Este blog não foi criado para quem já fechou as persianas de sua mente e cuidadosamente as fixou para que nenhum filete de luz de novas idéias penetre e perturbe sua sonolenta e estagnante zona de conforto. Este blog é para os poucos que querem entrar na terra firme da experiência direta por não verem outro caminho mais seguro a tomar.

27 maio 2007

Play de Game

Ontem a noite tive uma experiência bastante interessante. Eu e minha esposa fomos convidados por um casal de amigos para uma reunião em seu apartamento. Estava programada a presença de outros amigos em comum, mas, o que acabou ocorrendo é que acabamos ficando somente nós quatro versando sobre assuntos do nosso passado e a nossa atual busca de vida. Num determinado momento da conversa, após umas duas latinhas de cerveja exclamei em alto tom:
- Nós, seres humanos somos todos hipócritas!...
Houve inicialmente uma coletiva reação de rejeição diante deste meu posicionamento.
No entanto, segundo o dicionário Aurélio, a palavra hipocrisia tem como significados: afetação duma virtude, dum sentimento louvável que não se tem; impostura, fingimento, simulação, falsidade e falsa devoção. Coloquei isso pelo fato de que todos nós mantemos uma imagem nossa e morremos de medo de que a mesma seja exposta e que todos venham a saber que não somos bem aquilo que aparentamos ser e nem aquilo que as pessoas idealizam sobre nossa pessoa.
Talvez você esteja agora, ao ler este texto, tendo o mesmo tipo de reação, portanto, se você não for assim, então, que atire a primeira pedra... Pense bem antes de atirar... Dê uma boa olhada no cantinho da sua mente... Entra lá no seu quarto escuro... Bem, se ainda assim quiser atirar a primeira pedra, mau sinal! Aquele que ataca, na verdade, já está se defendendo, então...
Assim, apresentamos aquilo que achamos interessante, aquilo que nos convém, aquilo que nos provem da respeitabilidade social... Falamos a nosso respeito sempre de forma compartimentada, bem pensada, bem programada. Com alguns falamos uma pequena parte de nossas mazelas, com outros falamos de outras partes mais escuras, mas mesmo assim em partes, em fragmentos e com isso, nunca vivenciamos uma autêntica e profunda intimidade com outro ser humano. E tem sempre aquele lado escuro de nós que não o expomos nem que a vaca tussa.
Percebi também que todos nós não estamos preparados para relacionamentos abertos, imbuídos de profunda honestidade, apoio e incentivo para que possamos atingir a excelência do ser; alegamos não ter a estrutura emocional necessária. Então, acabamos vivendo vitimas de nossos medos mais profundos, sempre inseguros, sendo que um desses medos, e talvez seja o maior de todos eles, é o medo de nos vermos sós... Aprendemos isso muito bem ainda quando crianças; morríamos de medo de perder aquilo que acreditávamos ser amor por parte das pessoas significativas da nossa vida. E por causa desse assim chamado "amor condicionado", passamos a esconder nossas mais intimas dificuldades e deslizes. Passamos a bancar o "bom menino" ou a "menina de família", ou então, caíamos do outro lado nos orgulhando de sermos a "ovelha negra" da família, ressaltando nossa rebeldia, mas não nossos conflitos mais profundos... Esses nunca!
Se temos medo de expor aquilo que somos é por que nós mesmos não aceitamos aquilo que vemos em nós. E, por não aceitar, também queremos mudá-lo e mesmo assim, temos vergonha. Temos medo de expor esse nosso lado e o outro nos abandonar no meio do caminho. Temos medo de repetir os sentimentos de abandono que já vivenciamos em outros momentos de nossa existência e por isso, nos calamos, ou então, nos tornamos agressivos numa insana, medíocre e infantil tentativa nos sentirmos seguros. Santa infantilidade!... O que ganhamos com isso?
Não queremos nos relacionar com pessoas inseguras, imperfeitas em faze de crescimento... De pessoas assim já chega nós mesmos! Queremos pessoas que não aumentem nossa insegurança crônica, que não a exponha à luz solar... Queremos pessoas que nos protejam de nossa própria solidão resultante de não querer entrar em contato com nós mesmos, com nossa própria humanidade ainda que adoentada.
Então, mesmo em conversas que aparentemente parecem estar embasadas numa profundidade emocional, na realidade, nos mantemos na superfície e muitas vezes, fazemos como quem aprecia um bom prato de sopa, e que por medo de queimar a língua, abstém-se do calor do centro, fica com a coisa morna das beiradas...
Alegamos ser pessoas sérias, virtuosas, melhores que as outras e quase sempre não conseguimos sustentar uma conversa sem acabar falando de alguma pessoa que não se encontre presente e mesmo assim, temos a capacidade de dizer que somos pessoas honestas. No entanto, se descobrimos que os outros falam de nós quando não estamos presentes... Como ficamos emputecidos!...
Somos hipócritas sim! Todos nós fingimos, simulamos e ponto! Sempre estamos na defensiva e é por isso que nunca existe um verdadeiro encontro... E quando se tem consciência disso a coisa torna-se ainda mais desesperadora...
Somos hipócritas sim por que todos fazemos o mesmo jogo...
Por favor, exponha somente aquilo que é aceitável socialmente e mesmo assim, pense quinhentas vezes para ver se tenho condições de digeri-lo! Fale-me de suas verdades desde que as mesmas não toquem as minhas zonas de conforto...
E dessa forma continuamos todos prisioneiros de nós mesmos, de nossos medos, de nossas inseguranças e de nossas mazelas que nos consomem lentamente...
Como a vida poderia ser muito melhor se todos nós tivéssemos a coragem e a ousadia de abrir as nossas janelas e expor aquilo que somos e fazemos quando ninguém nos vê... Se tivéssemos a coragem de falar aquilo que realmente passa em nossa mente, dos diálogos e monólogos que naquela tela escura travamos... Mas, em nome da respeitabilidade social e de não ficarmos a sós neste mundo de hipocrisia, continuamos jogando o jogo e o pior de tudo é que muitos de nós fazemos isso, cantarolando pelas ruas ao som de Elis Regina:
"Vivendo e aprendendo a jogar, vivendo e aprendendo a jogar, nem sempre ganhando, nem sempre perdendo, mas, aprendendo a jogar..."
Nesse tipo de jogo, a vida não passa de um blefe, ou seja, um eterno esconde esconde das nossas precariedades e desvantagens.

