São 12h16min. Um enorme vira-lata, branco com enormes manchas em caramelo urina ao pé do tronco da viçosa árvore. Há um movimento médio de pessoas e automóveis e a pouca, mas, abençoada brisa balança as folhas das árvores, plantas e das várias rabiolas plásticas enroscadas nos diversos fios de força elétrica e telefonia.
Hoje é o primeiro dia de outono, no entanto, o forte calor do sol faz com que se pareça muito mais com os dias deste último verão.
Já há alguns dias que venho experimentando sentimentos de tédio, rotina e falta de sentido... São sempre os mesmos movimentos, as mesmas atividades, as mesmas pessoas com seus velhos e rotineiros assuntos pautados no script social básico. As conversas deixam claro que se não estamos correndo atrás de alguns poucos trocados para dar conta do suado custo de vida, ou melhor, do suado custo existencial, - uma vez que nada disso pode ser comparado com vida -, estamos quase sempre buscando por alguma forma de distração...
Distopia, distorção, distração, distratar, distrição, disfarce, dis... Várias palavras com o mesmo prefixo, mas, que, no entanto, refletem o mau estado, o defeito, a dificuldade, a inércia e o distanciamento que buscamos da nossa própria realidade interior e exterior...
Essas conversas me mostram que sempre procuramos por algo que momentaneamente nos liberte desse terrível sentimento paralisante: tédio, vazio!...
É uma inquietude interior; um sentimento de que algo está faltando...
É como o buraquinho no centro do biscoito de polvilho...
Esse sentimento rouba a nossa energia criadora e sem ela, manifesta-se a letargia, o sono, a preguiça e para não se entregar a eles, busca-se uma ocupação qualquer, um passatempo...
Quando penso nisso, lembro-me sempre das frases de meu pai:
- Meu filho, é melhor manter a mente sempre ocupada com alguma coisa... Cabeça vazia, oficina do diabo!...
É o cafezinho na padaria, o jornal do dia, a revista semanal, a balinha de coco, a mudança do dial do rádio, a corridinha no shopping, aquele cigarrinho (licito ou ilícito)...
É o flerte e a sedução, a caixa de e-mails, o MSN, um novo texto, um novo site, um torpedinho no celular, uma passadinha rápida no Orkut ou no Blog longe dos olhos do patrão...
Uma ligação para um amigo, para a amante (a esposa é sempre a última das opções – pode trazer problemas que nos deixem ainda mais entediados!)...
É um novo softer, um novo filme, um novo joguinho ou baixar uma infinidade de mp3...
Quem sabe um grande negócio? Uma viagem para o Everest? Um final de semana num SPA?
Um sistema de yoga e meditação? Uma nova religião? Um novo credo?...
Credo!
Um novo escritor ou ousar organizar-se como tal?
Mas nada disso parece resolver; são apenas paliativos para situações momentâneas... Ele continua lá!...
E tão logo o efeito da “novocaína” – o anestésico do novo – encerra seu efeito, nosso conhecido inimigo comum se apresenta com juros e correções, por vezes não só monetárias, como também emocionais! E o resultado?
Ressaca...
Rodamos, rodamos, rodamos e rodamos mais um pouquinho e acabamos nos entediando de tanto rodar neste “museu de grandes novidades”, como já dizia o poeta.
E constatando tudo isso me pergunto:
O que fazer?
O que será que ocorre quando o tédio chega em sua plenitude?
Será possível viver a plenitude do tédio, experimentá-lo em sua totalidade?
Confesso que nunca me permiti passar por esta experiência. O próprio fato de escrever sobre o tédio já é uma infrutífera tentativa de me distrair do mesmo. Quem sabe seja melhor parar de escrever antes que você, leitor, projete seu próprio tédio para este texto...
É! Parece não ter jeito!
Se correr o tédio pega, se sentar o tédio come!...
E come lentamente... Os aposentados que o digam!
O que? Já sei!... Lá vem você com aquele pensamento coletivo dizendo que isso é “falta de Jesus em minha vida!”...
Quer saber? Na altura do campeonato, acho que até Jesus deve estar entediado com esse tipo de pensamento: Só Jesus salva!
Tudo bem! E depois?...
Quem é que vai me salvar de Jesus?
Ok! Ok!...
Melhor um tédio espiritual que um tédio comercial!...
E assim caminha a humanidade!...Que tédio!