Ele amanheceu com a dolorosa e crônica sensação da falta de sentido, a qual transformou o simples ato de levantar seus 2m e 5 cm de altura, num verdadeiro parto. Ao descer pelas escadas, deparou-se com a dura realidade de um pai alcoolizado a dormir no sofá, ao lado de várias latas de cerveja vazias, bem como um copo cheirando a Whisky. Mesmo tendo ouvido de um conceituado médico sobre a gravidade de seu estado de saúde, com tristeza pode constatar a insana insistência de seu velho, na fuga de si mesmo através do álcool.
A caminho do seu local de trabalho, a falta de sentido foi se intensificando em meio ao acentuado tráfego de carros, assim como de seus tumultuados pensamentos.
Já no estacionamento da Academia, deparou-se com o manobrista, seu Alberto, com o mesmo sorriso e as mesmas palavras de bom dia. Ainda na recepção, antes mesmo de passar pela catraca eletrônica, as fortes batidas musicais ajudaram a acelerar ainda mais a freqüência de seus pensamentos, bem como o vazio deixado pela constatação de uma vida de mediocridade. Respirou fundo, alongou os braços e pescoço e com movimentos lentos caminhou em direção de um dos alunos da Academia.
- Bom dia professor! Belê?
- Estamos aí!- Que cara é essa? Parece preocupado.
- Reflexos de uma noite mal dormida.
- Está com algum problema?
Ele limitou-se a um leve sorriso. Até pensou em responder que sua existência sem vida era seu grande problema, mas percebeu que tal resposta seria pura perda de tempo e energia.
- Então, teacher, assistiu os treinos da fórmula um?- Não.
- Não sabe o que perdeu.
Esforçando-se em mais um contrariado sorriso, lentamente saiu em direção ao vestiário, questionando-se por onde andariam as pessoas que, como ele, estão comprometidas não com os resultados da fórmula um, mas sim em chegar na fórmula de ser tão somente um.