Eram por volta das 10:30min. quando ele me ligou profundamente perturbado. Sua respiração estava bastante ofegante e sua fala com o tom típico de quem havia acabado de levar uma tremenda surra emocional. Há tempos que não o via passando por tal situação.
- Alô, JR? Aqui é o Mendes!
- Fala garoto! Quanto tempo!... Como vai você?
- Nada bem! Estou precisando de ajuda... Será que você poderia me ouvir um pouco?
- Claro!
- Não vou lhe atrapalhar?
- Fique tranqüilo, pois no momento estou só na loja! Se chegar alguém te aviso, ok?
- Certo!
- Então irmãozinho? Que bicho está te pegando?
- Não estou agüentando mais.
- O que?
- A situação aqui em casa.
- Não mudou nada? Continua na mesma?
- Pois é! Acho que vou jogar a toalha; cheguei ao meu limite e não vejo como continuar... Estou sendo literalmente massacrado; sinto-me constantemente abusado! Não tem mais clima nenhum para poder continuar vivendo sobre o mesmo teto. Você bem sabe o quanto que tentei... Mas fazer o que se o outro não faz a sua parte para criar um clima de unidade e bem-estar comum? O lance aqui funciona mais ou menos assim: “cada um para si e o diabo para todos!”... Apesar de eles serem “adventistas”, parece que o Deus deles não volta para casa com eles depois do culto... Não é possível!
- A coisa está feia assim?
- Só para você ter uma idéia melhor, estou falando com você olhando para um prato de comida com dois pedaços de ossos de frango largados na mesinha da sala, desde o almoço de ontem... Isso sem contar o par tênis largado pela sala... É um pé embaixo da mesinha de vidro e o outro embaixo do beiral do sofá... É muita sujeira meu véio! As meninas não querem saber de nada, não movem uma palha para ajudar... O lance delas é só ficar na conversa fiada com as amigas no portão de casa, com o som no último volume tocando aqueles funks que não suporto... É o ritual de sempre... Acordam quase meio-dia, descem sem ao menos escovarem os dentes, vão para a cozinha, pegam um pão com a primeira coisa que vem pela frente e saem comendo pela casa a fora... Aí é tomar banho, colocar uma roupa limpa e cair na gandaia. Não querem saber de nada!
- Caracas! Que situação!
- É revista, cd’s e dvd’s esparramados por todos os lados... Tudo que pegam não conseguem colocar no lugar. Até mesmo suas peças intimas usadas, são largadas pelo chão do quarto ou do banheiro. Não existe a mínima colaboração. Quando a mãe delas está em casa, até que elas fazem uma média! Mas, se estou só com elas, é como se eu não existisse. Não há o menor diálogo, muito menos colaboração. Se chegam para conversar, pode crer que estão precisando de algo ou então, se meteram em alguma encrenca. Aí você passa a existir, mas somente até a página três, somente até conseguirem o que desejam. São muito interesseiras...
- E a mãe delas?
- Ah, véio! Já estou cansado de reclamar! Ela não faz nada de prático; tenta sempre colocar panos quentes na situação alegando que isso é coisa da idade. Véio, trata-se de duas adolescentes, uma de dezesseis anos e a outra com vinte... Ainda se fossem meninos, vai lá! Tenho até vergonha de falar, mas, até a descarga do banheiro elas têm preguiça de dar! Imagina só a situação... Não consigo mais ficar no meio de tanta sujeira e descaso. Cheguei ao meu limite. Não dá mais!
- E o que você está pensando em fazer? Que atitude pretende tomar?
- “Atitude”! Essa é a palavra!... Mas, falando sério? Estou tão confuso que não sei que atitude tomar! A mente cada hora diz uma coisa...
- Você está confuso ou está com medo?
- Na real? Estou com um puta cagaço! Tenho muito medo de perdê-la! Gosto dela prá cacete, mas não tem como continuar vivendo com ela, juntamente com suas filhas!
- Mas qual é o medo?
