Sexta-feira. Manhã nublada e temperatura fresca. Talvez sejam indícios de que o Inverno esteja realmente chegando, apesar de que, cronologicamente, há dias já estamos nele.
Após tomar meu banho matinal, afagar o cachorro e colocar o lixo para fora, dirigi-me para a padaria a fim de tomar meu café. Parecia que todos ali haviam perdido o horário, tal era a quantidade de pessoas que aguardavam pela vez de serem atendidas. Como de praxe, todos estavam encolhidos e com a fronte bastante tensa. Pela manhã, o sorriso e a descontração parecem produtos em extinção.
- Fala JR! Perdeu o horário também?
- Pois é!
- Eu perdi a minha, mas não estou nem um pouquinho com vontade de encontrá-la!
- Sei!
- Acordei com uma vontade enorme de trabalhar, por isso, vim para cá para ver se a vontade passa!... E aí? Deu para dormir ou dormiu sem dar?...
Depois de fazer esta piada, a qual já fez várias vezes durante o ano, saltou uma longa e solitária gargalhada, deixando transparecer seu sorriso amarelado e as falhas em sua arcada dentária. Em seguida, voltou-se para um dos balconistas e exclamou:
- Fala Paraíba! Onde é que você estava ontem à tardinha? Estou com uma baita dor de cabeça de tanto ficar batendo minha cabeça atrás de você!...
Novamente, solitariamente, soltou sua gargalhada amarelada. Virou-se para mim e disse:
- Eu adoro encher o saco desse Paraíba! Toda manhã venho com uma pegadinha só para poder irritá-lo. O pior de tudo é que o cabra safado não está nem aí!
Apoiando-se com o braço direito sobre meu ombro e com a mão esquerda coçando o saco, novamente soltou uma longa gargalhada em alto som. Um senhor que estava ao meu lado, silenciosamente observava com seu olhar de reprovação.
- Passe bastante manteiga para descer mais fácil!
- Você vai querer alguma coisa? Perguntou-me o balconista, bastante encabulado.
- Por favor, para mim, um pingado e um pão de cenoura sem manteiga. Obrigado!
Enquanto aguardávamos o nosso pedido, ele correu o olhar pelo balcão, talvez em busca de outros conhecidos. No canto esquerdo da padaria, um rapaz, homossexual declarado, tomava seu café com sua amiga; ambos trabalham num salão de estética bem próximo daqui. De cabelos com luzes, espetados pela ação de um creme qualquer, brinco na orelha esquerda e piercing na sobrancelha direita, falava alto com sua dança de trejeitos.
- Oh Paraíba? Por que você não faz um corte de cabelo como o do seu alegre amiguinho ali? Vai lá e passa mais manteiga no dele! – Projetando seu corpo sobre o balcão, com a mão direita encobrindo o canto da boca, sussurrou para o balconista, que bastante sem graça respondeu:
- Para com isso! Fala sério! Meu pai só fez cabra macho nesse mundo! Nem de estética eu gosto. Estou fora!
E assim comecei mais um dia, somente observando afim de não me intoxicar com o conteúdo desta conversa nutritiva.