Este blog não foi criado para quem já fechou as persianas de sua mente e cuidadosamente as fixou para que nenhum filete de luz de novas idéias penetre e perturbe sua sonolenta e estagnante zona de conforto. Este blog é para os poucos que querem entrar na terra firme da experiência direta por não verem outro caminho mais seguro a tomar.

11 setembro 2007

Vampirismo familiar

- Fala Celsão! Prometeu que vinha e veio mesmo! Você é mesmo um dos meus!

- Promessa é divida brother!

- Então? O que me conta? Quais são as novidades?

- Estamos ai na correria... Parece que a coisa está ficando cada vez pior! Está muito difícil de conviver ai fora, é um esforço danado para não ser engolido pela influencia de terceiros, pela normose operante que prolifera por todos os cantos.

- Nem me fale!

- Cara, hoje estou muito puto! Ainda bem que tenho amigos como você para poder pensar alto.

- Fique tranqüilo, desembucha que a consulta hoje é de graça! Que bicho está pegando!

- Família, cara, família! Sempre a porra da família!

- Que foi agora? Continuam fazendo cara feia por causa do seu modo de vida?

- Quanto a isso eu já não estou mais me lixando... Cada dia que passa, sinto cada vez mais que a família é um dos maiores empecilhos para o real desenvolvimento humano...

- Até aí, assino embaixo!

- Pior cara, que a família não tem nada de familiar! A não ser o consangüíneo, não existe nada de familiar entre eu e os membros da minha assim chamada "família"... Vivemos vidas completamente antagônicas... O que eles buscam não tem nada a ver com as minhas aspirações, meus valores, meu modo de ser e interagir. Não existe nenhuma relação verdadeira entre todos nós; é apenas um joguinho de interesses... Uma série de cobranças e expectativas descabidas. Não existe um real interesse pelo bem estar comum, sempre existe interesses pessoais em questão.

- Como assim?

- Por exemplo: nenhum dos meus irmãos me procura para saber como realmente está a minha vida, minha saúde, não me procura por que sentem prazer de estarem comigo, ao meu lado. Sempre que me procuram é que estão precisando de algo que só eu posso solucionar para eles, de modo gratuito. Sou para eles, uma espécie de tapa-buracos, um despachante gratuito. Suas visitas se limitam ao tempo que levo para solucionar a questão que fez com que eles me procurassem; assim que resolvida a questão, soltam aquele sorrisinho amarelo, dão um beijinho de Judas e vão embora. O pior, é que vivem falando pelas costas a respeito do meu modo de ser. Quer saber? Já estou de saco cheio desse tipo de "vampirismo familiar"... O pior de tudo é que se eu for realmente quem eu sou, expressar meus sentimentos, soltar um "não", ainda tem a coragem de me rotular como "egoísta e carrancudo". Sou egoísta por defender meus direitos abertamente, mas eles não são egoístas por buscarem seus interesses egocêntricos de forma velada (velada só no pensamento deles).

- Sei muito bem do que você está falando!

- Cara, não tem nada de nutritivo neste tipo de relação... Fazemos um jogo, dizemos aquilo que todos desejam ouvir, as palavras devem ser medidas, os modos... Não tem a mínima condição de ser você mesmo... É um saco! Rouba toda a energia... Pior é constatar a co-dependência da parte da minha mãe! Essa é uma tonta! Ninguém se preocupa de verdade com ela, com seus sentimentos, com seu bem-estar... Só a procuram para filar o almoço de domingo, sem ao menos se darem ao trabalho de lavar a própria louça, ou então, quando precisam que ela troque um chequinho... E tem mais: pelas costas, ainda descem a lenha no comportamento da velha! Eu fico me perguntando: será que ela não enxerga isso, ou sua solidão é tanta, que acaba fingindo que não vê? Cara, é só auto-interesse puro! Ninguém está nem aí para ninguém. Você só é querido se tem alguma coisa de valor material para dar, caso contrário, você passa a existir somente nas datas sociais, onde não dá para você ser descartado.

- Sei!

- Cansei, JR! Não estou mais com estrutura física e mental para agüentar tamanha hipocrisia e vampirismo. Estou a fim de começar a usar aquele aparelhinho que você inventou: o Fodômetro!