- De um monte de coisas... Minha cabeça não para, está que nem carrossel descontrolado. Parece que meus miolos a qualquer momento vão derreter... Esta noite, quase que cometo uma loucura... Tive que me segurar na cama para não me levantar e descer a cinta nas duas... Não consigo sentir que estou em casa; para ser franco, para mim é um verdadeiro martírio quando se encerra a minha jornada de trabalho e me deparo com a fila do ônibus que vai para minha casa... Só de pensar nisso já fico deprimido... Desço do ônibus, viro a esquina e lá estão elas com aquele monte de amigas, sentadas diante do portão com a casa toda escancarada e o som no último. Aí é aquele boa noite básico e subo direto para meu quarto... Isso mais se parece com um sistema de regime semi-aberto... Trabalhar durante o dia e a noite voltar para a minha cela. É bem assim que me sinto! Quero minha liberdade de volta!
- Nesse caso, é independência ou morte!
- Tem mais... Vivem me jogando na cara que aquela casa não é minha e outro dia, a mais velha, em meio de uma discussão, teve a petulância de dizer que se eu fosse realmente homem, não estaria vivendo com a mãe dela naquela casa. A discussão começou por que ela teve a pachorra de chamar minha atenção pelo fato de eu estar usando a internet discada durante a semana... Detalhe: quem paga a conta de telefone e o provedor de acesso à internet sou eu!
- Realmente, isso é muita falta de limite e semancol! Ela não tem desconfiômetro não?
- O pior de tudo é que ela deturpou toda a situação no meio da família dela e quem acabou saindo como vilão da história fui eu!
- Bem, você já sabe que nesse caso você será sempre visto como o intruso, como o corpo estranho da família... Ninguém levará em conta o que sua esposa sofreu com o ex-marido, o motivo da falência do casamento deles e muito menos se ela hoje está feliz... Você será sempre o bode-expiatório de todas as situações. Sei muito bem o que estou dizendo, pois já tive na pele uma experiência muito semelhante.
- Sei muito bem disso, justamente por isso que te procurei! Sinto que em casa existe uma grande dualidade... É como se fossem duas famílias sobre o mesmo teto: eu e a minha esposa, minha esposa e suas filhas.
- E como sua esposa reage diante dessa situação?
- Sabe como é: mãe é mãe! Ela fica em cima do muro, não se posiciona com assertividade. Limita-se a dar umas bronquinhas, alguns gritos, mas que de nada resolvem. Sei muito bem que insanidade é fazer as mesmas coisas esperando resultados diferentes. Se uma situação está intolerável, permanecer nela, é sinal de falta de saúde mental. Se eu continuar ali, estarei assinando meu atestado de insanidade mental.
- Se for isso tudo bem! Pior será se você acabar tendo que assinar um boletim de ocorrência na delegacia do menor ou da mulher... Lá até você explicar que focinho de porco não é tomada, você já virou lingüiça! Você sabe bem que lá não vão querer saber de nada uma vez que você é homem feito, barbado e de maior... Isso é tudo o que eles e a imprensa mais precisam...
- Pois é véio! Tenho total consciência disso, no entanto, o medo me impede de tomar uma atitude... Atitude é tudo! Preciso arranjar coragem não sei de onde; preciso fazer alguma coisa urgentemente!
- Não creio que você precise de coragem; não acho que seja esse o seu caso. Creio que o mais importante seja observar a situação, visceralmente, bem como toda forma de medo dela resultante. Creio que você só precisa se sentar com os seus medos, dando-lhes as boas vindas! Você já está careca de saber que as emoções não suportam serem observadas! É através da observação que vemos a total falsidade dos nossos medos e quando vemos o falso, apresenta-se instantaneamente, a ação correta, a atitude centrada, isenta de qualquer carga posterior de culpa, remorso ou desejo de retrocesso. É como diz o velho ditado: “A Verdade vos libertará”. Quando se apresenta a ação correta, não sobra espaço para a dualidade, muito menos conflito na mente.
- Por isso que acho que tenho que arrumar coragem...
- Coragem não meu amigo: boa vontade para se sentar com seus medos.... “Bem-aventurados os homens de boa vontade para se sentarem com seus medos não esperando por doações psicológicas de fora, pois deles é o reino da unidade interna, do bem-estar que é comum e não passageiro e da autonomia e auto-suficiência psicológica”
- Sarava meu véio!
