Este blog não foi criado para quem já fechou as persianas de sua mente e cuidadosamente as fixou para que nenhum filete de luz de novas idéias penetre e perturbe sua sonolenta e estagnante zona de conforto. Este blog é para os poucos que querem entrar na terra firme da experiência direta por não verem outro caminho mais seguro a tomar.

07 abril 2008

Tempestuosa sincronicidade

Depois de uma noite mal dormida, acordei com uma enorme ressaca. O corpo se mostra letárgico e principalmente as pálpebras, insistem por urgente descanso. Quando me encontro nesse estado, não há a mínima possibilidade de expressar bom-humor, ainda mais quando o assunto das primeiras conversas matinais versam sobre os "importantes" resultados esportivos de um domingo chuvoso.

Não fosse o delicioso e divertido almoço com grandes amigos, poderia afirmar que o domingo foi literalmente tempestuoso. O motivo da ressaca está bem claro para mim, visto que passei algumas horas do domingo fazendo aquilo que mais faço durante a semana toda: me contrariar silenciosamente. Minha vontade era a de sair logo após o almoço – que teve seu inicio por volta das 15h30min. – para prosear com os amigos em alguma casa de café, uma vez que a tarde chuvosa se mostrava bastante propicia para tanto. Mas, o que de fato ocorreu é que não consegui ser assertivo com os amigos e acabei me permitindo ficar por quase quatro horas assistindo um filme que já nos seus cinco minutos iniciais dava nítidos sinais de ser extremamente maçante e de um suspense altamente previsível. Penso que, num fim de tarde de domingo chuvoso assistir a "Tempestade do Século", de Stephen King, não há quem mereça.

Como anfitrião, foi uma sensação bastante constrangedora perceber logo no início do filme indicado por um dos amigos presentes, que teríamos pela frente quatro horas de cenas vampirescas e de assassinatos em série seguidos da repetição da frase "Dê-me o que quero e eu irei embora"... O fato é que, foram necessários apenas 15 minutos de filme, para que fosse eu aquele a querer ir embora. A cada minuto que passava, minha mente se tornava mais e mais tempestuosa, a ponto da intolerância começar a se manifestar por cada célula do meu corpo. Mantive a compostura de anfitrião até os 10 minutos iniciais da segunda parte do filme, depois, não deu mais: entreguei-me ao computador, procurando pelo site da Cuidar do Ser, alguma frase capaz de acalmar um pouco a tempestade. Posso afirmar que assistia simultaneamente a dois filmes: o que passava na TV e o outro que se passava em minha mente e, este último, com certeza estava bem mais violento. Nem de perto o coro de vozes que surgia quando o diabo se apossava da mente de um dos personagens, era mais alto que as vozes do inferno causado em minha mente pelo diabo daquele filme. Sem dúvida, tive que dar a mão a palmatória quanto a uma das poucas frases interessantes do filme: o inferno é a repetição.

Creio que uma frase do escritor e palestrante Luciano Pires, cai muito bem para explicar o meu sentimento diante daquelas quatro horas de filme: "Nosso valor não está apenas onde gastamos o nosso dinheiro, mas onde colocamos o nosso tempo. Tempo é algo inerente à vida, só que ele nos dá múltiplas oportunidades de usá-lo". Fiquei emputecido comigo mesmo por ter me permitido pagar esse mico, quando o que na verdade queria era estar desfrutando de conversas nutritivas com amigos e não do sorriso babaca de um vampiro, o qual, literalmente, como a ressaca indica, conseguiu sugar o melhor do meu sangue.

O pior de tudo foi o inferno causado pela sincronicidade do acontecimento ocorrido no momento em que eu escrevia este texto desabafo. Estava lá, como sempre, diante da loja, embaixo da Pitangueira, quando fui interrompido por um novo carteiro:

- Com licença, por acaso o senhor sabe me dizer se aqui mora algum Josias Ramos de Oliveira?

- Não seria Jonas o nome certo?

- Sim, desculpe-me, o Sr. Tem razão, o nome correto é Jonas.

- Sou eu mesmo, obrigado!

Ele trazia um pequeno envelope que, pelo peso, pude logo perceber que se tratava de um livro para apreciação, enviado por alguma editora. Como fui contatado por um autor de um livro a ser lançado pela editora Petit, cujo assunto retrata a questão da morte, fiquei bastante ansioso para abri-lo. Para minha surpresa, o remetente se referiu a minha pessoa com os seguintes dizeres: "Ao escritor Jonas Ramos de Oliveira". Achei "chique" e confesso que por frações de segundos o cabeção aqui se sentiu importante... Tratei de abrir o envelope e me deparei com um livro cujo título é "A Dança da Vida", escrito por Brasigóis Felício Carneiro. Mais que depressa, comecei a ler o texto da orelha do mesmo, o qual me pareceu bastante convidativo. Passei a tarde toda fazendo uma leitura relâmpago, costume que tenho para ver se vale ou não dedicar meu tempo e atenção sobre as letrinhas impressas no papel, uma vez que o que mais se encontra hoje no mercado são livros de auto-ajuda que em nada ajudam o ser humano a se ver livre de seu embotamento mental, fato este que me faz lembrar um trecho do livro "A Arte de Insultar" de Arthur Schopenhauer, o qual penso ser interessante citar:

