Brasigóis Felício
Certas pessoas fazem questão de viver em estado de tensão máxima, como os cabos que levam energia de alta voltagem, ainda não rebaixada pelas subestações – carregam uma energia bruta, incontrolada, capaz de produzir grandes estragos, sendo propícias a monumentais explosões de cólera, raiva, e outras emoções mortais e mortíferas. Vivendo em curto-circuito continuo, produzem grande tensão à sua volta: tornam-se personas tensionadas e tensionantes, representando perigo de implosão constante. Mesmo o seu silêncio é nervoso, turbulento, sujeito a tempestades e trovoadas – sendo apenas um grande trovão que ainda não aconteceu.
Mesmo sendo contumazes e constantes, em seu jeito useiro e vezeiro de serem mau-humorados e azedos preferenciais, são ao mesmo tempo previsíveis, em sua normose costumeira: parecem funcionar em padrão que se torna familiar, embora impossível de com ele se poder acostumar. O senso de individualidade de tais criaturas é deformado, perde-se em seu egoísmo empedernido, que as faz querer e exigir que tudo seja feito em função de seus desejos, e para seu único e exclusivo proveito. Ai de quem não se sujeitar ao império de suas pétrea e inamovível vontade!
Quando sua doença de mente (fruto de seu temperamento zangado, arredio à amizade, irascível e perturbador da paz) chega a supitar de estrovengagem, a infecção insidiosa da serenidade entra em estado de metástase, passam a viver em estado de surto, de tanto só existir em estado de curto circuito dos sistemas da auto-regulação do Ser. Então são capazes de desmanchar roda de bêbado. Quando dão um tempo, e se vão, levando consigo a carranca de seu sem semblante, a que chamam de tromba, embora sendo injustos com os elefantes, criaturas da serenidade e da paz (até que não os atazanemos) suspira-se, com alívio. Então é possível relaxar e gozar a delícia da vida – e desfrutar da comovedora ternura cantante de viver.
Dá vontade de perguntar, aos que assistem às efêmeras mudanças de humor, em que alguma alegria não percebida consegue passar pelas frinchas de seu eterno mau humor: por que ela escolheu viver em alta tensão? Por que não quer ser feliz? Por que não permanece assim, como pessoa da paz, e não como a pessoa-pax, que nos obriga a ir correndo, comprar um seguro funerário, só de a termos conhecido? Outra pergunta se impõe: Por que escolheram o jeito ruim de viver, sendo um perigo, elemento potencialmente explosivo, para si próprio, e os de seu convívio? As pessoas que vivem em curto, ou as personas que subsistem em surto de descompasso com a energia e as leis que regem a sinfonia da vida? Difícil saber a resposta, ainda não inventaram um instrumento para medir a capacidade do ser humano para produzir e suportar sofrimento, e de construir usinas de infelicidade crônica.
Tais pessoas seriam da paz, e não da pax, se levassem ao coração do Ser (ou ao Ser do coração) a interpretação do belo e inspirador salmo 23, do Evangelho cristão: “O senhor é meu pastor” – isto é relacionamento. “”Nada me faltará” – isto é suprimento. “Caminhar me faz por verdes pastos” – isto é descanso. “Guia-me mansamente por águas tranqüilas” – isto é refrigério. “Refrigera a minha alma – isto é cura. “Guia-me pelas veredas da justiça/” – isto é direção. “Pelo amor de seu nome” – isto é propósito. “Ainda que eu caminhasse pelo vale de sombra da morte,” – isto é provação. “Eu não temeria mal algum – isto é proteção. “Porque tu estás comigo,” – isto é fidelidade. “A tua vara e o teu cajado me consolam” – isto é disciplina. “Prepara uma mesa para mim na presença de meus inimigos” – isto é esperança. “Unge a minha cabeça com óleo” – isto é consagração. “E meu cálice transborda – isto é abundância. “Certamente que a bondade e a misericórdia me seguirão todos os dias da minha vida” – isto é bênção. “E habitarei a casa do senhor” – isto é segurança. “por longos dias – isto é eternidade.