- Alô, JR? Aqui é o Mendes!
- Fala garoto! Quanto tempo!... Como vai você?
- Nada bem! Estou precisando de ajuda... Será que você poderia me ouvir um pouco?
- Claro!
- Não vou lhe atrapalhar?
- Fique tranqüilo, pois no momento estou só na loja! Se chegar alguém te aviso, ok?
- Certo!
- Então irmãozinho? Que bicho está te pegando?
- Não estou agüentando mais.
- O que?
- A situação aqui em casa.
- Não mudou nada? Continua na mesma?
- Pois é! Acho que vou jogar a toalha; cheguei ao meu limite e não vejo como continuar... Estou sendo literalmente massacrado; sinto-me constantemente abusado! Não tem mais clima nenhum para poder continuar vivendo sobre o mesmo teto. Você bem sabe o quanto que tentei... Mas fazer o que se o outro não faz a sua parte para criar um clima de unidade e bem-estar comum? O lance aqui funciona mais ou menos assim: “cada um para si e o diabo para todos!”... Apesar de eles serem “adventistas”, parece que o Deus deles não volta para casa com eles depois do culto... Não é possível!
- A coisa está feia assim?
- Só para você ter uma idéia melhor, estou falando com você olhando para um prato de comida com dois pedaços de ossos de frango largados na mesinha da sala, desde o almoço de ontem... Isso sem contar o par tênis largado pela sala... É um pé embaixo da mesinha de vidro e o outro embaixo do beiral do sofá... É muita sujeira meu véio! As meninas não querem saber de nada, não movem uma palha para ajudar... O lance delas é só ficar na conversa fiada com as amigas no portão de casa, com o som no último volume tocando aqueles funks que não suporto... É o ritual de sempre... Acordam quase meio-dia, descem sem ao menos escovarem os dentes, vão para a cozinha, pegam um pão com a primeira coisa que vem pela frente e saem comendo pela casa a fora... Aí é tomar banho, colocar uma roupa limpa e cair na gandaia. Não querem saber de nada!
- Caracas! Que situação!
- É revista, cd’s e dvd’s esparramados por todos os lados... Tudo que pegam não conseguem colocar no lugar. Até mesmo suas peças intimas usadas, são largadas pelo chão do quarto ou do banheiro. Não existe a mínima colaboração. Quando a mãe delas está em casa, até que elas fazem uma média! Mas, se estou só com elas, é como se eu não existisse. Não há o menor diálogo, muito menos colaboração. Se chegam para conversar, pode crer que estão precisando de algo ou então, se meteram em alguma encrenca. Aí você passa a existir, mas somente até a página três, somente até conseguirem o que desejam. São muito interesseiras...
- E a mãe delas?
- Ah, véio! Já estou cansado de reclamar! Ela não faz nada de prático; tenta sempre colocar panos quentes na situação alegando que isso é coisa da idade. Véio, trata-se de duas adolescentes, uma de dezesseis anos e a outra com vinte... Ainda se fossem meninos, vai lá! Tenho até vergonha de falar, mas, até a descarga do banheiro elas têm preguiça de dar! Imagina só a situação... Não consigo mais ficar no meio de tanta sujeira e descaso. Cheguei ao meu limite. Não dá mais!
- E o que você está pensando em fazer? Que atitude pretende tomar?
- “Atitude”! Essa é a palavra!... Mas, falando sério? Estou tão confuso que não sei que atitude tomar! A mente cada hora diz uma coisa...
- Você está confuso ou está com medo?
- Na real? Estou com um puta cagaço! Tenho muito medo de perdê-la! Gosto dela prá cacete, mas não tem como continuar vivendo com ela, juntamente com suas filhas!
- Mas qual é o medo?
