Este blog não foi criado para quem já fechou as persianas de sua mente e cuidadosamente as fixou para que nenhum filete de luz de novas idéias penetre e perturbe sua sonolenta e estagnante zona de conforto. Este blog é para os poucos que querem entrar na terra firme da experiência direta por não verem outro caminho mais seguro a tomar.

23 julho 2007

A Ganância Tecnológica e seu olhar plasmático

- Olá garoto!

- Bom dia senhor! Como foi de final de semana?

- Um pouco gripado, mas agora melhor! Li seus textos desta semana.

- O que viu neles?

- Continuo achando que você precisa ver um pouco mais “o lado colorido das coisas”. Acho que é por isso que algumas pessoas enviam seus comentários lhe chamando de depressivo e pessimista. Acho que também é preciso contemplar o belo!

- Não discordo disso! No entanto, como contemplar o belo se a “normose”, essa patologia da normalidade operante impede a clareza de visão? Creio que o papel deste blogador é apontar para aquilo que obscurece o belo. O senhor que já convive comigo há um bom tempo, acredita mesmo que eu seja um maníaco-depressivo, um rebelde marxista ou um pessimista? Por favor, seja sincero!...

- Claro que não! Mas continuo achando que você precisa também colocar nos seus textos a arte de contemplar o belo.

- Desculpe-me, mas creio que em nenhum dos meus textos deixei de fazer isso. Ao contrário, neles expresso sempre tanto a beleza do cotidiano bem como as manifestações da normose.

- Sabe JR, o que tem me ajudado muito é procurar ver sempre o melhor das coisas... Veja por exemplo, a beleza do avanço da criatividade tecnológica... Você não tem visto as máquinas maravilhosas que o homem vem produzindo? Tenho gravado uma reportagem de uma série que está passando na TV a cabo, sobre o avanço tecnológico dos automóveis. Tenho achado fantástico! Assim que acabar a série, faço questão de gravá-la num DVD para que você possa assisti-la. Outra coisa que tem me chamado bastante atenção são esses novos aparelhos de TV.

- Quais? As LCD?

- Não, as de plasma! Quando me deparo com uma fico abobado com a sua nitidez. Parece que você está de fato diante da realidade!

- Sei!... Estive neste final de semana na megaloja em Pinheiros. Gosto de ir lá por que, além dela, ao seu lado, há vários sebos com vários livros esgotados. Nessa loja, os livros ficam no último andar do prédio. O piso térreo está forrado com o material de telefonia, games e informática. Depois você é forçado a passar pela sessão de imagem e som, e, por último os livros. Até a disposição das escadas rolantes foram projetadas para que você circule o máximo possível dentro da loja. Parece mesmo que neste país, até nas lojas os livros são deixados em último plano. Isso é fácil de constatar, basta você observar o ínfimo número de livrarias que se encontram por aí. Mas não é sobre isso que quero comentar. Quero falar do absurdo que vi nessa loja, no setor de TV: um aparelho de plasma no valor de R$38.000,00... Vi ali um grande contraste entre a realidade dos que se dão ao direito da luxuria burguêsa e dos meninos mal vestidos que mendigavam por um trocado para tomarem conta do meu carro na entrada da loja. Será possível para uma mente saudável se conformar com esse tipo de desequilíbrio social? Ou será que devo também fazer uso daquela esfarrapada desculpa usada pela classe burguesa que diz que eles fizeram por onde para poderem usufruir desses bens de consumo, enquanto que a grande maioria não quer saber de responsabilidades... Já estou quase careca de ouvir esses chavões egocêntricos, típico “Pôncio Pilatos”.

- Eu procuro sempre ajudar quando posso, mas nunca, dando dinheiro na mão desses meninos. Quase sempre estão ali sendo descaradamente explorados por algum adulto!

