Este blog não foi criado para quem já fechou as persianas de sua mente e cuidadosamente as fixou para que nenhum filete de luz de novas idéias penetre e perturbe sua sonolenta e estagnante zona de conforto. Este blog é para os poucos que querem entrar na terra firme da experiência direta por não verem outro caminho mais seguro a tomar.

23 janeiro 2008

A Lucidez Perigosa

As dores na região lombar não estão intensas como ontem, mas ainda causam enorme mal-estar. Seja sentado ou de pé, não encontro posição para ficar por mais de cinco minutos. Na madrugada, sonhos com pessoas já na terceira idade, todas mal casadas, mal amadas, com vidas mediocrizadas pelo constante hábito de criticar seus jovens conhecidos. A intuição me diz que as dores mais os sonhos responsáveis por uma madrugada mal dormida, aumentam o já constante mal-estar causado pela falta de sentido nas atividades profissionais que ainda exerço.
Sinto que esta dor é a resultante do atrito causado pelo “bolso que cobra” e a “coluna vertebral que se rebela”... A coluna que sustenta minha cabeça se rebela pelo fato da mesma ainda não ter encontrado outro modo de se sustentar... (estou a cinco dias sentado à frente da tela do micro, “pagando o mico” de fazer aquilo que não gosto para poder pagar o meu custo de vida.
Quanto ao sonho desta madrugada, sinto como um presságio das possibilidades que se apresentam para mim, caso não encontre outro modo de me sustentar que esteja imbuído de um real sentido.
Estranhos são os paradoxos da existência: parece mesmo que tudo aquilo que se resiste, persiste. Quanto mais necessidade sinto de me afastar de vez das atuais atividades profissionais que exerço, mais oportunidades para a continuidade das mesmas se apresentam diante de mim, sendo que algumas delas, bastante rentáveis. E as oportunidades para o desconhecido, parecem cada vez mais inexistentes.
Enquanto escrevo, sentado sob as pequeninas folhas verdes da Pitangueira, sinto o vento forte desalinhando meu cabelo. Aqui fora testemunho pessoas muito mais apressadas do que as cinzentas nuvens (algumas delas ainda se permitem um leve olhar com o desejo de bom dia), enquanto que lá dentro, foram cinco dias solitariamente trancafiado diante de uma tela de computador e, com o perdão da palavra, com uma puta dor.
Coincidência ou não, agora, enquanto a mão escrevo num pequeno bloco de rascunho, as dores parecem ter dado um tempo.
Minha escrita vez por outra é interrompida pelos sustos causados pelo meu pequeno cão, naqueles de andar apressado, perdidos em seus pensamentos e quase sempre com seus olhares voltados para o chão. Até parece que ele, com seus latidos, quer despertar estas pessoas desse modo de vida estressado comandado pelos ponteiros do relógio.
Agora, o vento forte está ficando cada vez mais gelado e as nuvens cinzas se tornaram mais pesadas, tomando o céu por completo. A dor física continua dando um tempo, enquanto que na mente continuam as trovoadas.




A Lucidez Perigosa
Clarice Lispector

Estou sentindo uma clareza tão grande
que me anula como pessoa atual e comum:
é uma lucidez vazia, como explicar?
assim como um cálculo matemático perfeito
do qual, no entanto, não se precise.

Estou por assim dizer
vendo claramente o vazio.
E nem entendo aquilo que entendo:
pois estou infinitamente maior que eu mesma,
e não me alcanço.
Além do que:
que faço dessa lucidez?
Sei também que esta minha lucidez
pode-se tornar o inferno humano
- já me aconteceu antes.

Pois sei que
- em termos de nossa diária
e permanente acomodação
resignada à irrealidade
- essa clareza de realidade
é um risco.

Apagai, pois, minha flama, Deus,
porque ela não me serve
para viver os dias.
Ajudai-me a de novo consistir
dos modos possíveis.
Eu consisto,
eu consisto,
amém.

Gostou? Então compartilhe!

Related Posts Plugin for WordPress, Blogger...

Escolho meus amigos pela pupila

Escolho meus amigos não pela pele ou outro arquétipo qualquer, mas pela pupila. Tem que ter brilho questionador e tonalidade inquietante.

A mim não interessam os bons de espírito nem os maus de hábitos. Fico com aqueles que fazem de mim louco e santo. Deles não quero resposta, quero meu avesso. Que me tragam dúvidas e angústias e agüentem o que há de pior em mim.

Para isso, só sendo louco! Quero os santos, para que não duvidem das diferenças e peçam perdão pelas injustiças.

Escolho meus amigos pela alma lavada e pela cara exposta. Não quero só o ombro e o colo, quero também sua maior alegria. Amigo que não ri junto, não sabe sofrer junto. Meus amigos são todos assim: metade bobeira, metade seriedade. Não quero risos previsíveis, nem choros piedosos.

Quero amigos sérios, daqueles que fazem da realidade sua fonte de aprendizagem, mas lutam para que a fantasia não desapareça. Não quero amigos adultos nem chatos. Quero-os metade infância e outra metade velhice! Crianças, para que não esqueçam o valor do vento no rosto; e velhos, para que nunca tenham pressa. Tenho amigos para saber quem eu sou. Pois ao vê-los loucos e santos, bobos e sérios, crianças e velhos, nunca me esquecerei de que a "normalidade" é uma ilusão imbecil e estéril.

Oscar Wilde

QUE BOM QUE VOCÊ CHEGOU! JUNTE-SE À NÓS!