Este blog não foi criado para quem já fechou as persianas de sua mente e cuidadosamente as fixou para que nenhum filete de luz de novas idéias penetre e perturbe sua sonolenta e estagnante zona de conforto. Este blog é para os poucos que querem entrar na terra firme da experiência direta por não verem outro caminho mais seguro a tomar.

24 outubro 2007

A ignorância de si mesmo é o único vício


- Boa tarde, JR! Estou precisando conversar um pouco! Está ocupado?
- Olá Luciano, que se passa?
- Ontem aconteceu novamente, pratiquei o sexo pago... Estou tentando colocar em pratica o que temos conversado; apesar de saber que o importante é o agora, não estou conseguindo silenciar a mente. Estou tentando não me julgar e ficar no só por hoje... Mas, a real é que não quero praticar mais isso; sei que hoje é outro dia mas ainda estou sofrendo resquícios do profundo arrependimento instalado logo após o momento do ato.
- Já conversamos que o ato em si não é o problema. O problema não está no ato sexo, mas sim naquilo que a nossa mente fez com ele. Eu estava escrevendo algo parecido agora há pouco.
- Sim!
- Para mim, a questão é: por que não conseguimos ficar com os sentimentos desagradáveis que ocorrem quando se manifesta uma nova maneira de viver?... Por que não conseguimos ficar com esses sentimentos e observá-los? Por que temos a tendência condicionada de buscar por mecanismos de fuga para tais sentimentos?
- É justamente esse tipo de resposta que eu busco!
- Aí está o X da questão... Você quer a resposta... E não tem nada demais nisso, mas, por que a resposta tem que ser IMEDIATA? Por que não consegue esperar pela manifestação da resposta?... Como a resposta não é imediata e o mal estar permanece, queremos novamente nos anestesiar, certo?
- Percebo que tenho melhorado bastante, pois, antes eu praticava sexo pago mais que uma vez por semana e agora, esta sendo a cada 30 ou 60 dias...
- Acorda... Já conversamos que melhora não é transformação e que o ato em si não interessa, uma vez que você pode até parar com esse ato e colocar outro socialmente mais aceitável no lugar, não é mesmo?
- A questão é que mesmo observando o que se passa em minha mente ainda não consigo ver aquele "flash" que me leva para a ação condicionada.
- A questão é: por que não consigo viver com as contrariedades? Por que essa tendência por buscar uma forma de anestésico emocional, mesmo que seja através de uma conversa, um livro ou um sistema de crenças?
- Por favor, explique sem filosofar!... Não sei estas respostas!
- De nada adianta a minha explicação e não se trata de filosofar...
- O que está óbvio para você ainda é muito complexo para mim!
- Você precisa aprender por você mesmo, meu amigo, uma vez que a confusão é sua e, sem essa confusão, você nunca terá sua fusão. Você é que precisa ver o óbvio por você e se descomplexar... Você não consegue que está tentando sair do complexo do sexo pago, para o complexo de deixar de praticá-lo, ou então, pelo complexo de querer contar a quantidade do seu tempo limpo... Isso não é óbvio para você?
- O que me parece óbvio é que você não está sabendo lidar com as suas contrariedades, com o seu vazio, com a sua ansiedade, com as suas inseguranças... Estou errado?
- É exatamente isso! Mas, o que eu quero saber de você, é como faz para lidar com tudo isso?
- Você acredita que o "meu como" possa servir para você?... O que é remédio para mim pode ser veneno para você, não acha? Sinto que você precisa a descobrir o "seu como" por você mesmo! Isso não se trata de filosofia, trata-se de unidade, autonomia e auto-suficiência, afinal, o que se precisa é ser um homem livre!
- Tudo bem, mas você não poderia compartilhar comigo sua experiência?
- Eu tenho procurado fazer isso através da observação dos meus pensamentos, com todas as suas sugestões, com todas as suas manifestações, com todas as suas tentativas de me dizer que ele tem razão naquilo que me sugere... Isso é tão obvio para mim, mas, como você diz, é complexo para você!
- Exatamente!
- O que é um complexo? Segundo a etimologia da palavra, é algo que abrange ou encerra muitos elementos ou partes, ou seja, algo "fragmentado"... Pode algo fragmentado conseguir ver a totalidade dos fatos?
- Creio que não!
- Creio que é preciso ver a totalidade da sua forma fragmentada de pensar e isso só cabe a você. Nem mesmo o melhor profissional da saúde mental poderá fazer isso em seu lugar. Um complexo é algo confuso, ou seja, algo que em si mesmo possui um fuso... É preciso ver por si mesmo esse fuso.
