Ela queixava-se da falta de alegria de viver e por não ter surgido em sua vida, alguém com as mesmas qualidades do seu finado marido. Procurava justificar seu vazio existencial, numa tentativa insana de negar a realidade de seus sentimentos. A imagem carregada em sua memória infectava qualquer possibilidade agora apresentada. Não conseguia ver que a imagem dos seus tempos dourados armazenada em sua memória funcionava como as lentes de uns óculos escuros que impedem a clareza da luz solar.
Não conseguia perceber que o resultado de sua busca já estava condicionada, o que de certa forma, tornava impossível a concretização da mesma, uma vez que seu condicionamento lhe impedia de se manter aberta para tudo que a vida lhe apresentasse. Suas idéias referentes a um “relacionamento saudável” mais se pareciam com as fantasias adolescentes provenientes dos contos de fadas, em que a bela – já não tão bela -, se via só na espera de seu príncipe encantado com o conhecido desfecho “foram felizes para sempre”. Achava que sua paz de espírito e alegria de viver repousava no fato de ter um homem, ou melhor, uma espécie de papel-carbono do seu antigo e finado relacionamento. Há anos que vinha mantendo o mesmo discurso; tal qual um antigo LP riscado, que impede as pessoas de desfrutarem da beleza, da harmonia e do tempo de cada nova faixa musical.
Sem a menor sombra de constrangimento, descarregava toda carga da sua autopiedade nos ouvidos desatentos dos menos prevenidos. De forma inconsciente, como um vampiro emocional procurava se alimentar da energia dos poucos que ousavam viver no espelho das relações.
Sua queixa deixava bastante claro que, ao conhecer um novo homem, mantinha-se atenta não para as suas qualidades, mas sim, na caça dos seus defeitos e na falta de semelhança com o modo de ser de seu finado marido. Sempre havia uma desculpa esfarrapada para não se relacionar de fato, para não se entregar à magia do desconhecido. Fingia buscar por um relacionamento, quando na verdade, o que realmente queria era o pseudo-conforto do isolamento, com a coberta da atenção forçada pela sua autopiedade.
Por volta dos seus 65 anos de idade, apresentava sua face bastante carregada por uma forte maquiagem, que era uma inútil tentativa de fazer com que as cores artificiais demonstrassem um pouco de vida em seu olhar. Sua cosmética não tinha nada haver com a ética, muito menos, com a beleza e integridade do cosmos. Atrás de um sorriso “básico social”, havia ali uma mulher frustrada, atormentada e solitária.
Isso me levou à reflexão de que nunca antes vivemos uma época em que a preocupação com a estética sobrepôs-se de tamanha forma a preocupação com a ética como nos dias de hoje. Muitos de nós revestimos nossas bocas com dentes de porcelanas, mas temos a alma cariada. Vestimo-nos com "marcas famosas" para esconder dos outros nossas "marcas desconhecidas" originarias de nossa educação medíocre, disfuncional e estúpida. Fazemos lipoaspirações das gorduras do corpo, mas mantemos nossas mentes com a gordura do embotamento dos condicionamentos e preconceitos disfuncionais oriundos da tradição familiar e social. Investimos nosso tempo e dinheiro em benfeitorias estéticas, mas não nos damos o tempo e a seriedade necessária para a formação de uma consciência apurada e assim nos mantemos num estado de mediocridade, insensibilidade e pobreza de espírito. Lustramos a porcelana, mas não trocamos a água estagnada do vazo.
Por que as pessoas insistem em viver presas nas experiências do passado?
Por que insistem em projetar um futuro calcado na memória?
Por que esse medo de se entregar ao desconhecido?
Por que essa necessidade mórbida de fazer uso da fantasia como um modo de evitar uma autêntica intimidade?
Por que insistimos em comparar a realidade do hoje com o já falecido ontem?
Por que não percebemos que toda “comparação” psicológica já carrega na própria palavra a impossibilidade de se permitir o movimento?
Enquanto ouvia aquela senhora com suas roupas coloridas, seu cabelo armado e suas bijuterias alegóricas, essas perguntas não paravam de rodar em minha cabeça.
