O dia amanheceu com um sol escaldante, com a promessa de continuidade da série de fortes chuvas que por semanas castigava várias cidades. Sentei-me desfrutando da sombra de uma pequena árvore, a qual durante anos mantive o impulso para podá-la.
O vizinho da barbearia ao lado, aproveitava o tempo em que estava sem cliente para com sua pequena gaita tocar hinos de louvor.
Já não há a mínima possibilidade de silêncio diurno devido ao grande fluxo de automóveis nesta avenida.
Enquanto escrevo, pessoas passam por mim cabisbaixas, presas de seus próprios pensamentos, de seus problemas. Raras são aquelas que não mantém uma testa tensa e o andar acelerado. Algumas delas, ao depararem comigo sentado abaixo desta árvore, de chinelas e bermuda, em pleno horário comercial, exclamam:
– Eh! Vidão! Não quer mais nada né?
– Mas por que não desfrutar de um vidão?
É incrível como o ser humano está condicionado pela rotina de trabalho que lhe é tradicionalmente imposta.
Conformamo-nos em viver para o pagamento de contas, para ficar metade de nosso dia trancafiados no local de trabalho. Conformamo-nos com essa rotina insana e com a promessa de descanso em alguns futuros dias de férias ou de períodos de estabilidade adquirida. E outros de nós, nos conformamos até em seguir o modismo do mercado de trabalho que dita a obrigatoriedade de ter que trabalhar até aos domingos, ou em certas ocasiões, 24 horas. Muitos de nós nos conformamos a seguir as estúpidas regras do sistema sem levantar o menor questionamento, nos auto-justificando que se pararmos para pensar, ficaremos loucos. Ficaremos loucos ou desenlouqueceremos? E o que parece ainda mais insano é a frase socialmente dita quando morre um sujeito que vendeu os mais belos dias de sua existência sem vida para o sistema:
– Esse descansou; está bem melhor que nós!
Por que aceitamos isso?
Por que aceitamos trabalhar com algo que não nos nutre interiormente, que não nos leva à excelência de nós mesmos?
Por que vendemos os mais belos dias de nossa existência?
Por que incorporamos essa insana idéia de acumular posses para nos sentirmos seguros?
Por que não percebemos que quanto mais posses pensamos possuir, mais possuídos somos por essas posses?
Enquanto meditava nestas questões, desfrutando da leve brisa e dos pequenos raios solares refletidos na página do caderno pelos espaços entre as folhas da pequena árvore, sou subitamente interrompido por um antigo conhecido, o qual a muito tempo não via. Como já ocorrido anteriormente, usou do mesmo chavão:
– Eh! Isso é que é vida! Arrumou até uma sombrinha!
Depois desta exclamação, começou a desfilar suas reclamações quanto ao tamanho da fila no Banco e que o mesmo se encontrava lotado devido ao fato de ter apenas três caixas atendendo e de ter ocorrido uma “queda no sistema”.
– Coisas do sistema! Respondi sorrindo.
Comentou também sobre a morte de outro conhecido nosso, alegando que o mesmo havia morrido muito jovem, e justificando sua morte por este levar uma vida muito corrida e um tanto nervosa.
O vizinho da barbearia ao lado, aproveitava o tempo em que estava sem cliente para com sua pequena gaita tocar hinos de louvor.
Já não há a mínima possibilidade de silêncio diurno devido ao grande fluxo de automóveis nesta avenida.
Enquanto escrevo, pessoas passam por mim cabisbaixas, presas de seus próprios pensamentos, de seus problemas. Raras são aquelas que não mantém uma testa tensa e o andar acelerado. Algumas delas, ao depararem comigo sentado abaixo desta árvore, de chinelas e bermuda, em pleno horário comercial, exclamam:
– Eh! Vidão! Não quer mais nada né?
– Mas por que não desfrutar de um vidão?
É incrível como o ser humano está condicionado pela rotina de trabalho que lhe é tradicionalmente imposta.
Conformamo-nos em viver para o pagamento de contas, para ficar metade de nosso dia trancafiados no local de trabalho. Conformamo-nos com essa rotina insana e com a promessa de descanso em alguns futuros dias de férias ou de períodos de estabilidade adquirida. E outros de nós, nos conformamos até em seguir o modismo do mercado de trabalho que dita a obrigatoriedade de ter que trabalhar até aos domingos, ou em certas ocasiões, 24 horas. Muitos de nós nos conformamos a seguir as estúpidas regras do sistema sem levantar o menor questionamento, nos auto-justificando que se pararmos para pensar, ficaremos loucos. Ficaremos loucos ou desenlouqueceremos? E o que parece ainda mais insano é a frase socialmente dita quando morre um sujeito que vendeu os mais belos dias de sua existência sem vida para o sistema:
– Esse descansou; está bem melhor que nós!