- De um monte de coisas... Minha cabeça não para, está que nem carrossel descontrolado. Parece que meus miolos a qualquer momento vão derreter... Esta noite, quase que cometo uma loucura... Tive que me segurar na cama para não me levantar e descer a cinta nas duas... Não consigo sentir que estou em casa; para ser franco, para mim é um verdadeiro martírio quando se encerra a minha jornada de trabalho e me deparo com a fila do ônibus que vai para minha casa... Só de pensar nisso já fico deprimido... Desço do ônibus, viro a esquina e lá estão elas com aquele monte de amigas, sentadas diante do portão com a casa toda escancarada e o som no último. Aí é aquele boa noite básico e subo direto para meu quarto... Isso mais se parece com um sistema de regime semi-aberto... Trabalhar durante o dia e a noite voltar para a minha cela. É bem assim que me sinto! Quero minha liberdade de volta!
- Nesse caso, é independência ou morte!
- Tem mais... Vivem me jogando na cara que aquela casa não é minha e outro dia, a mais velha, em meio de uma discussão, teve a petulância de dizer que se eu fosse realmente homem, não estaria vivendo com a mãe dela naquela casa. A discussão começou por que ela teve a pachorra de chamar minha atenção pelo fato de eu estar usando a internet discada durante a semana... Detalhe: quem paga a conta de telefone e o provedor de acesso à internet sou eu!
- Realmente, isso é muita falta de limite e semancol! Ela não tem desconfiômetro não?
- O pior de tudo é que ela deturpou toda a situação no meio da família dela e quem acabou saindo como vilão da história fui eu!
- Bem, você já sabe que nesse caso você será sempre visto como o intruso, como o corpo estranho da família... Ninguém levará em conta o que sua esposa sofreu com o ex-marido, o motivo da falência do casamento deles e muito menos se ela hoje está feliz... Você será sempre o bode-expiatório de todas as situações. Sei muito bem o que estou dizendo, pois já tive na pele uma experiência muito semelhante.
- Sei muito bem disso, justamente por isso que te procurei! Sinto que em casa existe uma grande dualidade... É como se fossem duas famílias sobre o mesmo teto: eu e a minha esposa, minha esposa e suas filhas.
- E como sua esposa reage diante dessa situação?
- Sabe como é: mãe é mãe! Ela fica em cima do muro, não se posiciona com assertividade. Limita-se a dar umas bronquinhas, alguns gritos, mas que de nada resolvem. Sei muito bem que insanidade é fazer as mesmas coisas esperando resultados diferentes. Se uma situação está intolerável, permanecer nela, é sinal de falta de saúde mental. Se eu continuar ali, estarei assinando meu atestado de insanidade mental.
- Se for isso tudo bem! Pior será se você acabar tendo que assinar um boletim de ocorrência na delegacia do menor ou da mulher... Lá até você explicar que focinho de porco não é tomada, você já virou lingüiça! Você sabe bem que lá não vão querer saber de nada uma vez que você é homem feito, barbado e de maior... Isso é tudo o que eles e a imprensa mais precisam...
- Pois é véio! Tenho total consciência disso, no entanto, o medo me impede de tomar uma atitude... Atitude é tudo! Preciso arranjar coragem não sei de onde; preciso fazer alguma coisa urgentemente!
- Não creio que você precise de coragem; não acho que seja esse o seu caso. Creio que o mais importante seja observar a situação, visceralmente, bem como toda forma de medo dela resultante. Creio que você só precisa se sentar com os seus medos, dando-lhes as boas vindas! Você já está careca de saber que as emoções não suportam serem observadas! É através da observação que vemos a total falsidade dos nossos medos e quando vemos o falso, apresenta-se instantaneamente, a ação correta, a atitude centrada, isenta de qualquer carga posterior de culpa, remorso ou desejo de retrocesso. É como diz o velho ditado: “A Verdade vos libertará”. Quando se apresenta a ação correta, não sobra espaço para a dualidade, muito menos conflito na mente.
- Por isso que acho que tenho que arrumar coragem...
- Coragem não meu amigo: boa vontade para se sentar com seus medos.... “Bem-aventurados os homens de boa vontade para se sentarem com seus medos não esperando por doações psicológicas de fora, pois deles é o reino da unidade interna, do bem-estar que é comum e não passageiro e da autonomia e auto-suficiência psicológica”
- Sarava meu véio!