- Conheci poucas pessoas que possuem o sincero desejo de trabalhar essas questões sexuais e afetivas. Como estou muito longe, pouca gente quer falar sobre isso e com aqueles que conversei, todos falam que está tudo bem, que já não praticam mais e que tudo está certinho... Tenho feito tudo o que eles têm me sugerido e vejo que, para mim, a coisa tem sido muito lenta e que em meu processo ainda ocorre muito sofrimento...
- Essas malditas comparações!... Não percebe você que as comparações nos fazem para com as ações? Além do mais, quem te garante que essas pessoas estão realmente limpas? E, estar limpo de um padrão comportamental especifico pode ser compreendido como recuperação?
- Aprendi a deixar de usar drogas com um semelhante dizendo para mim como hoje estão fazendo para se manterem longe dos padrões compulsivos por drogas químicas... Tem mais um lance que está pegando muito...
- O que irmãozinho?
- Estou sendo deixado de lado... Hoje, em minha região, vários dos meus antigos companheiros estão evitando de compartilharem suas experiências comigo.
- Isso não seria uma espécie de condicionamento? Será que você terá que fazer igual como nos Narcóticos Anônimos para se ver limpo dos seus padrões de adicção sexual?
- Então, essa é a minha grande dúvida: quem me garante que elas estão de fato limpas? Tenho uma leve impressão de estão fazendo uso de um discurso meio furado! Quanto ao fato de ter que conversar, é o que antes funcionou para mim, é só o que eu conheço!
- Digamos que essas pessoas estejam de fato fazendo uso de um discurso furado, o que isso mudaria em sua vida? Por acaso, entender a verdade do outro pode mudar a sua realidade? Percebe a importância da questão? O que pode mudar a sua realidade não seria a compreensão do seu próprio complexo? Você sabe o que significa a palavra "complexo" dentro da área da saúde mental?...
- Não.
- Conjunto de representações ou idéias estruturadas e caracterizadas por forte impregnação emocional, total ou parcialmente reprimidas, e que determinam as atitudes de um indivíduo, seu comportamento, seus sonhos, etc.
- ok!
- Preste atenção... Idéias estruturadas... Qual é a natureza exata de uma idéia?
- Pensamentos.
- Idéias estruturadas, não seria, em outras palavras, pensamentos que estruturam nossas ações?
- Sim.
- Então, o que lhe parece mais óbvio? Contar o tempo sem a prática de um padrão de comportamento especifico ou, procurar usar o tempo para compreender essa estrutura complexa que é o seu próprio processo de pensar e agir?
- O lance me parece ser o viver no agora!
- O que é insanidade segundo os grupos anônimos?
- Insanidade é fazer as mesmas coisas esperando por resultados diferentes.
- Segundo a etimologia da palavra insanidade: Falta de juízo; loucura, demência.
- Sim!
- Insanidade mental... O que existe na mente?
- Pensamento.
- Você já leu o folheto do triangulo da auto-obsessão de Narcóticos Anônimos?
- Sim sempre o leio!
- Pois estou escrevendo sobre isso... Só que num novo paradigma. Veja: está claro para você que o problema é o pensamento e não o sexo e/ou a droga?
- Sim.
- Então, o triangulo da auto-obsessão, para mim, passa a ter uma nova dinâmica: sofrimento + memória + imaginação.
- Nessa hora do vazio, não vejo o pensamento chegando para poder observar e fazer outra escolha...
- Por favor, acompanhe! Há o desconforto, certo?
- Certo.
- Não sei como lidar com o novo desconforto, certo?
- Prossiga. Não sei mesmo!
- Surge então a memória do alivio proporcionado pelo prazer sexual ou químico, certo?
- É assim mesmo!
- A imaginação de como repetir esse alivio se manifesta, certo?
- Acontece isso.
- O pensamento se compulsiona em como conseguir repetir a experiência que com o tempo se transforma num hábito, certo?
- Espera um pouco...
- Memória e imaginação é pensamento, certo?... Por favor acompanhe; não deixe o pensamento entrar agora... A imaginação de como repetir esse alivio se manifesta, certo?
- Depois disso acontece um espaço de tempo onde todos há minha volta estão ocupados, aí surge mais possibilidades de eu praticar sem correr risco de ser pego.
- O pensamento se compulsiona em como conseguir isso... Esquece os outros! Por favor, o lance é ai dentro de você e não fora! Acompanhe!
- Certo!
- Não sei como lidar com o novo desconforto, certo?
- OK!
- Surge a memória do alivio proporcionado pelo prazer sexual ou químico, certo?
- OK.
- A imaginação de como repetir esse alivio se manifesta, certo?
- OK.
- O pensamento se compulsiona, cria a compulsão mental, em como conseguir isso... Certo?
- Está certinho, é assim mesmo que acontece!
- A compulsão deixa de ser mental e passa a ser física, certo?
- OK.
- Nesse instante é que o bicho pega... Pode vir até Jesus que você chuta a bunda dele e vai praticar não é assim que acontece!
- Isso mesmo!
- O que acontece então?... Novamente a mente começa: por que usou? Por que recaiu? Por que fez novamente?... Ela começa a criar pensamentos de auto-julgamento, certo?