- Eu também percebo que não existe nada de familiar no chamado "seio familiar", pois cada um vive valores e crenças totalmente antagônicas. Não existem mesmo uma genuína preocupação entre os membros. Ao contrário, existe muito ressentimento e sentimento de culpa, os quais ninguém se atreve a trazer a tona. É um peixe podre que mata a autentica intimidade entre os seres humanos. Por exemplo, aquilo que já conversei com você, nenhum dos meus irmãos, pai ou mãe já ouviu e, tenho certeza de que se começasse a falar, não teriam a mínima disposição de compartilhar. Somos verdadeiros estranhos, cujo parentesco encontra-se somente no fator sanguíneo e no sobrenome do RG e CPF. Fisicamente, documentariamente somos da mesma linhagem, no entanto, na psique, no emocional, ou se preferir usar a desgastada palavra "espiritual", somos de classes totalmente diferentes. Não existe nenhum conjunto de gêneros afins, nenhuma linguagem, nenhuma unidade espiritual, muito menos inclinação. Saímos da mesma raiz, mas somos frutos totalmente diferentes. Há muito tempo que já rompi com essa dependência psicológica com eles e percebo a cada dia que passa, que estamos nos distanciando cada vez mais. Se olhar de olhos bem abertos, o que se constata é um aglomerado de pessoas de péssimo relacionamento interpessoal, com objetivos muito divergentes, alguns dormindo na mesma cama e vivendo sonhos separados, ligados somente pela conta conjunta... É um verdadeiro baile de máscaras!

- Cara, você é mais irmão para mim do que o meu próprio irmão. Você não tem o menor tipo de auto-interesse sobre mim; sempre demonstrou boa vontade em saber a respeito do que sou e de como estou. Nunca fiquei por tantas horas com um irmão meu, assim como fico com você. E a pior das constatações é esta: quando saio daqui, saio revigorado e quando saio dos "malditos almoços de domingo", saio totalmente acabado, de ressaca e a segunda é uma verdadeira rebordosa.

- Conheci vários dependentes químicos que cortaram os laços com os familiares, pois toda vez que entravam em contato com algum deles, acabam não sabendo lidar com as cobranças e as próprias reações emocionais os levavam a voltar ao uso do químico.

- Faz sentido! Toda vez que tenho um atrito com eles, me bate uma puta compulsão por sexo ou por comida!

- É triste constatar esse fato, não é Celsão?

- Cara, se é! Mas tenho que mais uma vez dar à mão a palmatória para você: é um baita vampirismo socialmente aceito e incentivado. Eles não querem que você abra os olhos! Querem você dormindo, um perfeito humanóide e não um ser por excelência.

- Você sabe que feriado foi comemorado nesta última sexta-feira?

- Sim: a independência do Brasil...

- Quando você vai decretar a sua? Está esperando por um príncipe de outros mares? Ligue-se!

- O lance é andar com colar de alho e crucifixo no pescoço!

- Mesmo assim você ainda corre o perigo de uma cunhada sua pedir uma cabeça de alho do seu colar, ou então o crucifixo para usar numa festa de casamento...

- Fazer o que, né Jr, família é prá essas coisas!

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Escolho meus amigos pela pupila

Escolho meus amigos não pela pele ou outro arquétipo qualquer, mas pela pupila. Tem que ter brilho questionador e tonalidade inquietante.

A mim não interessam os bons de espírito nem os maus de hábitos. Fico com aqueles que fazem de mim louco e santo. Deles não quero resposta, quero meu avesso. Que me tragam dúvidas e angústias e agüentem o que há de pior em mim.

Para isso, só sendo louco! Quero os santos, para que não duvidem das diferenças e peçam perdão pelas injustiças.

Escolho meus amigos pela alma lavada e pela cara exposta. Não quero só o ombro e o colo, quero também sua maior alegria. Amigo que não ri junto, não sabe sofrer junto. Meus amigos são todos assim: metade bobeira, metade seriedade. Não quero risos previsíveis, nem choros piedosos.

Quero amigos sérios, daqueles que fazem da realidade sua fonte de aprendizagem, mas lutam para que a fantasia não desapareça. Não quero amigos adultos nem chatos. Quero-os metade infância e outra metade velhice! Crianças, para que não esqueçam o valor do vento no rosto; e velhos, para que nunca tenham pressa. Tenho amigos para saber quem eu sou. Pois ao vê-los loucos e santos, bobos e sérios, crianças e velhos, nunca me esquecerei de que a "normalidade" é uma ilusão imbecil e estéril.

Oscar Wilde

QUE BOM QUE VOCÊ CHEGOU! JUNTE-SE À NÓS!