"Essas mentes medíocres simplesmente não se conseguem decidir a escrever como pensam, pois acham que depois o resultado poderia adquirir uma aparência muito simplória. [...] Desse modo, apresentam o que têm a dizer com construções forçadas e difíceis, neologismos e períodos extensos, que circundam o pensamento e acabam por o ocultar. Oscilam entre o esforço de o comunicar e o esforço de o esconder. Querem guarnecer o texto de modo que ele adquira uma aparência erudita ou profunda, para que as pessoas pensem que ele contém mais do que se consegue perceber no momento da leitura. Sendo assim, esboçam partes do seu pensamento em expressões curtas, ambíguas e paradoxais, que parecem significar muito mais do que dizem; logo voltam a apresentar os seus pensamentos com uma torrente de palavras e uma verbosidade insuportável, como se fossem necessárias sabe-se lá que medidas para tornar compreensível o seu sentido profundo, enquanto, na verdade, se trata de uma ideia bastante simples, para não dizer até trivial."

Enquanto corria rapidamente os olhos pelo texto, fui percebendo a sincronicidade da influência literária do autor, a qual era profundamente parecida com o percurso que eu também fizera durante todos estes anos: "Curso em Milagres, Herman Hesse, Henry Miller, Carlos Cardoso Aveline, Nieztsche, Mabel Collins, Teilhard de Chardin, Joseph Campbell, Eva Pierrakos, Leonardo Boff, Roberto Crema, Clarice Lispector e por ai vai. A sensação era como se tivéssemos sido estudantes da mesma sala, freqüentando as mesmas matérias, sendo que as últimas, os textos de Osho, Eckhart Tolle e finalmente a clareza de Jiddu Krishnamurti - no meu caso - acabaram jogando por terra o conteúdo de todas as anteriores. Mas a sincronicidade maior que fez meu corpo arrepiar deu-se quando cheguei nas últimas quatro páginas do livro e me deparei com o seguinte texto:

"O escritor norte-americano Stephen King, mestre da ficção do horror, escreveu: "Neste mundo você paga um preço todo dia. E às vezes gasta o que tem". Escreveu também que o inferno é a repetição. Mais infernal e devastador ainda torna-se o lugar da expiação quando se sabe que somos nós quem inventamos o horror e o absurdo, para retro-alimentar nossa agonia e sofrimento."

Ao ler este texto, meu sentimento foi de total perplexidade. Sentia como se algo maior, estivesse próximo de mim, divertindo-se com o mesmo sorriso do personagem satânico do filme. Imediatamente fechei o livro e, colocando as mãos na cintura exclamei em voz alta, sem a menor preocupação com que poderia alguém pensar a meu respeito caso me visse ali:

- Dê-me aquilo que quer de mim então, poderei ir embora!

Dito isto, virei minhas costas, subi as escadas e, na companhia de meu cachorro, tratei de descansar um pouco enquanto esperava por Deca que retornava de uma consulta médica para o aconchego do lar.



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Escolho meus amigos pela pupila

Escolho meus amigos não pela pele ou outro arquétipo qualquer, mas pela pupila. Tem que ter brilho questionador e tonalidade inquietante.

A mim não interessam os bons de espírito nem os maus de hábitos. Fico com aqueles que fazem de mim louco e santo. Deles não quero resposta, quero meu avesso. Que me tragam dúvidas e angústias e agüentem o que há de pior em mim.

Para isso, só sendo louco! Quero os santos, para que não duvidem das diferenças e peçam perdão pelas injustiças.

Escolho meus amigos pela alma lavada e pela cara exposta. Não quero só o ombro e o colo, quero também sua maior alegria. Amigo que não ri junto, não sabe sofrer junto. Meus amigos são todos assim: metade bobeira, metade seriedade. Não quero risos previsíveis, nem choros piedosos.

Quero amigos sérios, daqueles que fazem da realidade sua fonte de aprendizagem, mas lutam para que a fantasia não desapareça. Não quero amigos adultos nem chatos. Quero-os metade infância e outra metade velhice! Crianças, para que não esqueçam o valor do vento no rosto; e velhos, para que nunca tenham pressa. Tenho amigos para saber quem eu sou. Pois ao vê-los loucos e santos, bobos e sérios, crianças e velhos, nunca me esquecerei de que a "normalidade" é uma ilusão imbecil e estéril.

Oscar Wilde

QUE BOM QUE VOCÊ CHEGOU! JUNTE-SE À NÓS!