforço, todos alcançam uma ilha e iniciam uma dança funk...
- Ei, o que vocês estão fazendo?
- Se liga no movimento! Bundinha prá frente, bundinha prá traz, agora senta e levanta... bundinha pra frente, bundinha pra traz...
- Nossa! Que movimento horroroso!
- Se liga! Assim você nunca conseguirá fazer parte!
- Mas eu não estou querendo ser parte... Quero ser inteira!
- É tarde! É tarde! É tarde! Estamos atrasados, eles vão sair na nossa frente! Vuuuuuuuuuuuuuuuuuu! Vuuuuuuuuuuuuuuu! É tarde! É tarde! É tarde!...
- O gordo coelho branco!
- Desculpe não me fundir ao seu balanço, mas tenho que ir andando!
- É tarde! É tarde! É tarde! Estamos atrasados, eles vão sair na nossa frente!
- Seu coelho, espere!
De repente, Alice viu-se de frente com uma encruzilhada pra lá de paralizante. Diante de seus ansiosos olhos, placas de várias seitas prometendo pelo único caminho verdadeiro.
- Nossa! Quanta baboseira! Como pode tanta gente seguir atrás disso tudo! Não quero nada disso! Só quero saber qual é a do coelho branco. Pra que lado será que ele foi?
De repente, uma voz sedutora, do nada surgiu.
- Ah, belezura! Isso depende de para onde você vai! A maioria que chega aqui, por não saber bem o que procura, acaba se perdendo numa dessa placas de ilusórias promessas.
- Essas promessas para mim nada importam!
- Tem certeza? Nenhum desses caminhos lhe importa? Nenhum deles lhe chama atenção? Tem certeza?
Dito isso, deixou surgir seu corpo por cima de um desgastado tronco.
- Mas veja só... Um belo modelo de gato!
- Não um gato qualquer! Sou um divino diplomata! Você deve saber que existe uma grande diferença. Falam diferentes coisas a meu respeito.
- Para mim, não me importam as opiniões, gosto de lidar com fatos. Quero saber se você tem sabedoria.
- Minha cara, mais do que isso: prudência e vivacidade!
- Se é tudo isso, com certeza poderá me ajudar. Estou atrás de um gordo coelho branco.
- Se eu fosse você, então procuraria antes pelo louco de colarinho branco e a lebre maluca.
- De gente louca, já chega de onde venho.
- Então sinto lhe informar: está perdendo seu tempo, pois aqui só tem gente louca.
- Bem, se todos por aqui são assim, já estou escolada. É só dar a eles o que eles querem: prestigio sem qualquer tipo de contradição ou questionamento. Fácil. Com jeitinho, você dá a eles um litro de leite, que sem querer eles te devolvem uma vaca inteira. Se bem que não funciona com todos, alguns estão muito comprometidos. Espero que não seja o caso desses dois.
Sem a menor hesitação, Alice deixou as coloridas placas e seguiu o caminho indicado pelo gato. Não muito distante dali, pode começar a ouvir um barulho festivo.
- É pic, é pic, é pic, é pic, é pic, é hora...
- Não brinca! Será que até aqui insistem nessa musiquinha babaca? Só faltam cantar aquela do " com quem será?"...
- Quem é você?
- Pensando bem, ainda não sei. Você poderia começar nosso primeiro contato com uma perguntinha menos difícil. Posso saber o que vocês estão bebendo? Espero que não seja cerveja. Até hoje não consigo entender qual é a graça que as pessoas vêem nessa bebida.
Dito isto, esticou sua mão em direção ao bule...
- Não se atreva, mocinha! Não pode se sentar sem apresentação de seu curriculum vitae.
- Mas há muito lugares desocupados!
- Não interessa! Sem um expressivo curriculum vitae não tem jeito. Posso saber quem te indicou? é muita indelicadeza sua querer ocupar uma cadeira sem ao menos ter sido indicada.
- Sim, in-de-li-ca-de-za! - Retrucou a lebre maluca, colocando o dedo indicador em seu nariz.
- Ora essa! Sinto muito! Não queria interromper seu aniversário. Aliás, confesso que sempre detestei esse tipo de festa. É sempre a mesma ladainha: um monte de crianças pentelhas, com seus barrigudos pais disputando quem tem mais conquistas, enquanto as mães, junto com as avós, na cozinha tratam de falar da vida de alguém não presente na festa. Sem falar naquele monte de funcionários vestidos feito babacas, com seus sorrisos amarelos tentando fazer a festa atrativa. Quer saber: acho tudo isso um saco!
- Aniversário? Menina, sinto lhe dizer que você está muito enganada. Isto é uma festa de desaniversário!
- O que é isso?
- Que mania abestada essa sua de fazer perguntas... Nunca se deu conta disso?
- Disso o que?
- Todo mundo puxa seu saco uma vez por ano para depois enche-lo novamente durante 364 dias. Num dia todo mundo te ama, nos outros, quase sempre você é alvo de maliciosas fofocas.
- Pensando bem, faz sentido. Sendo assim, mereço uma xícara do que quer que seja que vocês estejam bebendo, afinal de contas, hoje também é meu desaniversário.
- Nesse caso! Muita merda para você, menina!
- Obrigado! Dispenso o irritante Pic-Pic! Quero apenas um pedaço de bolo!