- Sei!... De certo modo, creio que todos nós estamos também sendo explorados por algum adulto... Existem várias formas de se explorar o ser humano... Algumas são mais notórias! Creio que a ganância tecnológica é uma delas. Veja só o que o homem está fazendo com o planeta e com ele mesmo em nome desse inconsciente avanço tecnológico... Creio que seria muito interessante o senhor assistir um filme que já circula pela internet, intitulado “Surplus”, em outras palavras, supérfluo. Quem sabe ficaria mais fácil de entender a minha visão.

Nesse instante, enquanto ele ponderava sobre o que eu havia acabado de expressar, fomos interrompidos pelo carteiro que me trazia alguns documentos que requeriam a minha atenção e assinatura. Como estávamos próximos do horário do almoço, meu interlocutor aproveitou-se do momento para se despedir e partir para seu almoço. Depois de despachar o carteiro e, novamente solitário em minha loja, coloquei-me a meditar sobre o que acabáramos de conversar.

Estaria a tecnologia realmente sendo usada para a criação de respostas para as reais necessidades sociais?

Ou, muito ao contrário, estaria a serviço do consumismo elitista?

Qual o limiar entre o supérfluo e o essencial?

A tecnologia tem realmente criado maquininhas fantásticas, levado o homem a distâncias astronômicas e, no entanto, parece se distanciar cada vez mais, talvez anos luz, da preocupação com o que parece ser realmente essencial para o bem-estar social.

O que se vê não seria uma tecnologia voltada para a concentração de capital, que vem a cada dia que passa gerando incontáveis problemas de todas as ordens, os quais o próprio capital não tem sido capaz de solucionar?

O que de fato atravanca a solução dos problemas básicos para o bem-estar social?

A falta de capital?

A falta de tecnologia?

Ou o “auto-interesse”?

Como manter a cabeça nas nuvens cor-de-rosa do avanço tecnológico e os pés na terra preta e fértil das reais necessidades sociais?

Só por hoje, o que me parece é que, para a classe burguesa, acompanhar o avanço tecnológico é muito mais sedutor do que a busca de respostas para a conquista de um equilíbrio social. Para isso, ela já conta com uma forte tecnologia de desculpas e algumas delas são: “não se pode ficar preso somente no lado escuro das coisas”, ou então, “o mundo não é perfeito e nunca será; não existe a menor chance de acabarmos com todas as coisas que nos incomodam, então de que adianta reclamar de tudo?”... Para muitos dos que fazem uso destes tipos de resposta, acham mesmo que é preciso olhar “plasmaticamente” para as coisas boas e simples da vida, menos para a vida simples daqueles pelos quais não queremos lançar o nosso olhar plasmado.

Infelizmente, as cores quentes de uma TV de plasma são muito mais sedutoras do que a frieza das cores da vida real.

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Escolho meus amigos pela pupila

Escolho meus amigos não pela pele ou outro arquétipo qualquer, mas pela pupila. Tem que ter brilho questionador e tonalidade inquietante.

A mim não interessam os bons de espírito nem os maus de hábitos. Fico com aqueles que fazem de mim louco e santo. Deles não quero resposta, quero meu avesso. Que me tragam dúvidas e angústias e agüentem o que há de pior em mim.

Para isso, só sendo louco! Quero os santos, para que não duvidem das diferenças e peçam perdão pelas injustiças.

Escolho meus amigos pela alma lavada e pela cara exposta. Não quero só o ombro e o colo, quero também sua maior alegria. Amigo que não ri junto, não sabe sofrer junto. Meus amigos são todos assim: metade bobeira, metade seriedade. Não quero risos previsíveis, nem choros piedosos.

Quero amigos sérios, daqueles que fazem da realidade sua fonte de aprendizagem, mas lutam para que a fantasia não desapareça. Não quero amigos adultos nem chatos. Quero-os metade infância e outra metade velhice! Crianças, para que não esqueçam o valor do vento no rosto; e velhos, para que nunca tenham pressa. Tenho amigos para saber quem eu sou. Pois ao vê-los loucos e santos, bobos e sérios, crianças e velhos, nunca me esquecerei de que a "normalidade" é uma ilusão imbecil e estéril.

Oscar Wilde

QUE BOM QUE VOCÊ CHEGOU! JUNTE-SE À NÓS!