Quando falo para as pessoas sobre a decisão de encerrar as atividades da Cuidar do Ser, até agora, todas procuraram com olhares e palavras, de certa forma me oferecer consolação. Outras se sentem visivelmente tristes por acharem que não mais poderão usufruir do contato diário conosco. Até o presente momento, nenhuma delas nos parabenizou pela decisão tomada, muito menos conseguiram enxergar tal atitude como sendo vitoriosa. Talvez, a grande maioria ainda sustente a crença de que o sucesso esteja na continuidade das circunstancias e, portanto, olhem para o encerramento das atividades como sinal de fracasso ou um fator de prejuízo.
Mas, para mim, cuidar do ser também está na capacidade de ver lucro onde todos somente enxergam prejuízo. Tudo que está no externo, possui seu prazo de validade. O prejuízo só existe quando não se tem a coragem de saber deixar ir. Um remédio só se faz necessário enquanto necessário. Ele foi feito para remediar: é somente um meio para se fazer um inteiro.
Cuidar do Ser é ousar abrir mão daquilo que remedeia e se aventurar no vazio fértil capaz de propiciar a excelência de ser. Abandonar a mediania das migalhas da pseudo-segurança e se lançar nas infinitas águas profundas do Aberto... Seguindo o coração e observando as enormes ondas de medo. Observá-las de frente, de peito aberto, e, pela observação, ultrapassá-las até alcançar a calmaria de ser e nela se soltar e relaxar... Deixar que a calmaria do ser que nos faz ser se encarregue de nos levar ao ponto de resgate de nossa naufraga vocação. Com certeza, ela não virá pelo uso das limitadas faculdades mentais. Ela chegará de surpresa, sem avisos ou sinais, mas, com ela, a descoberta de uma nova maneira de ser onde se possa fazer realmente o que realmente se quer fazer... Com a maestrica dedicação, comprometimento, entusiasmo e significado.
Talvez, uma das maiores lições que eu tenha aprendido nestes anos de Cuidar do Ser, é que o processo de maturidade está na capacidade da superação do medo de se aventurar no Aberto.
Sentado aqui embaixo da pequena pitangueira, observo os sinais que a natureza me apresenta. Há um mês e meio, esta pitangueira estava repleta de suas frutinhas vermelhinhas, onde sanhaços e as pessoas mais sensíveis – a maioria ainda crianças – se permitiam o desfrute até a última delas. Hoje, já é possível ver novos brotos, ainda verdinhos, em diferentes pontos de seus galhos. Em nenhum momento ocorreu o findar, apenas, tempo de recolhimento, de assimilação energética para a manifestação do não manifesto, nos mesmos galhos, só que em pontos diferentes. Isto me fez ver que vida e morte não são acontecimentos distintos, mas sim, apenas pontos de passagem.
A lição que estou aprendendo agora com a Cuidar do Ser é a de deixar passar... Soltar, relaxar, descansar... Observar e apreciar a aventura de ser enquanto as ondas me levam para onde devem me levar...
Estou aprendendo também que a conveniência é a grande ilha onde solitários nos mantemos como náufragos impossibilitados da descoberta de nossa verdade pessoal, da descoberta do sopro que traz nossa própria voz.
Quando nos iniciamos nesta arte de Cuidar do Ser, começamos com o cuidado que funda o mental. Hoje, estamos praticando o cuidado mediano. Creio estar mais do que na hora de se abrir para um cuidado superior. Poder chegar neste estado é o lucro que só os mais sensíveis podem ver e valorizar.
Com certeza, ao chegar o momento da minha passagem para um novo ponto do galho, espero não ser lembrado como um ótimo fazedor de sites, um ótimo criador de estampas ou um ótimo vendedor de incensos, pedras, cristais e roupas indianas. Espero poder ser lembrado como um simples cuidador do ser que cuidou cuidando-se. Talvez seja esse o maior sucesso: se permitir ser aqui dentro, sempre, como uma onda no mar.