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Escolho meus amigos pela pupila

Escolho meus amigos não pela pele ou outro arquétipo qualquer, mas pela pupila. Tem que ter brilho questionador e tonalidade inquietante.

A mim não interessam os bons de espírito nem os maus de hábitos. Fico com aqueles que fazem de mim louco e santo. Deles não quero resposta, quero meu avesso. Que me tragam dúvidas e angústias e agüentem o que há de pior em mim.

Para isso, só sendo louco! Quero os santos, para que não duvidem das diferenças e peçam perdão pelas injustiças.

Escolho meus amigos pela alma lavada e pela cara exposta. Não quero só o ombro e o colo, quero também sua maior alegria. Amigo que não ri junto, não sabe sofrer junto. Meus amigos são todos assim: metade bobeira, metade seriedade. Não quero risos previsíveis, nem choros piedosos.

Quero amigos sérios, daqueles que fazem da realidade sua fonte de aprendizagem, mas lutam para que a fantasia não desapareça. Não quero amigos adultos nem chatos. Quero-os metade infância e outra metade velhice! Crianças, para que não esqueçam o valor do vento no rosto; e velhos, para que nunca tenham pressa. Tenho amigos para saber quem eu sou. Pois ao vê-los loucos e santos, bobos e sérios, crianças e velhos, nunca me esquecerei de que a "normalidade" é uma ilusão imbecil e estéril.

Oscar Wilde

QUE BOM QUE VOCÊ CHEGOU! JUNTE-SE À NÓS!