Por que aceitamos isso?
Por que aceitamos trabalhar com algo que não nos nutre interiormente, que não nos leva à excelência de nós mesmos?
Por que vendemos os mais belos dias de nossa existência?
Por que incorporamos essa insana idéia de acumular posses para nos sentirmos seguros?
Por que não percebemos que quanto mais posses pensamos possuir, mais possuídos somos por essas posses?
Enquanto meditava nestas questões, desfrutando da leve brisa e dos pequenos raios solares refletidos na página do caderno pelos espaços entre as folhas da pequena árvore, sou subitamente interrompido por um antigo conhecido, o qual a muito tempo não via. Como já ocorrido anteriormente, usou do mesmo chavão:
– Eh! Isso é que é vida! Arrumou até uma sombrinha!
Depois desta exclamação, começou a desfilar suas reclamações quanto ao tamanho da fila no Banco e que o mesmo se encontrava lotado devido ao fato de ter apenas três caixas atendendo e de ter ocorrido uma “queda no sistema”.
– Coisas do sistema! Respondi sorrindo.
Comentou também sobre a morte de outro conhecido nosso, alegando que o mesmo havia morrido muito jovem, e justificando sua morte por este levar uma vida muito corrida e um tanto nervosa.
Começou então a reclamar sobre os gastos absurdos com os impostos gerados pelos seus três apartamentos no litoral Santista, ao lado do Forte; da sua chácara situada no km 75 da Castelo Branco, num dos melhores condomínios fechados da região, com piscina, campo de futebol gramado (com grama de R$5,00 o m2), coberto com uma rede de nylon caríssima, a qual já estava se deteriorando devido a ação do tempo; reclamando do modo de vida do caseiro da tal chácara, que não plantava nem um pé de couve para comer, alegando que ele sim desfrutava daquela chácara, da qual ele mesmo só usufruía por umas duas vezes ao ano.
– Por que então, o senhor não aluga essa sua chácara para temporadas? Poderia ajudar-lhe na manutenção das despesas!
– Oh, não! Nunca mais alugo nada do que é meu, principalmente para conhecidos! Esses sim destroem tudo! Na hora de alugar afirmam que vão em apenas quatro pessoas e por fim, levam quatro famílias! Não sei o que faço, nem mesmo sei por que mantenho essa chácara! Neste ano, só de imposto tenho que gastar com ela R$2.800,00.
Disse-me também que se encontrava desanimado com outra propriedade sua; uma construção de 2.000 m2, a qual havia construído com a expectativa de que a mesma lhe rendesse uma renda mensal média de R$15.000,00, mas, que na realidade, mal conseguia alcançar a metade desse valor por meio de arrendamento.
Com orgulho no olhar, levantou seu boné e afirmou gesticulando com o indicador direito que trabalhou durante quarenta e sete anos, atrás de um balcão de padaria, sem tirar sequer um dia de folga e que em toda sua vida, só tirou um mês de férias para visitar os parentes em Portugal, quando se desfez da padaria e que o resultado de suas férias havia sido catastrófico, pois voltará mais cansado do que quando para lá foi.
Respeitosamente lhe perguntei:
– E depois de tudo isso que o senhor me contou sobre a sua existência, o senhor ainda acha que estou errado de estar aqui, embaixo desta pequena árvore, de sandálias aos pés, com uma folgada bermuda, observando o movimento das pessoas?
– Quantos anos você têm? Perguntou-me.
– Quarenta e dois anos, próximo de completar quarenta e três.
– Não, não! Você é que está certo! Têm quarenta e dois anos e parece ter vinte e oito... Você é quem está certo!
Bastante sem graça, iniciou sua despedida olhando para um surrado relógio, alegando estar atrasado para correr para um outro banco e pagar suas contas.
Com um safado sorriso no olhar, saiu caminhando e falando em baixo tom:
– Minha esperança, está no desconto dado pela prefeitura para os aposentados! Até mais! Mande lembranças para o velhinho do seu pai!
– Minha esperança, está no desconto dado pela prefeitura para os aposentados! Até mais! Mande lembranças para o velhinho do seu pai!