Segunda-feira com chuva. Estou começando mais um dia, sendo logo cedo agraciado com a beleza de um milagre: uma pequenina e solitária pitanga amarelinha, envolta em gotículas d'água da chuva. Seu tom amarelado faz um belo contraste com as verdes folhas da pequenina árvore... Esse não é o mesmo verde e amarelo do agitado movimento nacionalista presente nos jogos Pan-Americanos. É um verde e amarelo de um inteligente e harmônico equilíbrio. Apesar da chuva fraca, a temperatura encontra-se agradável.
Há bastante lixo esparramado pelas calçadas e poucos são os pedestres que transitam pelas mesmas. O trânsito local, até agora, apresenta-se bastante reduzido para uma segunda-feira.
Enquanto, na padaria local, saboreava um copo de café com leite, silenciosamente eu observava a empolgação que movia a conversa em alto tom entre três senhores, distribuídos ao longo do balcão. O assunto: futebol. Cada um deles falava de peito aberto, as certeiras estratégias que deveriam ser tomadas por seus respectivos times de adoração, para que os mesmos pudessem obter os resultados por eles apresentados. Apontavam com minuciosos detalhes as falhas de cada um, desde o técnico, jogadores, comissão técnica, diretoria, presidência e até mesmo, as coligações com os patrocinadores. Eles diziam saber o melhor para os seus times e o expressavam sem a menor hesitação. Um deles, enquanto falava, corria seu olhar por toda extensão do balcão, certificando-se de que os outros clientes estivessem de acordo com as suas considerações.
Já no último gole do meu café, ocorreu-me o seguinte pensamento:
Será possível, algum dia, os homens falarem abertamente, com o mesmo entusiasmo e empolgação a respeito de seus conflitos, suas angústias, seus medos de não terem a realização de seus desejos infantis e sobre suas dúvidas e inseguranças?
Será que algum dia o homem versará livremente sobre suas próprias falhas, desatinos e corrupções?
É preciso ter em mente que corrupção é muito mais do que passar dinheiro por debaixo da mesa. Corrupção é esse movimento insano que nega a interioridade em nome da exterioridade. É a negação da realidade de si mesmo em conformidade com a falsidade da influência de terceiros. É tudo aquilo a que conscientemente nos sujeitamos e que contraria o bom-censo do ser que nos faz ser. É toda atividade que contribui para o intrincado processo que nos afasta da essencial descoberta do motivo pelo qual estamos no aqui e agora.
Do outro lado da rua, um senhor por volta da terceira-idade, de boné na cabeça, barba mal-feita e uma surrada capa de chuva, anonimamente revirava os sacos de lixo em busca de papelão e latinhas de alumínio.