Mal tinha acabado de falar, a lebre maluca enfiou a grossa fatia de bolo em seu rosto. Limpando os olhos, enquanto a lebre quase se desmanchava de tanto rir, exclamou:
- Não gostei nenhum um pouco dessa brincadeira.
- Deixe de ser hipócrita menina. Só fizemos com você aquilo que você sempre quis fazer com os outros mas que nunca teve coragem para fazê-lo. Não é verdade?
Apesar da raiva, não havia como contrariá-los.
- Agora, o Abutre vai dizer algumas palavras! - exclamou o louco de colarinho branco.
- Abutre? Até aqui? Duvido que diga alguma coisa que se aproveite!
- Pensando bem, já falou demais. Aliás quase todo mundo que fala demais, nunca tem nada a dizer.
- Por favor, menina, assuma a audiência trocando de lugar com ele. Mas antes, de entrar no ar, puxe um pouquinho mais seu vestido para cima. Está muito comprido. Tem que aparecer as calcinhas, senão, nosso ibope vai lá pra baixo.
- Xi! Pelo visto, até aqui é a mediocridade que dá ibope!
- Mediocridade? Vamos mudar de assunto! - Gritou a lebre louca.
- E por falar em mediocridade... Por que um partido se chama partido, ao invés de "inteiro"?
- Acho que sei responder, senhor louco de colarinho branco!
- Então, responda! - Desafiou cruzando os braços e batendo seu esquerdo e lustrado sapato preto junto ao solo.
- Porque é formado por fragmentos e não por inteiros.
- Cuidado... Cuidado! Ela deve estar ficando louca! Menina, você não tem medo que algum advogado de plantão escute sua afirmação?
- Medo por que? Você não assiste televisão? Tendo dinheiro, sempre se consegue um "habeas corpus" (apesar desse não ser o meu caso).
- Não fique nervosa por isso, menina! Que tal uma xícara de chá de "corruptus catives"?
- Chega! Vocês conseguiram me entediar demais. Não tenho tempo para perder com tanta idiotice. Adeus!
- Ora, ora minha cara colega, não fique brava! Que tal fazermos uma aliança? Pode ser um bom esquema para todos nós! Por favor, volte aqui, ou melhor, vote aqui!
- Esse foi o "Pic-Pic" mais besta de todos os tempos!... Estou ficando cansada de andar atrás daquele gordo coelho branco e também de todos os tipos malucos daqui! O pior é essa inquietude aqui no peito que nunca passa. Meu corpo dói todo; as costas parecem que vão estourar. Quero tanto voltar para casa!... Sinto que andei tanto, mas me sinto perdida! Talvez o caminho seja mesmo uma terra sem caminho, um verdadeiro deserto de mim mesma. Só espero que não seja por muito tempo. Bem, quando a gente está perdido e exaurido num deserto, o lance é torcer para que "algo" encontre a gente... Só espero que esse "algo" não me destrua...
- Sim! Chamou, senhorita?
- Quem está aí?
- Quase eu! Como você, ainda não estou inteiro!
- Estou perdida, ao menos isso eu sei!
- Isso é um bom sinal! Só os que sabem estar perdidos é que podem se encontrar!
- Por favor, dispenso sua filosofia de prateleira! Só quero saber se você pode ensinar o meu caminho!
- Se o caminho é seu, como posso lhe ensinar?
- Sei lá? De onde venho, está cheio de gente dizendo saber o melhor caminho para mim, contanto que eu assine seus "bentos carnezinhos"!
- Ah, menina! Por que você não faz como a grande maioria das meninas da sua idade: finja que é feliz! Aparente felicidade!
- Sinto muito, mas, quem vive de aparência, só aparentemente vive! Preciso saber qual é o meu caminho. Então, vai me ajudar ou não?
- Sinto muito lhe dizer mas, você não tem caminho. Quem sabe a empresa possa lhe ajudar!
- E onde posso encontrá-la?
- Vai até o final desse corredor, perto daquela grande loja de inconveniências convenientes... Tem uma escada rolante, desça mais dois andares. Fica bem lá no fundo! Só um detalhe: quem avisa amigo é! Não faça a empresa perder a cabeça e fique bem de olho na sua! Faça como o padre: um olho na missa e outro no santo!
- Credo! Que analogia besta! Detesto padres. Aliás, detesto todos que vem com aquela vozinha mansa de quem se diz "deificado". Sacou? Aquele tipinho lobo em pele de cordeiro com direitoa vídeo no YouTube. É preciso muito cuidado com esses tipos, principalmente estar atento se seus cintos e zippers estão bem fechados.
Ao chegar ao término das escadas, bem no fundo do corredor, Alice se depara com o saguão de recepção da empresa...
- Puxa! Até que seria um lugar maravilhoso se a maioria das flores não fossem de plástico. Não consigo entender essa fixação dos adultos pela plasticidade das coisas. Insistem em colocar plástico em tudo. Como se não bastasse o plástico, agora tem também o tal do silicone. Ei, quem são vocês com esses enormes crachás? Podem me dizer por que estão pintando as rosas de vermelho?
- Olha só, na real, eram para ser vermelhas, mas digitamos o código errado no Palm Top e o sistema acabou enviando as flores brancas. Se a empresa souber, nossas cabeças vão rolar.