- Assim mesmo! Parece que estou assistindo meu filme!
- Esses pensamentos de auto-julgamento, culpa e vergonha causam desconforto, certo?
- Como é ruim sofrer!
- Não sei como lidar com esses pensamentos, com esse desconforto, certo?
- Isso!
- Começo então a novamente pensar, a imaginar como fazer para parar de sentir o mal estar causado pelo sofrimento, certo?
- OK.
- Não consigo pensar em mais nada a não ser em como parar de sofrer, certo?
- Sim.
- E não acho respostas para isso através do PENSAMENTO certo?
- Só me vêem na mente pensamentos do que fazer para mudar...
- Sim, mudar o que é para aquilo que eu penso que deveria ser... Então, a coisa fica tão grande que o pensamento busca novamente pelo alivio imediato, certo?
- OK.
- Então estamos presos no triângulo da auto-obsessão mental... Se é o pensamento quem cria a dor, quem cria a idéia de uso, que critica a idéia de uso ou a falta do uso... O que é que eu preciso realmente saber deter: o uso de um determinado padrão de comportamento de escolha ou o uso indevido do pensamento por não estar iluminado pela ação da inteligência? Sim, por que não existe inteligência alguma na prática de qualquer padrão de comportamento compulsivo, não acha?
- Não sei!
- Então, sugiro que você passe a usar o seu tempo para saber por si mesmo a resposta para esta mais que importante pergunta.
- Preciso mais disso!
- De que adianta podar diariamente as folhas de uma erva daninha se mantemos suas raízes podres? A erva daninha pode ser o sexo, a droga, o trabalho compulsivo... Mas, qual é a raiz disso tudo?... Precisamos ir diretamente na raiz e aprender como cortá-la...
- Me dê um instante, chegou um cliente! Não desligue!
- ok.
- Desculpe-me! Por favor, prossiga em seu raciocínio!
- O que você faz quando um cliente entra na sua loja? Qual é a sua atitude? Você deixa ele fazer o que bem quer dentro da sua loja? Qual a sua atitude? Não presta toda atenção nele, de forma holística, por inteiro? Se ele é um comprador de confiança você lhe dá crédito não é mesmo? Caso contrário, não trata de dispensá-lo o mais rápido possível? Por que não agir assim com o "freguês" que é o pensamento querendo se "alojar" em sua mente?
- Interessante!
- É possível um cliente roubar sua loja se você está prestando toda atenção nele? Tem como ele lesar você uma fez que você está consciente de tudo que se passa ao seu redor, dentro da situação presente?... Para mim, o mesmo se dá com relação ao pensamento... É um "freguês" querendo fazer algazarra dentro da mente...
- Exatamente, bem colocado!
- Veja, se você observa com atenção um cliente mal intencionado, não precisa fazer mais nada: ele mesmo se toca e vai embora, não é assim?... Ele poderá até buscar por ajuda de outro companheiro para novamente na sua loja e tentar lesá-lo, não é assim?
- Faz sentido!
- A meu ver, assim é o pensamento...
- Você o observa, ele foge e volta com mais outro... E você vai observando, observando, observando...
- Então tenho que odiá-lo?... Pois odeio clientes assim!
- Você não precisa odiar o freguês inoportuno precisa?... Veja, o ódio é pensamento... Você primeiro pensa sobre o cliente e depois sente (senti+mental). Se você vai observando, observando, observando... Esse cliente nunca mais volta, não é assim? Mas ele precisa SABER QUE ESTÁ SENDO OBSERVADO PARA NÃO MAIS VOLTAR, certo?... Conhecimento é a única virtude e ignorância é o único vício
- Ele nunca mais pensa em voltar, por vezes nem mais passa na frente da loja!
- Você acha que com o pensamento as coisas são diferentes?
- Não!
- Então, está respondido o seu "como"?
- Está!
- Viu isso por você mesmo?
- Sim!
- Veja, nossa conversa, ao meu ver foi riquíssima!
- Ao meu ver também!...
- Posso transcrevê-la num texto, mantendo obviamente o seu anonimato?
- Era isso que eu estava querendo dizer que aprendo com o semelhante!... Claro que pode!
- Acho que ela poderá ser útil para outras pessoas que ainda sofrem!
- Como disse antes, por aqui, vários estão se afastando de mim... Tenho tentado me aproximar mas já não existe a mesma afinidade de antes!
- Isso é natural, uma vez que a sua forma de "pensar" está deixando de ser compatível com a forma condicionada deles. Também passei por isso e já vi outros companheiros também passarem pelo mesmo. Hoje a noite faremos reunião on-line dos pensadores compulsivos anônimos às 21:30 pelo MSN, por que você não participa?
- Com certeza gostaria de participar!
- Ótimo, quando for começar lhe adiciono! Gostaria de poder continuar ao telefone, mas, agora tenho que trabalhar. Fique de olho no "freguês"... Espero que você tenha uma ótima tarde repleta de bons momentos!
- Obrigado pela atenção. Uma boa tarde para você também e até breve!
- Obrigado...Fui!