Apesar da sua idade avançada, não passava de uma criança insegura, num corpo de idoso, buscando pela proteção de um pai nos braços de um príncipe idealizado.
A noite começava a se apresentar com seus tons azulados e as estrelas, timidamente despontavam de horizonte à horizonte.
Não conseguia perceber que o resultado de sua busca já estava condicionada, o que de certa forma, tornava impossível a concretização da mesma, uma vez que seu condicionamento lhe impedia de se manter aberta para tudo que a vida lhe apresentasse. Suas idéias referentes a um “relacionamento saudável” mais se pareciam com as fantasias adolescentes provenientes dos contos de fadas, em que a bela – já não tão bela -, se via só na espera de seu príncipe encantado com o conhecido desfecho “foram felizes para sempre”. Achava que sua paz de espírito e alegria de viver repousava no fato de ter um homem, ou melhor, uma espécie de papel-carbono do seu antigo e finado relacionamento. Há anos que vinha mantendo o mesmo discurso; tal qual um antigo LP riscado, que impede as pessoas de desfrutarem da beleza, da harmonia e do tempo de cada nova faixa musical.
Sem a menor sombra de constrangimento, descarregava toda carga da sua autopiedade nos ouvidos desatentos dos menos prevenidos. De forma inconsciente, como um vampiro emocional procurava se alimentar da energia dos poucos que ousavam viver no espelho das relações.
Sua queixa deixava bastante claro que, ao conhecer um novo homem, mantinha-se atenta não para as suas qualidades, mas sim, na caça dos seus defeitos e na falta de semelhança com o modo de ser de seu finado marido. Sempre havia uma desculpa esfarrapada para não se relacionar de fato, para não se entregar à magia do desconhecido. Fingia buscar por um relacionamento, quando na verdade, o que realmente queria era o pseudo-conforto do isolamento, com a coberta da atenção forçada pela sua autopiedade.
Por volta dos seus 65 anos de idade, apresentava sua face bastante carregada por uma forte maquiagem, que era uma inútil tentativa de fazer com que as cores artificiais demonstrassem um pouco de vida em seu olhar. Sua cosmética não tinha nada haver com a ética, muito menos, com a beleza e integridade do cosmos. Atrás de um sorriso “básico social”, havia ali uma mulher frustrada, atormentada e solitária.
Isso me levou à reflexão de que nunca antes vivemos uma época em que a preocupação com a estética sobrepôs-se de tamanha forma a preocupação com a ética como nos dias de hoje. Muitos de nós revestimos nossas bocas com dentes de porcelanas, mas temos a alma cariada. Vestimo-nos com "marcas famosas" para esconder dos outros nossas "marcas desconhecidas" originarias de nossa educação medíocre, disfuncional e estúpida. Fazemos lipoaspirações das gorduras do corpo, mas mantemos nossas mentes com a gordura do embotamento dos condicionamentos e preconceitos disfuncionais oriundos da tradição familiar e social. Investimos nosso tempo e dinheiro em benfeitorias estéticas, mas não nos damos o tempo e a seriedade necessária para a formação de uma consciência apurada e assim nos mantemos num estado de mediocridade, insensibilidade e pobreza de espírito. Lustramos a porcelana, mas não trocamos a água estagnada do vazo.
Por que as pessoas insistem em viver presas nas experiências do passado?
Por que insistem em projetar um futuro calcado na memória?
Por que esse medo de se entregar ao desconhecido?
Por que essa necessidade mórbida de fazer uso da fantasia como um modo de evitar uma autêntica intimidade?
Por que insistimos em comparar a realidade do hoje com o já falecido ontem?
Por que não percebemos que toda “comparação” psicológica já carrega na própria palavra a impossibilidade de se permitir o movimento?
Enquanto ouvia aquela senhora com suas roupas coloridas, seu cabelo armado e suas bijuterias alegóricas, essas perguntas não paravam de rodar em minha cabeça.
Apesar da sua idade avançada, não passava de uma criança insegura, num corpo de idoso, buscando pela proteção de um pai nos braços de um príncipe idealizado.
A noite começava a se apresentar com seus tons azulados e as estrelas, timidamente despontavam de horizonte à horizonte.