- Só por causa de um erro no sistema?
- Sim!
- Nesse caso, como sou contra o sistema é melhor eu ajudá-los. Se bem que por vezes, perder a cabeça pode ser um grande sinal de saúde.
- Xi, ferrou! Lá vem a empresa com toda equipe de puxa-sacos!
- E agora? Que faço? Nunca estive diante de uma empresa!... Mas olha só! Não é que o apressado coelho é parte integrante da empresa?
- Vuuuuuuuuuuuuuuuuuu! Vuuuuuuuuuuuuuuu! E agora para você e a sua família o melhor da melhor das piores empresas... Vuuuuuuuuuuuuuuuuuu! Vuuuuuuuuuuuuuuu!
- Então é por isso que ele estava tão apressado! Ele precisava anunciar as qualidades da empresa. Acho que corria tanto, por medo de ser "degolado". É o ego nunca quer ficar de lado.
Com a pseuda segurança de quem sofre de um brutal complexo de inferioridade a empresa de forma barulhenta se manifestou:
- Quem ou o que é isso aí? Você marcou horário com minha secretária?
- Não sei, senhora! Com certeza não é um dos nossos. Talvez uma espiã da concorrência. - respondeu o pequeno contador.
- Bem, seja o que for, fale logo! Pare de esfregar as mãos feito aprendiz empresária e apresente-me logo sua dinâmica! E acho mais do justo que você diga sempre: sim, senhora!
- Sim, senhora!
- Onde está o seu crachá? Cadê seu curriculum? De que agência você vem e para que veio?
- Meu nome é Alice e estou tentando encontrar o meu caminho de volta para casa!
- O que quer dizer com o "seu" caminho? Fique sabendo que aqui não existe estrada de mão dupla. Todos os caminhos devem apontar na minha direção. Entendeu? Ou você serve a mim, ou você não serve!
- Mas eu ia lhe perguntar...
- Aqui quem faz as perguntas sou eu! É pegar ou largar! Se não quiser fala logo pois não tenho tempo a perder. Tempo é dinheiro! E para ter dinheiro, cabeças tem de rolar sempre! Ou me dá o que é meu, ou sai da fila que atrás tem gente!
- Mas...
- O que? Quem aprovou as rosas vermelhas?
- A senhora que pediu!
- Eu que pedi? Cadê o romaneio? tem a ordem de serviço?
- Não, não senhora! A culpa não é minha, é da administração.
- Não vem não! Não tenho nada a ver com isso! A culpa é da expedição!
- Vai se fu... Não tenho nada com isso! A culpa é do office-boy!
- Não quero saber... Cortem-lhes as cabeças... Vocês estão despedidos!
- Que horror! Nunca vi algo tão desumano assim! - Pensou Alice, bastante assustada.
- Você joga golfe?
- Eu... Hã... Sim, senhora!
- Então, providencie o inicio do jogo. Jogue o jogo, menina, jogue o jogo!
- Piãozada, depressa a seus postos. A empresa está estressada!
- Pegue logo um dos tacos e vamos começar... Quem vamos mandar primeiro para o buraco?
- Senhora, preciso lhe passar uma informação... Nunca joguei esse jogo?
- Como não? Que é isso menina? Você não tem ambição? Não vá me dizer que é mais um desses acomodados que não tem nada para acrescentar? Você tem que ter ambição... Tem que querer a custas dos outros alcançar novos buracos... Caso contrário, quem vai para o buraco é você! Vamos, atire! Você precisa ganhar todas as provas! Precisa ter visão acima da concorrência!
Pouco depois...
- Senhora, cuidado, pare! Espere um pouco, por favor!
- A cabeça de alguém vai rolar por isto! E será a sua, menina!
- Mas, senhora... Ela não poderia ser ouvida antes numa reunião? - Perguntou o contador.
- Reunião? Humm... Adoro reuniões! Elas me dão um ar de importância. Adoro ver o medo estampado nos rostos dos meus subordinados! Tragam o office-boy!
- O office-boy não, senhora! A reunião é sobre a menina!
- Mas como? Isso estava na pauta?
- Sim, senhora!
- Cabeças precisam rolar por isso!
Momentos depois, na grande sala de reuniões...
- Senhora empresa, membros do conselho deliberativo, advogados e associados! A estagiária aprendiz universitária, é acusada de fazer a empresa perder para a concorrência, o que fez com que a empresa perdesse a paciência.
- A estagiária aprendiz estava sobrecarregada para gerar tal desempenho?
- É que nunca joguei o jogo...
- Ainda não terminei, menina.
- Mas...
- O que o conselho deliberativo tem a dizer?
- Infelizmente você ficou abaixo da média. Sua falta de foco ao resultado, quase nos colocou num buraco. Sua performance, sua falta de vigor e de decisão na prova anterior faz com que nosso voto seja favorável para você ser despedida.
- E qual a opinião dos advogados e associados?
- Assinamos o voto do conselho deliberativo uma vez que não conseguimos entender alguém que traz consigo algo que poderia ser usado como uma vantagem competitiva, um diferencial, e que não faz uso do mesmo para proporcionar ganhos para empresa. E, por não ter a empresa como fator primordial de sua existência, nosso voto é para que ela seja despedida.
- Mas todas as partes não devem ser ouvidas? - Perguntou Alice.
