Bem em frente da nossa casa, há um pequeno coqueiro e ao seu lado uma enorme mangueira, onde todas as manhãs, várias maritacas nos brindam com suas algazarras.
Meu vizinho estacionou seu carro do outro lado da rua, bem em frente às referidas árvores. Deteve-se ali por vários minutos, analisando vários papéis que retirava de uma pasta plástica. A seguir, desceu do carro, fechou-lhe a porta e atravessou a avenida às pressas. Quando já ia abrindo o portão de sua casa, sem ao menos me brindar com um bom dia, detive-o por um breve instante. Segurei-o pelo braço direito e pedi para que ficasse de costas para a avenida e que me respondesse quais as duas árvores que se encontram do outro lado, bem em frente a sua casa. Ele timidamente me respondeu:
- Sinceramente? Não sei!
- Há quantos anos você mora nesta casa?
- Desde que nasci: 36 anos... Sei o que você deve estar pensando, mas sabe como é a correria da gente... Não dá para observar nada.
- Sei sim... Tenha um bom dia por dentro e por fora! – Respondi-lhe dando um breve sorriso e um leve tapa nas costas.
Quem sabe observar a essência dos fatos do cotidiano acaba vendo mais longe. É preciso não se conformar com a normalidade do ver, mas sim, buscar pela excelência do olhar. Ver e olhar são práticas totalmente distintas. Percebo que de certo modo, todos estão doentes do olhar. Nossa superficialidade faz com que olhemos a vida somente superficialmente e é justamente isso que nos impede de saborear o âmago de tudo e sem esse saborear, o tudo, perde o seu sentido. Sem a cura do nosso olhar, torna-se impossível descobrir o motivo pelo qual sentimos ter nascido. É preciso rasgar o véu que encobre os olhos do Ser que nos faz ser. Descondicionados nascemos e, pela cura do olhar, descondicionados nos tornamos.