Este blog não foi criado para quem já fechou as persianas de sua mente e cuidadosamente as fixou para que nenhum filete de luz de novas idéias penetre e perturbe sua sonolenta e estagnante zona de conforto. Este blog é para os poucos que querem entrar na terra firme da experiência direta por não verem outro caminho mais seguro a tomar.

28 março 2008

Um gaiteiro que canta bem, mas não entoa

Foram necessários apenas 10 minutos de forte chuva de granizo para que, o dia seguinte amanhecesse com a rua, calçadas, sarjetas e quintais repletos de pequeninas folhas ainda bem verdinhas. Depois de um fim de tarde como o de ontem, o dia parece muito mais vivo, colorido, rejuvenescido, com suas plantas, flores, e gramas – apesar da surra do granizo -, muito mais eretas, como se em sinal de agradecimento pelo frescor proporcionado pela água da chuva. Agora são 12h50min e o azul celeste está tão vivo que chega a doer os olhos e o calor parece fazer o asfalto tremer e derreter.
Do outro lado da rua, duas balconistas da agência do correio caminham vagarosamente, desfrutando os poucos minutos restantes do horário de folga do almoço, com o doce sabor dos sorvetes de palito, desses vendidos de porta em porta em pequenos e coloridos carrinhos de mão.
Para um inicio de tarde de sexta-feira, o tráfego de carros bem como de pedestres, apresenta-se bastante reduzido em vista do normotizado movimento da semana.
Na entrada do salão, encostado na recente porta de vidro, observando o movimento ao mesmo tempo em que toca uma pequena gaita de bolso, um jovem cliente do cabeleireiro vizinho aguarda a sua vez. Ao observar há poucos metros a bela jovem dos longos cabelos castanhos, virou-se para mim com sorriso malicioso e exclamou:
- Com este sol, tocando esta gaita e vendo o corpo desta princesa que vem vindo, sinto-me o próprio Vinicius de Moraes.
- Por quê? – Perguntei-lhe sorrindo quase que antevendo sua resposta.
- Ah! Se ela soubesse que quando ela passa a Zunkeller inteirinha se enche de graça... – respondeu-me melodicamente e com muito mais ênfase bem no instante em que ela por nós passava.
Dando um breve momento para que ela se afasta-se um pouco, com o intuito de não ouvir o meu retorno, lhe respondi:
- Você tem toda razão, é realmente uma bela jovem.
- Bonita e gostosa demais! – Respondeu-me com um olhar de consumo fixado em sua silueta cadenciada, ao mesmo tempo em que, com uma das mãos, massageava levemente a própria genitália.
- Cuidado, meu irmão! Cuidado!
- Cuidado por quê?
- Porque muitas vezes, aquilo que a primeira vista se mostra gostoso aos olhos, com tempo, pode acabar se mostrando insuportavelmente amargo para o coração... A realidade do ser é invisível aos olhos; não se encontra na estética da pele e do olhar, muito menos na formosura das curvas de um corpo de academia.
Ele deu um rápido sorriso, deixando transparecer sua vergonha, virou-se para o outro lado e novamente com sua gaita voltou a entoar seus hinos e melodias gospel.



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Escolho meus amigos pela pupila

Escolho meus amigos não pela pele ou outro arquétipo qualquer, mas pela pupila. Tem que ter brilho questionador e tonalidade inquietante.

A mim não interessam os bons de espírito nem os maus de hábitos. Fico com aqueles que fazem de mim louco e santo. Deles não quero resposta, quero meu avesso. Que me tragam dúvidas e angústias e agüentem o que há de pior em mim.

Para isso, só sendo louco! Quero os santos, para que não duvidem das diferenças e peçam perdão pelas injustiças.

Escolho meus amigos pela alma lavada e pela cara exposta. Não quero só o ombro e o colo, quero também sua maior alegria. Amigo que não ri junto, não sabe sofrer junto. Meus amigos são todos assim: metade bobeira, metade seriedade. Não quero risos previsíveis, nem choros piedosos.

Quero amigos sérios, daqueles que fazem da realidade sua fonte de aprendizagem, mas lutam para que a fantasia não desapareça. Não quero amigos adultos nem chatos. Quero-os metade infância e outra metade velhice! Crianças, para que não esqueçam o valor do vento no rosto; e velhos, para que nunca tenham pressa. Tenho amigos para saber quem eu sou. Pois ao vê-los loucos e santos, bobos e sérios, crianças e velhos, nunca me esquecerei de que a "normalidade" é uma ilusão imbecil e estéril.

Oscar Wilde

QUE BOM QUE VOCÊ CHEGOU! JUNTE-SE À NÓS!