- Os interesses da empresa sempre em primeiro lugar! - Exclamou bravamente a empresa.
- Há... senhora, não poderíamos "preparar" primeiro umas testemunhas e "comprar" alguns jurados? - Perguntou um dos advogados.
- É... Acho que não seria nada mal. Alice, quero agradecer a participação de você aqui e pedir que volte para a sala ao lado e aguarde pela nossa "Justa" decisão final.
- A primeira testemunha... O coelho Marketeiro!
- Que sabe você a respeito dos métodos desta empresa contra a menina?
- Nada.
- Nada mesmo?
- Nada mesmo!
- Isso é muito importante! Entenderam, jurados? - Gritou a empresa.
- Sim, senhora. Todos entendemos e estamos em acordo comum.
- A testemunha seguinte:... Chamem o Abutre!
- O que você tem a dizer sobre os restos de tudo isso?
- Muito bem! Não vejo como um Abutre como eu...
- Essa é a prova mais importante até agora! Tragam novamente ré!
- Senhora Empresa, gostaria de saber como é que você consegue fazer com que coisas sem importância sejam vistas como de profunda importância para a grande maioria das pessoas não pensantes.
- Cale a boca!... Mande entrar a testemunha seguinte!
- Aí está ele novamente nas paradas de sucesso!
- Quem está aí?
- Um gato sedutor!
- Um gato sedutor? Aiiii, você disse um gato sedutor?
- Salvem a empresa!
- Depressa, menina! A nova campanha! Pronto! Ponha esta nova campanha no nariz da empresa e ela voltará a se acalmar!
- Eu é que preciso fazer isso?
- Depressa, menina... Uma nova campanha!
- Aqui está senhora!
- Pronto! Pegue estes cartazes e banners e você ficará com o mérito de haver salvo os lucros da empresa!
- A cabeça de alguém vai rolar por isso! Alguém deve ser despedido! Ah, então é você a culpada! Chamem os abutres! - Bradou a empresa aos quatro cantos!
- Eu? Protesto! Eu não fiz nada! - Gritou Alice, enquanto enfiava as mãos nos bolsos de seu avental, onde encontrou um pedacinho de papel com alguns apontamentos dos livros que fazem a consciência das pessoas crescerem.
- Cortem-lhe a cabeça! Joguem-a para os abutres! - Gritou loucamente a empresa.
E então tendo sua consciência expandida, por uma unica frase lida no pedaço de papel, Alice virou-se para a Empresa e perguntou...
- Bem, senhora empresa, o que dizia a senhora, mesmo?
Com medo de perder sua posição diante do mercado por perceberem sua insegurança, a empresa tentou um acerto:
- Nada não, querida! Tudo não passou de um mal entendido causado pela falta de informação.
Mas antes que a empresa pudesse fazê-lo, Imediatamente, um dos advogados da empresa, munido dos estatutos disse:
- Artigo 44: "Toda pessoa que apresente consciência expandida deve ser excluída do network da empresa, sendo deixada ao ostracismo".
- Ah, é? Prefiro mil vezes a minha consciência expandida dos que as migalhas dependentes de vocês. Não tenho medo nenhum de vocês! Vocês não passam de uma associação falida a longo prazo!
- Quanto a senhora, não é uma verdadeira empresa! É apenas uma medíocre tirana exploradora, um tanto metida a multi-nacional, cercada de esfomeados abutres por todos os lados.... O que está acontecendo? Parece que estou encolhendo novamente...
- E então, menina desajustada! O que dizia mesmo? Perdeu uma grande chance de ficar calada e de bancar a contente.
- Chamou de tirana exploradora! - Espicaçou o Abutre!
- Cortem-lhe a cabeça! Você está despedida! A ela, seguranças! Não a deixem fugir com informações da empresa! Cortem-lhe a cabeça!
Nisso, desvencilhando-se das garras da segurança, Alice colocou-se a correr...
- Preciso urgentemente achar meu caminho de casa antes que seja tarde!
- Cortem-lhe a cabeça!
- Vuuuuuuuuuuuuuuuuuu! Vuuuuuuuuuuuuuuu! Cortem-lhe a cabeça!
- Seu coelho, por favor, o senhor não poderia me mostrar o caminho para sair daqui?
- É indelicado ir embora sem antes tomar uma xícara de chá corruptus catives!
- Não tenho tempo, a empresa quer tomar minha cabeça.
- Cortem-lhe a cabeça antes que sua consciência novamente se expanda! Cortem-lhe a cabeça!
- Oh, nossa! Ela está cada vez mais perto! Não posso me tornar cativa!... O que está acontecendo? Tudo parece estar ficando cada vez mais escuro!...
...
- Alice... Alice... Acorde! Acorde! está na hora de você acordar! Você precisa acordar!...
- Hã, o que?... Ufa! Tudo não passou de um sonho! Que alívio!
- Muito bem! Sonhando, em vez de ouvir as novidades! Não entendo você, Alice... Não entendo essa sua recusa pela sedução da fama, do poder, do conhecimento controlador de fortuna. Não consigo entender do por que de você querer ser sempre tão diferente das pessoas normais e de sucesso.
- Se existe um Deus, que fique com todo sucesso e que não se esqueça de me manter livre de ser normal. Mas, uma coisa eu quero saber de você!
- Sim?