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Escolho meus amigos pela pupila

Escolho meus amigos não pela pele ou outro arquétipo qualquer, mas pela pupila. Tem que ter brilho questionador e tonalidade inquietante.

A mim não interessam os bons de espírito nem os maus de hábitos. Fico com aqueles que fazem de mim louco e santo. Deles não quero resposta, quero meu avesso. Que me tragam dúvidas e angústias e agüentem o que há de pior em mim.

Para isso, só sendo louco! Quero os santos, para que não duvidem das diferenças e peçam perdão pelas injustiças.

Escolho meus amigos pela alma lavada e pela cara exposta. Não quero só o ombro e o colo, quero também sua maior alegria. Amigo que não ri junto, não sabe sofrer junto. Meus amigos são todos assim: metade bobeira, metade seriedade. Não quero risos previsíveis, nem choros piedosos.

Quero amigos sérios, daqueles que fazem da realidade sua fonte de aprendizagem, mas lutam para que a fantasia não desapareça. Não quero amigos adultos nem chatos. Quero-os metade infância e outra metade velhice! Crianças, para que não esqueçam o valor do vento no rosto; e velhos, para que nunca tenham pressa. Tenho amigos para saber quem eu sou. Pois ao vê-los loucos e santos, bobos e sérios, crianças e velhos, nunca me esquecerei de que a "normalidade" é uma ilusão imbecil e estéril.

Oscar Wilde

QUE BOM QUE VOCÊ CHEGOU! JUNTE-SE À NÓS!