Este blog não foi criado para quem já fechou as persianas de sua mente e cuidadosamente as fixou para que nenhum filete de luz de novas idéias penetre e perturbe sua sonolenta e estagnante zona de conforto. Este blog é para os poucos que querem entrar na terra firme da experiência direta por não verem outro caminho mais seguro a tomar.

08 outubro 2015

Longos são os desertos no caminho do ser que somos

Começamos a ter consciência do deserto quando percebemos não conseguir, depois da crise iniciática, recuperar o anterior estado de equilíbrio normótico.
As falas das pessoas e dos locais onde buscamos por respostas para o nosso desconhecido estado de confusão, se mostram secas e áridas; não saciam nossa sede.
Se olharmos com radical honestidade, veremos que o deserto sempre esteve presente em nossa vida, com suas pequenas dunas de tédio, vazio e insatisfação. 
Tentávamos, de modo inconsciente, matar nossa sede com as miragens das distrações, o que era equivalente a tentar matar a sede com água quente com sal. 
Em meio do nosso deserto iniciático, nos deparamos com alguns mestres e escolas, os quais acabam funcionando como um oásis de consciência, um poço de sabedoria.
Nesse oásis momentâneo, recuperamos nossas forças para seguir nossa jornada de autoconhecimento, na qual dunas maiores de deserto nos serão apresentados conforme nosso estado de prontificação. 
Nessas novas dunas, são trabalhados nossos músculos conscienciais. 
O Deserto se amplia com a percepção da natureza adoentada, pela qual foram formadas nossas reações, nossos hábitos, nossos hobbies, nossa profissão, nossa visão de mundo, nossa auto-imagem, nossas crenças e conceitos e nosso variado modo de fugir da dor. 
O deserto vai se ampliando cada vez mais, com a influência da incompreensão e do ostracismo por parte dos que nos são psicologicamente significativos. O deserto fica ainda maior, quando descobrimos que estes nos são significativos, não porque os amamos, mas sim, por causa do nosso interesse autocentrado. 
Quanto maior a compreensão de nossas ilusões, maiores as dunas do deserto.
No deserto somos tentados a voltar à prática de comportamentos que nos prometem pelo imediato prazer momentâneo. 
Quanto mais avançamos, maior se torna o deserto: os dizeres dos mestres e escolas não mais nos saciam; as falas dos amigos evolutivos deixam de ser nutritivas; desaparecem as manifestações dos momentos de “refrigério consciencial”; instala-se a dúvida e o sentimento de que não valeu nada o nosso caminhar. 
A inquietude é vivenciada de forma extremamente consciente, de forma limpa, fazendo com que o vazio se mostre como intransponível. 
Não encontramos ressonância e reverberação em nada, em ninguém. Tudo se mostra escuridão.
É um momento em que, se não estamos atentos, afundamos nas areias movediças do observador-ácido ou do observador-melancólico. 
Esse deserto se alastra para as nossas relações; tudo é deserto quando nos falta a água do amor no cantil do coração que somos. 
Nesse momento, os fortes ventos do imaginal nos enchem de medo e ansiedade, enquanto os abutres da depressão e das ideias de suicídio, de contínuo, pairam sobre nossa mente e espírito. 
O deserto se mostra o Getsêmani da mente adquirida. 
Instala-se uma emergência espiritual, a qual clama por um impulso interno, através da qual toda ação, todo contato, toda forma de relacionamento possa ser sentido com real sentido; é uma emergência pela manifestação do vocacional. 
Nesse deserto, ocorre também uma forte alergia à qualquer tipo de frase com base conformista ou à qualquer forma de explicação com entonação professoral  ou por disputas notoriamente alicerçadas no intelecto e na necessidade de autopromoção livresca. 
Apesar da dor da solidão, se faz preferível com ela ficar a dedicar tempo e energia com mentes autocentradas, inconscientes de que são prisioneiras da lógica, da razão ou da tradição, notoriamente aguçadas com o conteúdo apropriado de terceiros. 
Nesse deserto é que desenvolvemos olhos que veem e ouvidos que escutam; é que percebemos o quanto que fomos forçados a viver de forma totalmente invertida; percebemos que não nascemos para o trabalho, mas sim, o trabalho é que tem que nascer através de nós. Nesse deserto percebemos que o trabalho cuja natureza primordial está apenas em levantar dinheiro, ou então a busca da promoção pessoal, inevitavelmente se mostra um deserto, do qual, mais cedo ou mais tarde, dele, desertamos. 
A duras penas percebemos que no deserto, de nada vale carregar na mochila o impulso para a autopiedade, o vitimismo e o desabafo.

Outsider

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Escolho meus amigos pela pupila

Escolho meus amigos não pela pele ou outro arquétipo qualquer, mas pela pupila. Tem que ter brilho questionador e tonalidade inquietante.

A mim não interessam os bons de espírito nem os maus de hábitos. Fico com aqueles que fazem de mim louco e santo. Deles não quero resposta, quero meu avesso. Que me tragam dúvidas e angústias e agüentem o que há de pior em mim.

Para isso, só sendo louco! Quero os santos, para que não duvidem das diferenças e peçam perdão pelas injustiças.

Escolho meus amigos pela alma lavada e pela cara exposta. Não quero só o ombro e o colo, quero também sua maior alegria. Amigo que não ri junto, não sabe sofrer junto. Meus amigos são todos assim: metade bobeira, metade seriedade. Não quero risos previsíveis, nem choros piedosos.

Quero amigos sérios, daqueles que fazem da realidade sua fonte de aprendizagem, mas lutam para que a fantasia não desapareça. Não quero amigos adultos nem chatos. Quero-os metade infância e outra metade velhice! Crianças, para que não esqueçam o valor do vento no rosto; e velhos, para que nunca tenham pressa. Tenho amigos para saber quem eu sou. Pois ao vê-los loucos e santos, bobos e sérios, crianças e velhos, nunca me esquecerei de que a "normalidade" é uma ilusão imbecil e estéril.

Oscar Wilde

QUE BOM QUE VOCÊ CHEGOU! JUNTE-SE À NÓS!