- Alguma vez você já sentiu em cada célula de seu corpo, o resultado de virar "Roma" do avesso? Se não, qual o sentido de toda essa merda?





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Escolho meus amigos pela pupila

Escolho meus amigos não pela pele ou outro arquétipo qualquer, mas pela pupila. Tem que ter brilho questionador e tonalidade inquietante.

A mim não interessam os bons de espírito nem os maus de hábitos. Fico com aqueles que fazem de mim louco e santo. Deles não quero resposta, quero meu avesso. Que me tragam dúvidas e angústias e agüentem o que há de pior em mim.

Para isso, só sendo louco! Quero os santos, para que não duvidem das diferenças e peçam perdão pelas injustiças.

Escolho meus amigos pela alma lavada e pela cara exposta. Não quero só o ombro e o colo, quero também sua maior alegria. Amigo que não ri junto, não sabe sofrer junto. Meus amigos são todos assim: metade bobeira, metade seriedade. Não quero risos previsíveis, nem choros piedosos.

Quero amigos sérios, daqueles que fazem da realidade sua fonte de aprendizagem, mas lutam para que a fantasia não desapareça. Não quero amigos adultos nem chatos. Quero-os metade infância e outra metade velhice! Crianças, para que não esqueçam o valor do vento no rosto; e velhos, para que nunca tenham pressa. Tenho amigos para saber quem eu sou. Pois ao vê-los loucos e santos, bobos e sérios, crianças e velhos, nunca me esquecerei de que a "normalidade" é uma ilusão imbecil e estéril.

Oscar Wilde

QUE BOM QUE VOCÊ CHEGOU! JUNTE-SE À NÓS!